Mãe de estudante sequestrada de Chibok chora em protesto no dia 29 de abril, em Abuja, na Nigéria (Foto: Gbemiga Olamikan/AP)
Segundo Anistia Internacional, governo sabia de ameaça e falhou em agir.
Analistas dizem que caso 'envergonhou' país internacionalmente.
Na manhã em que 276 meninas foram sequestradas de uma escola pública no norte da Nigéria, em abril, o Exército do país recebeu telefonemas e avisos com até quatro horas de antecedência do crime.
Abubakar Shekau, líder do Boku Haram, em imagem
de vídeo em que assume o sequestro das meninas
(Foto: AFP)
Os insurgentes do grupo islâmico ultraradical Boku Haram não acharam nenhuma resistência para ficar por três horas na escola e saíram depois de incendiar o local, levando as meninas em 20 caminhonetes e 30 motos.
Dias depois, o sequestro virou notícia pelo mundo e foi parar nas hashtags do Twitter - acompanhado de imagens de famosos com plaquinhas e protestos em diversos países pedindo: 'tragam de volta nossas meninas' (#bringbackourgirls).
Mas, além de virar fenômeno na web, o sequestro também escancarou a ineficiência de um governo afundado em acusações de corrupção, que tem de lidar com uma pobreza extrema da população e com um exército decadente.
"Se você quer mostrar quão desprezível um governo ou um 'homem poderoso' é, você simplesmente ataca aqueles que ele deveria proteger. Ao sequestrar e escravizar essas meninas, o Boko Haram está mexendo com o governo em seu ponto mais fraco: mostrando que ele não consegue nem proteger suas mulheres e crianças. Nem mesmo em escolas públicas", avalia Murray Last, professor emérito de antropologia da Universidade de Londres, em entrevista ao G1. Segundo ele, o governo do presidente Goodluck Jonathan está “tão distanciado da realidade do povo, que as reações ao sequestro, tanto internas quanto internacionais, forçaram-no a acordar de seu estado de negação. O presidente e sua esposa não mostraram, até recentemente, nenhuma empatia pelo desastre.”
O sequestro ocorreu no dia 14 de abril e até agora não há informações concretas sobre o paradeiro das meninas. O Reino Unido e a Grã-Bretanha já anunciaram o envio de ajuda em inteligência. França e China também ofereceram apoio, e a polícia da Nigéria divulgou que pagará uma recompensa de 50 milhões de nairas (cerca de US$ 300 mil, ou R$ 669 mil) para quem fornecer informações concretas sobre o paradeiro das vítimas
Esse não é o primeiro sequestro do Boko Haram, uma seita que se tornou grupo armado em 2009, mas é o rapto mais numeroso. Só neste ano, eles mataram 1.500 pessoas em sua luta para impor a lei islâmica (sharia) no país. O grupo liberou um vídeo em que mostra um de seus membros rindo ao dizer que venderá as meninas como escravas.
“Quando você fala com as pessoas na Nigéria, elas te dizem que o aumento dos níveis de desemprego e pobreza entre os jovens do norte do país tem levado a um maior recrutamento desses jovens pelo Boko Haram”, disse ao G1 o coordenador de campanhas para a África Ocidental da organização humanitária Anistia Internacional, Makmid Kamara. Segundo ele, a pressão internacional pode ajudar a pressionar o governo nigeriano a se comprometer mais com o assunto. “As pessoas afetadas pela violência não acham que há sinceridade e empenho genuíno do governo para lidar com a questão. [..] Não é questão de dinheiro. O que os nigerianos precisam é uma liderança melhor, mais comprometida. Por exemplo, muitos dos pais com que falamos nos disseram que não receberam informações sobre os esforços de resgate.”
Outra questão evidente é a falta de recursos das forças armadas. O governo argumenta que a insurgência é nova e que ainda não há certezas de como lidar com o grupo - além de afirmar que há militantes infiltrados no exército. O porta-voz militar, Olajide Laleye, reconheceu em uma entrevista para imprensa na última terça-feira (6) as falhas de investimento, ao dizer que o exército faria “uma auditoria de equipamentos para identificadas as áreas em que há falta de suprimento, quebras ou materiais obsoletos.”
Mas pelo menos no papel, não parece faltar dinheiro. Segundo a agência de notícias Reuters, em 2014, um quarto do orçamento federal (US$ 5,8 bilhões) vai para a segurança. Desse montante, a maior parte vai parar no ministério da Defesa.
"É muito vergonhoso", disse o nigeriano Toyin Falola, professor do departamento de história da Universidade do Texas Austin. "Estou muito triste e também bravo, como muita gente. Mas essa raiva e tristeza se transformam em mobilização. E falar disso traz questões à tona. Questões de má administração, de falta de capacidade de defender seus cidadãos, questões de lei e ordem."
Além do extremismo
O Boko Haram tem assumido vários ataques no norte da Nigéria desde 2009, ultimamente tendo como alvo qualquer um que discorde de seus princípios. Fundado em 2002 como uma seita, ele virou uma guerrilha depois que seu líder morreu sob custódia da polícia, em 2009. “Desde então o grupo vem retaliando e atacando primeiro o departamento de polícia, depois bases militares e prédios do governo e mais recentemente escolas e igrejas. Até mesquitas eles atacam - já mataram clérigos muçulmanos também. No momento o alvo dos seus ataques é qualquer um que esteja contra eles ou contra seus princípios.
Em maio de 2013, o governo decretou estado de emergência nos estados do norte. "O Boku Haram é hoje a insurgência que mais mata no mundo. E ficou pior esse ano. [...] Eles são motivados pela religião, mas é uma visão distorcida, não é nem consistente com a Al-Qaeda, por exemplo. O que eles estão fazendo é muito, muito extremo, e muito, muito violento. Eles estão realmente matando civis indiscriminadamente. Mesmo na Jihad [guerra santa para os muçulmanos], há regras de guerra no Islã, e eles não cumprem essas regras. Por isso, muitos muçulmanos se opõem a eles. [...] É confuso mesmo para a maioria dos muçulmanos. Eles estão atacando até os salafistas na Nigéria, têm uma doutrina muito estranha”, disse ao G1 o pesquisador da Universidade de Cambridge e doutor em estudos africanos Adam Higazi.
Embora o Boko Haram se identifique como um grupo islâmico, autoridades islâmicas do mundo se prontificaram em condenar suas ações. Na Árabia Saudita, a autoridade máxima religiosa disse que o grupo foi “criado para denegrir a imagem do Islã” e que o Islã “é contra assassinatos, matanças e agressões". Acrescentou que "casar-se com uma garota sequestrada não é permitido”.
No Brasil, o Instituto de Cultura Árabe, em conjunto com a Federação das Associações Muçulmanas, também divulgou um documento em que diz que “o sequestro, a venda e o uso de mulheres como escravas sexuais são crimes contra a humanidade, tanto na dimensão moral da expressão como no seu sentido legal. Estão entre os piores crimes igualmente condenados pelo direito internacional e pela Sharia islâmica. Nada, no Islã ou fora dele, pode servir a explicar e muito menos a justificar tais crimes” (leia a íntegra aqui).
Salvando o mundo com hashtags
Logo após o sequestro das meninas ter sido divulgado pela imprensa internacional, as campanhas online começaram a se propagar no Twitter e Facebook. A primeira-dama americana, Michelle Obama, até posou para uma foto com uma placa pedindo que devolvam as garotas.
A mobilização tem entusiastas e críticos. Para o professor Toyin Falola, o falatório cria um alerta e também pressiona o governo. "É um momento de mudança. Você é a sexta pessoa a me entrevistar apenas hoje! Isso significa que se tornou um assunto global. [...] isso é muito bom. Primeiro porque cria um alerta, e depois talvez alguém consiga identificar alguma dessas meninas. Os recados pela rádio e redes sociais penetram em várias partes da África. Também envergonha o governo, que deve fazer algo a respeito, e descredencia a polícia e o Exército, o que também significa que eles devem fazer algo a respeito."
Outro que defende as mobilizações é o professor Omolade Adunbi, da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos. "As redes sociais se tornaram uma ferramenta poderosa e já estão fazendo uma enorme diferença. Por exemplo, um dia após o sequestro, o presidente agiu como se nada tivesse acontecido, mas o poder das redes sociais iluminou o fato e de repente se tornou um assunto internacional, não deixando brecha ao presidente e sua equipe."
Mas há quem critique o "ativismo de sofá", especialmente aquele que é feito por quem é afetado pelo problema. O escritor nigeriano Teju Cole, por exemplo, ironizou as hashtags de protesto adotadas pelo Ocidente. O movimento original #bringbackourgirls (#tragamdevoltanossascrianças) começou na Nigéria e Teju diferenciou os dois ativismos, criticando a adoção da sigla por ocidentais. Em sua conta do Twitter, ele escreveu posts como: "Por quatro anos, os nigerianos têm tentado entender esses monstros homicidas. Seu novo interesse (obrigado) não simplifica nada, não resolve nada" e "Encantado em conhecer todos esses novos especialistas em Nigéria."
Outra nigeriana, Jumoke Balogun, editora de um portal sobre o continente, escreveu um recente artigo no jornal britânico "The Guardian" dizendo: "Você pode não saber, mas o Exército dos EUA ama suas hashtags porque elas dão legitimidade para invadir e aumentar sua presença na África."
O Globo
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sábado, 10 de maio de 2014
sexta-feira, 9 de maio de 2014
domingo, 4 de maio de 2014
Pai dava remédios tarja preta para Bernardo, diz madrinha
Ela disse que notou comportamento estava estranho nas últimas férias
A madrinha de Bernardo, encontrado enterrado em um matagal em Frederico Westphalen (RS), no dia 14 de abril, disse em entrevista ao R7 que o pai do garoto dava remédios tarja preta para ele e que foi possível notar um comportamento estranho nas últimas férias em que o menino passou em sua casa. Clarissa da Silva Oliveira era amiga de infância da mãe de Bernardo, morta em 2010, e disse ter certeza de que a morte de Be, como o chamava, foi premeditada.
— O pai do Bernardo me disse que o levou a um médico psiquiatra que receitou remédios tarja preta, mas o menino desmentiu isso e acredito nele porque os medicamentos eram todos amostras grátis. Tenho certeza que o Leandro [pai] pegou no hospital que trabalhava e deu para o menino por conta própria. Não tinha nem receita.
Clarissa explica que nos dias em que o garoto esteve com ela, no mês de janeiro, ela não deixou que ele ingerisse a medicação. Ela o descreveu como um menino calado, apático, mas que passou a ser ‘revoltado’ nos últimos tempos.
— Eu sempre estranhei que ele aceitava com muita facilidade tudo o que o pai falava e mandava. Não era um comportamento normal para um menino da idade dele. Mas ele estava diferente. Estava respondão e parecia revoltado. Hoje eu sei que é porque ele estava sofrendo e sabe-se lá o que passou na mão do pai e madrasta.
O pai de Bernardo, o médico Leandro Boldrini, a madrasta, a enfermeira Graciele Ugulini, e Edelvânia, amiga da madrasta, estão detidos desde o dia 14 de abril, quando o corpo da criança foi encontrado. Graciele confirmou em depoimento que fez a aplicação do medicamento Midazolam, mas que a morte do menino foi acidental. A amiga confessou que ajudou a esconder o corpo e ambas dizem que o pai não tem participação na morte. Para a polícia, Boldrini teria conhecimento do crime e quer apurar o que realmente cada um colaborou no caso.
A madrinha disse que a última vez que viu Leandro pessoalmente foi em 2011. Depois disso, a madrasta era quem levava o garoto até ela nos períodos de férias e sempre acompanhada de um parente. Clarissa conta que não conversava com eles e quando queria falar com Bernardo ligava direto no celular do menino.
— Eu falei com ele pela última vez dez dias antes dele ser morto. Ele queria saber do Miguel, meu bebê, perguntei se ele estava bem. Eu tenho certeza que a madrasta premeditou tudo. Ela foi a Frederico Westphalen dois dias antes de enterrar o corpo. Para mim, ela foi ver o local. Em fevereiro o Bernardo confirmou para o juiz que sofria maus-tratos e todos ficaram bravos por isso.
Morte da mãe
Clarissa conheceu a mãe de Bernardo ainda na infância, quando tinham cerca de dez anos. Odilaine morreu com um disparo de arma de fogo em 2010, aos 32 anos, três dias antes de assinar a separação do pai do garoto. A polícia concluiu que ela cometeu suicídio. Clarissa recebeu uma carta de despedida escrita por ela.
— Na carta, ela se despedia de todo mundo e dizia que tomou a decisão porque estava cansada da vida. Eu culpo o Leandro pela morte dela também. A Odilaine estava depressiva e ele não contou para ninguém. Ela tomava remédios receitados por ele e morreu dentro da clínica dela com uma arma de fogo. Dois meses depois ele casou com a Graciele. Se ela realmente cometeu suicídio, ele contribuiu muito para isso.
O advogado Marlon Adriano Balbon pretende protocolar na próxima terça-feira (5) um pedido na Justiça para que a Polícia Civil abra novas investigações sobre a morte de Odilaine Segundo Balbon, que representa a avó de Bernardo, Jussara Uglione, a família nunca se convenceu de que Odilaine cometeu suicídio, como concluiu o inquérito sobre o caso. Com a morte de Bernardo, os parentes querem acusar o pai do menino como um possível suspeito também do falecimento de Odilaine.
— Vou argumentar a partir das falhas no inquérito que já existe sobre a morte dela e pedir novas diligências no caso. A família acredita que ela foi assassinada e que o pai do Bernardo pode ser considerado um suspeito. Uma tomografia computadorizada foi feita em Odilaine, mas nunca anexada ao processo. Queremos rever as provas para esclarecer tudo.
Ela receberia R$ 1,5 milhão e uma pensão de R$ 10 mil por mês após a separação. Para a família, ela foi morta para não receber esse valor. O pedido será protocolado no fórum da cidade de Três Passos. A Justiça não tem um prazo determinado para dar um parecer.
R7
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