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Publicado por Portal R7 em Sexta, 29 de janeiro de 2016
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sábado, 30 de janeiro de 2016
Por favor...devolvam essa criança para a mãe!!!
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quinta-feira, 28 de janeiro de 2016
Produto que usa bactéria para matar o Aedes está pronto desde 2006
Ampolas do larvicida orgânico Bt-Horus, que será usado no combate ao Aedes aegypti no Distrito Federal (Foto: Jéssica Nascimento/G1)
Piloto teve sucesso em 2007, mas governo 'ignorou'; bacilo ataca as larvas.
Ministério diz que compra internacional impede uso de versão da Embrapa.
O larvicida biológico que usa uma bactéria para matar as larvas do mosquito Aedes aegypti – transmissor da dengue, do chikungunya e do zika vírus – será usado no Distrito Federal a partir desta quinta-feira (21), mas já está pronto para utilização em larga escala há quase dez anos. A fórmula criada no Brasil foi registrada na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em 2006, mas nunca foi usada de forma sistemática no país.
O produto pode ser aplicado em caixas d'água, piscinas, ralos, vasos de plantas e em qualquer ambiente doméstico, incluindo reservatórios de água potável. A compra só pode ser feita, no entanto, por governos ou empresas especializadas, e não pelo consumidor comum.
O larvicida tem como "princípio ativo" o Bacillum thuringiensis israelense (BTI), uma bactéria inofensiva para humanos e animais domésticos, mas letal para o mosquito. Quando a larva do Aedes come essa bactéria na água limpa e parada, recebe quatro toxinas que causam paralisia generalizada e matam o vetor.
A versão brasileira, criada pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) em parceria com a empresa nacional Bthek, traz um bacilo em uma solução líquida. Ela é vendida pelo nome comercial "Bt-Horus" e custa cerca de R$ 60 por litro.
Em nota enviada ao G1, o Ministério da Saúde informou que só pode incluir um produto no Programa Nacional de Combate à Dengue se ele obtiver registro na Organização Mundial de Saúde (OMS). Essa restrição se aplica, segundo a pasta, porque a aquisição é feita por licitação internacional, com verbas da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).
O ministério diz analisar, "além da segurança e da eficácia, o custo-efetividade, o impacto epidemiológico esperado, o protocolo e estratégia de utilização do produto e o impacto orçamentário que será produzido".
O ministério não soube informar porque mantém um regulamento que impede a compra de produtos nacionais para o Programa Nacional de Combate à Dengue, criado em 2002. mesmo aqueles com autorização da Anvisa. Os governos locais e a própria União podem comprar o Bt-Horus diretamente do fabricante mas, para isso, não podem contar com as verbas da Opas.
Apesar de não prever a aquisição do bacilo na formulação nacional, o governo federal importou oito toneladas do produto em 2010 e fez a distribuição para 13 estados e o DF.
A diferença, segundo o próprio ministério, está na forma de apresentação do produto. O BTI foi licitado na versão "efervescente" (WDG, na sigla em inglês), regulamentada pela OMS. A versão nacional, o Bt-Horus, é vendida em solução aquosa e, por isso, precisaria de nova permissão do órgão ligado à ONU.
Sem continuidade
Em 2007, o produto foi testado pela Embrapa e pela Bthek em São Sebastião, no DF, com resultados acima dos esperados pela equipe. O índice de infestação, medido pelo número de focos encontrados a cada cem casas inspecionadas, passou de 4 para 1 após a aplicação do bacilo. De "risco iminente de epidemia", o índice caiu para "aceitável", segundo critérios da Organização Mundial de Saúde.
As pesquisas foram concluídas na sede da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, a 8 km do Palácio do Buriti e a menos de 200 metros da sede da Secretaria de Saúde, no fim da Asa Norte. A Embrapa afirma que tem como missão "viabilizar soluções de pesquisa, desenvolvimento e inovação", e que a criação de políticas públicas e aplicação de alternativas cabe ao Executivo.
Chamada Zika Vírus Samp (Foto: Divulgação/ Samp)
Mosquito Aedes aegypti transmite vírus da dengue, chikungunya e zika (Foto: Samp/Divulgação)
Depois do teste bem-sucedido em São Sebastião, o produto sumiu dos protocolos distritais até a última segunda-feira (18), quando o governo anunciou o recebimento de 600 litros do produto. A carga foi doada pela União Química, empresa brasileira que comprou a Bthek.
O subsecretário de Vigilância em Saúde do DF, Tiago Coelho, afirma que a estratégia foi "revisitada" em função do aumento da ameaça causada pelo Aedes aegypti, que passou a transmitir a chikungunya e o zika vírus. "Os instrumentos que estávamos utilizando para conter a dengue estavam se mostrando ineficientes. O controle químico, por inseticida e larvicida, e o ambiental, com retirada de entulho e água parada", diz.
Novo protocolo
Desta vez, a aplicação do BTI será feita apenas pelos agentes autorizados da Secretaria de Saúde, e não pela própria população, como em 2007. Coelho afirma que os testes daquela época foram feitos pela própria empresa, e não pela pasta, e diz que a estratégia utilizada "não se mostrou efetiva". Ele preferiu não comentar os dados de redução de epidemia passados pela Bthek e pela Embrapa.
"Neste momento, depois de revisitar os pontos positivos e negativos, nós estamos introduzindo [o produto] com um novo protocolo. Vamos fazer o monitoramento de todos os indicadores e divulgar o resultado, dentro do protocolo que a secretaria entende como correto. É um processo contínuo: a pesquisa alimenta a política pública, que fornece novos dados para a pesquisa", diz o subsecretário.
Os 600 litros doados devem ser suficientes para dois ou três meses de aplicação, nas estimativas do GDF e considerando o "nível atual" de focos. Nesse período, a Secretaria de Saúde promete avaliar os resultados. "Assim que a gente identificar a efetividade, a intenção é fazer um termo de referência para adotar a compra regular", diz Coelho.
Na manhã desta quinta (21), 150 agentes da Vigilância Ambiental receberam o treinamento necessário para usar o produto, que será dividido em 12 mil ampolas de 50 ml. A previsão do GDF é de que o produto começasse a ser aplicado ainda nesta quinta nas regiões com o maior índice de focos do mosquito: Santa Maria, Gama, Brazlândia, Lago Norte e Planaltina.
O GDF garante que seguirá o cronograma de reaplicação indicado pelo fabricante – onde houver foco, o agente de vigilância terá que retornar a cada três semanas. O governo não explicou como fará esse controle na segunda etapa de implementação, quando todo o DF passar a receber o bacilo.
Nova tentativa
O gerente de produção da Bthek e da divisão de biotecnologia da União Química, José Eduardo Sacconi Nunes, diz que a aplicação do BTI no DF vai funcionar como um "segundo projeto piloto", em uma tentativa de reinserir o larvicida no mercado. Desde 2010, segundo ele, nenhum governo municipal, estadual, distrital ou federal adquiriu o produto, de modo contínuo, para o combate à dengue.
"O produto foi utilizado sistematicamente na região Sul, mas no combate ao mosquito borrachudo, pelo incômodo que ele causa em populações ribeirinhas. É um mosquito que gosta de água corrente, não bota ovo em água parada. Como o larvicida ataca a larva, e não o adulto, pode ser que o Aedes volte a pôr ovos ali. Por isso, você precisa ir reaplicando até matar toda a cadeia", diz.
A dose necessária para eliminar as larvas de Aedes varia de uma gota (para ralos domésticos) a um litro (piscinas de 20 mil litros). "Dependendo da dose, as larvas morrem em 24 horas. A vantagem é a especificidade, ou seja, essas toxinas só agem nas larvas e são inofensivas aos humanos, animais, plantas", diz a pesquisadora Rose Monnerat, que liderou a pesquisa do bacilo na Embrapa.
Dependendo da dose, as larvas morrem em 24 horas. A vantagem é a especificidade, ou seja, essas toxinas só agem nas larvas e são inofensivas aos humanos, animais, plantas"
Após aplicado, o bacilo se reproduz muito pouco, e apenas dentro da larva morta. Como a bactéria é sensível à luz solar, o produto é mais eficiente para ambientes internos e precisa ser reaplicada, "religiosamente", a cada três semanas. A ação funcionaria como complemento ao uso dos "fumacês", mais eficazes na área externa porque os moradores fecham as portas e janelas durante a aplicação.
Dengue no DF
O Distrito Federal registrou aumento de 110% no número de casos de dengue nas primeiras duas semanas de 2016, em comparação com o mesmo período do ano passado. Foram 253 infecções confirmadas até a última segunda-feira (18), contra 120 apurados em 2015. Os dados foram divulgados nesta quarta (20) no boletim epidemiológico da Secretaria de Saúde.
Entre os dias 11 e 18 deste mês, o índice de casos pulou de 59 para 253 – foram 194 infecções em apenas sete dias. A variação, segundo a Saúde, foi impulsionada pelo crescimento das ocorrências em Brazlândia – de 3, em 2015, para 100 em 2016. Em 13 regiões, o índice caiu em relação ao ano passado, e em outras nove, houve estabilidade.
Fonte: G1
Piloto teve sucesso em 2007, mas governo 'ignorou'; bacilo ataca as larvas.
Ministério diz que compra internacional impede uso de versão da Embrapa.
O larvicida biológico que usa uma bactéria para matar as larvas do mosquito Aedes aegypti – transmissor da dengue, do chikungunya e do zika vírus – será usado no Distrito Federal a partir desta quinta-feira (21), mas já está pronto para utilização em larga escala há quase dez anos. A fórmula criada no Brasil foi registrada na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em 2006, mas nunca foi usada de forma sistemática no país.
O produto pode ser aplicado em caixas d'água, piscinas, ralos, vasos de plantas e em qualquer ambiente doméstico, incluindo reservatórios de água potável. A compra só pode ser feita, no entanto, por governos ou empresas especializadas, e não pelo consumidor comum.
O larvicida tem como "princípio ativo" o Bacillum thuringiensis israelense (BTI), uma bactéria inofensiva para humanos e animais domésticos, mas letal para o mosquito. Quando a larva do Aedes come essa bactéria na água limpa e parada, recebe quatro toxinas que causam paralisia generalizada e matam o vetor.
A versão brasileira, criada pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) em parceria com a empresa nacional Bthek, traz um bacilo em uma solução líquida. Ela é vendida pelo nome comercial "Bt-Horus" e custa cerca de R$ 60 por litro.
Em nota enviada ao G1, o Ministério da Saúde informou que só pode incluir um produto no Programa Nacional de Combate à Dengue se ele obtiver registro na Organização Mundial de Saúde (OMS). Essa restrição se aplica, segundo a pasta, porque a aquisição é feita por licitação internacional, com verbas da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).
O ministério diz analisar, "além da segurança e da eficácia, o custo-efetividade, o impacto epidemiológico esperado, o protocolo e estratégia de utilização do produto e o impacto orçamentário que será produzido".
O ministério não soube informar porque mantém um regulamento que impede a compra de produtos nacionais para o Programa Nacional de Combate à Dengue, criado em 2002. mesmo aqueles com autorização da Anvisa. Os governos locais e a própria União podem comprar o Bt-Horus diretamente do fabricante mas, para isso, não podem contar com as verbas da Opas.
Apesar de não prever a aquisição do bacilo na formulação nacional, o governo federal importou oito toneladas do produto em 2010 e fez a distribuição para 13 estados e o DF.
A diferença, segundo o próprio ministério, está na forma de apresentação do produto. O BTI foi licitado na versão "efervescente" (WDG, na sigla em inglês), regulamentada pela OMS. A versão nacional, o Bt-Horus, é vendida em solução aquosa e, por isso, precisaria de nova permissão do órgão ligado à ONU.
Sem continuidade
Em 2007, o produto foi testado pela Embrapa e pela Bthek em São Sebastião, no DF, com resultados acima dos esperados pela equipe. O índice de infestação, medido pelo número de focos encontrados a cada cem casas inspecionadas, passou de 4 para 1 após a aplicação do bacilo. De "risco iminente de epidemia", o índice caiu para "aceitável", segundo critérios da Organização Mundial de Saúde.
As pesquisas foram concluídas na sede da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, a 8 km do Palácio do Buriti e a menos de 200 metros da sede da Secretaria de Saúde, no fim da Asa Norte. A Embrapa afirma que tem como missão "viabilizar soluções de pesquisa, desenvolvimento e inovação", e que a criação de políticas públicas e aplicação de alternativas cabe ao Executivo.
Chamada Zika Vírus Samp (Foto: Divulgação/ Samp)
Mosquito Aedes aegypti transmite vírus da dengue, chikungunya e zika (Foto: Samp/Divulgação)
Depois do teste bem-sucedido em São Sebastião, o produto sumiu dos protocolos distritais até a última segunda-feira (18), quando o governo anunciou o recebimento de 600 litros do produto. A carga foi doada pela União Química, empresa brasileira que comprou a Bthek.
O subsecretário de Vigilância em Saúde do DF, Tiago Coelho, afirma que a estratégia foi "revisitada" em função do aumento da ameaça causada pelo Aedes aegypti, que passou a transmitir a chikungunya e o zika vírus. "Os instrumentos que estávamos utilizando para conter a dengue estavam se mostrando ineficientes. O controle químico, por inseticida e larvicida, e o ambiental, com retirada de entulho e água parada", diz.
Novo protocolo
Desta vez, a aplicação do BTI será feita apenas pelos agentes autorizados da Secretaria de Saúde, e não pela própria população, como em 2007. Coelho afirma que os testes daquela época foram feitos pela própria empresa, e não pela pasta, e diz que a estratégia utilizada "não se mostrou efetiva". Ele preferiu não comentar os dados de redução de epidemia passados pela Bthek e pela Embrapa.
"Neste momento, depois de revisitar os pontos positivos e negativos, nós estamos introduzindo [o produto] com um novo protocolo. Vamos fazer o monitoramento de todos os indicadores e divulgar o resultado, dentro do protocolo que a secretaria entende como correto. É um processo contínuo: a pesquisa alimenta a política pública, que fornece novos dados para a pesquisa", diz o subsecretário.
Os 600 litros doados devem ser suficientes para dois ou três meses de aplicação, nas estimativas do GDF e considerando o "nível atual" de focos. Nesse período, a Secretaria de Saúde promete avaliar os resultados. "Assim que a gente identificar a efetividade, a intenção é fazer um termo de referência para adotar a compra regular", diz Coelho.
Na manhã desta quinta (21), 150 agentes da Vigilância Ambiental receberam o treinamento necessário para usar o produto, que será dividido em 12 mil ampolas de 50 ml. A previsão do GDF é de que o produto começasse a ser aplicado ainda nesta quinta nas regiões com o maior índice de focos do mosquito: Santa Maria, Gama, Brazlândia, Lago Norte e Planaltina.
O GDF garante que seguirá o cronograma de reaplicação indicado pelo fabricante – onde houver foco, o agente de vigilância terá que retornar a cada três semanas. O governo não explicou como fará esse controle na segunda etapa de implementação, quando todo o DF passar a receber o bacilo.
Nova tentativa
O gerente de produção da Bthek e da divisão de biotecnologia da União Química, José Eduardo Sacconi Nunes, diz que a aplicação do BTI no DF vai funcionar como um "segundo projeto piloto", em uma tentativa de reinserir o larvicida no mercado. Desde 2010, segundo ele, nenhum governo municipal, estadual, distrital ou federal adquiriu o produto, de modo contínuo, para o combate à dengue.
"O produto foi utilizado sistematicamente na região Sul, mas no combate ao mosquito borrachudo, pelo incômodo que ele causa em populações ribeirinhas. É um mosquito que gosta de água corrente, não bota ovo em água parada. Como o larvicida ataca a larva, e não o adulto, pode ser que o Aedes volte a pôr ovos ali. Por isso, você precisa ir reaplicando até matar toda a cadeia", diz.
A dose necessária para eliminar as larvas de Aedes varia de uma gota (para ralos domésticos) a um litro (piscinas de 20 mil litros). "Dependendo da dose, as larvas morrem em 24 horas. A vantagem é a especificidade, ou seja, essas toxinas só agem nas larvas e são inofensivas aos humanos, animais, plantas", diz a pesquisadora Rose Monnerat, que liderou a pesquisa do bacilo na Embrapa.
Dependendo da dose, as larvas morrem em 24 horas. A vantagem é a especificidade, ou seja, essas toxinas só agem nas larvas e são inofensivas aos humanos, animais, plantas"
Após aplicado, o bacilo se reproduz muito pouco, e apenas dentro da larva morta. Como a bactéria é sensível à luz solar, o produto é mais eficiente para ambientes internos e precisa ser reaplicada, "religiosamente", a cada três semanas. A ação funcionaria como complemento ao uso dos "fumacês", mais eficazes na área externa porque os moradores fecham as portas e janelas durante a aplicação.
Dengue no DF
O Distrito Federal registrou aumento de 110% no número de casos de dengue nas primeiras duas semanas de 2016, em comparação com o mesmo período do ano passado. Foram 253 infecções confirmadas até a última segunda-feira (18), contra 120 apurados em 2015. Os dados foram divulgados nesta quarta (20) no boletim epidemiológico da Secretaria de Saúde.
Entre os dias 11 e 18 deste mês, o índice de casos pulou de 59 para 253 – foram 194 infecções em apenas sete dias. A variação, segundo a Saúde, foi impulsionada pelo crescimento das ocorrências em Brazlândia – de 3, em 2015, para 100 em 2016. Em 13 regiões, o índice caiu em relação ao ano passado, e em outras nove, houve estabilidade.
Fonte: G1
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PASSAGEIRO TIRA FOTO DE CÃO EM AVIÃO E IMAGEM REPERCUTE NA INTERNET
Um caso inusitado aconteceu dentro de um avião da empresa Delta Air Lines neste ano. Desde novembro de 2015 a empresa anunciou que não seria mais obrigatório que os passageiros levassem os animais de estimação no compartimento de carga das aeronaves. Segundo a diretoria, a nova regra ia começar a valer em março deste ano.
Mas alguns passageiros anteciparam a novidade e um cachorro foi visto sentado em uma das poltronas pronto para decolar. Nesta semana, um internauta usuário da rede social Twitter publicou uma foto em que mostra o animal sentado em um voo que ia de Atlanta a Chattanooga, nos Estados Unidos.
O cão ficou em um assento do lado da saída da emergência e segundo informações, seguiu comportado durante o voo.
Fonte: Olhar Animal
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quarta-feira, 27 de janeiro de 2016
Famílias abandonam crianças com microcefalia e paralisia cerebral
Tratamento. Uma profissional atende a uma criança na Cruz Verde: hospital é o único para paralisia cerebral grave - Marcos Alves
Em hospital de referência 70% dos pacientes não recebem visita
SÃO PAULO — Guilherme* estava de mau humor. Deitado em um berço de metal, seu corpo franzino não revelava os 14 anos de idade. Por trás da máscara de um respirador artificial, apenas seus olhos entristecidos apareciam. Uma pneumonia o impedia, naquela manhã, de circular, distribuindo irônicos apelidos a pacientes, enfermeiras e médicos. Desde os sete meses, ele mora no único hospital do Brasil de atenção exclusiva para pessoas com paralisia cerebral grave: a Associação Cruz Verde, na Zona Sul de São Paulo. Nunca foi pra casa, nunca recebeu visitas de parentes. Foi deixado pela família ainda na maternidade, assim que nasceu e recebeu o diagnóstico de que não viveria mais de quatro anos.
Guilherme é um dos 204 pacientes que moram na Cruz Verde. No prédio arejado e iluminado, de paredes claras e equipe sorridente, crianças, adolescentes e adultos que sofrem com paralisia cerebral e microcefalia graves, recebem diversos tratamentos, como fisioterapia, fonoterapia, hidroterapia e terapia ocupacional. Nenhum deles consegue caminhar, todos usam fraldas, a maioria não pode engolir e se alimenta por sondas, poucos falam. Cerca de 70% foram abandonados pelas famílias e irão viver no hospital até a morte.
A paralisia cerebral é uma condição na qual o paciente tem uma ou mais partes do cérebro lesionadas, causando a morte de neurônios. Pode ser provocada enquanto a criança ainda se desenvolve dentro do útero da mãe, por doenças contraídas ou pelo uso de drogas. No momento do parto, por falta de oxigênio, ou nos primeiros anos de vida, por paradas cardiorrespiratórias ou acidentes que afetem diretamente a oxigenação do cérebro.
O estado provoca graves dificuldades motoras, com atrofia e entortamento dos membros, dificuldades respiratórias, epilepsia e algum grau de atraso intelectual. Em alguma medida, todos eles compreendem o mundo ao redor e têm as interações limitadas pelos problemas de fala e de visão que resultam das lesões neurais. A paralisia cerebral pode acontecer associada à microcefalia - situação em que as crianças nascem com cérebros menores ou não o desenvolvem com o passar do tempo - em uma interação ainda pouco explicada pela ciência. O atendimento de cada criança na Cruz Verde é complexo e custa R$ 4 mil por mês.
— As mães que abandonam as crianças não têm qualquer estrutura econômica, social ou familiar para fazer frente ao desafio de cuidar delas. Além do preconceito, da rejeição, essas mães normalmente já foram abandonadas pelo pai da criança. Algumas são usuárias de drogas, não têm família e já têm muitos filhos — afirma a assistente social do hospital Jéssica Pereira da Silva.
Atendimento de cada criança na Cruz Verde é complexo e custa R$ 4 mil por mês - Marcos Alves
Ricardo* tinha 10 anos quando a casa onde morava pegou fogo. Ele era o responsável pelos cuidados de três irmãos menores enquanto a mãe trabalhava. Embora tenha sido o primeiro a sair da casa em chamas, ele acabou voltando para tentar salvar os familiares. Depois de resgatar os irmãos e de inalar uma grande quantidade de fumaça, sofreu uma parada cardiorrespiratória que lhe causou paralisia cerebral grave. Ainda no hospital, Ricardo foi abandonado pela família que salvou. Ocupa há oito anos um dos berços de uma ala da Cruz Verde. Não fala, nem anda. Mas segue o interlocutor com o olhar. Nunca recebeu visita ou foi procurado.
Aos 12 anos, Luana*, que nasceu com paralisia cerebral, pesava apenas 12 quilos quando chegou ao hospital, em extrema desnutrição, depois de ser retirada da família por maus-tratos. Ela depende de uma traqueostomia e um respirador para se manter viva. Júlia*, uma simpática menina de dois anos que distribui sorrisos quando alguém chega perto de seu leito, nasceu de uma mulher que teve sucessivas crises de epilepsia durante a gestação, e teve o cérebro lesionado. A mãe a deixou, visita raramente.
— Quando a mãe vem, ela diz: "isso eu não quero na minha casa". As pessoas não querem cuidar, mal querem olhar, há muito preconceito. Temo que o aumento de casos de microcefalia provoque um surto de abandonos — afirma a neuropediatra, especialista em paralisia cerebral, Adriana Ávila de Espíndola.
A dor da rejeição Fernanda Silva Costa, de 38 anos, conheceu dentro de casa. Ela é mãe de Artur, de 3 anos, que nasceu com microcefalia e paralisia cerebral. A criança não enxerga, não fala, não anda, não consegue se sentar sozinha, não engole nenhuma comida que não seja pastosa. Ela e o marido se desdobram nos cuidados com o pequeno, que incluem uma agenda médica extensa. Mas a mãe de Fernanda, avó de Artur, se recusa a chegar perto da criança.
— Ela não o pega no colo, arruma desculpas para não acompanhar no médico, parece que sente nojo dele. Isso machuca muito. Agora estamos tentando matriculá-lo em alguma escola, mas nenhuma delas aceita, dizem que não têm condições. Os pais não deixam suas crianças chegarem perto do Artur. Não querem deixá-lo entrar na sociedade — conta Fernanda, que leva o filho para tratamento na Cruz Verde.
Além do preconceito, as mães enfrentam a falta de terapias e opções médicas no sistema público de saúde para tratar suas crianças. Pacientes com paralisia cerebral precisam de estimulação contínua para uma maior qualidade de vida. Com custo de R$ 15 milhões anuais, a Cruz Verde se equilibra entre a escassez de verba pública - o SUS custeia 50% das despesas - e a necessidade de doações de mais de 50 empresas para seguir funcionando. Os administradores se assombram diante da possibilidade de que a demanda por seus cuidados aumente diante do nascimento em massa de bebês com microcefalia, resultante da infecção por zika vírus. A superintendente do hospital Marilena Pacios resume a aflição:
— O que faremos agora diante de uma parcela dessa geração nascendo quase sem cérebro? Isso é uma tragédia.
*Nomes fictícios
Fonte: O Globo
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/brasil/familias-abandonam-criancas-com-microcefalia-paralisia-cerebral-18447204#ixzz3yT3A2v6P
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Em hospital de referência 70% dos pacientes não recebem visita
SÃO PAULO — Guilherme* estava de mau humor. Deitado em um berço de metal, seu corpo franzino não revelava os 14 anos de idade. Por trás da máscara de um respirador artificial, apenas seus olhos entristecidos apareciam. Uma pneumonia o impedia, naquela manhã, de circular, distribuindo irônicos apelidos a pacientes, enfermeiras e médicos. Desde os sete meses, ele mora no único hospital do Brasil de atenção exclusiva para pessoas com paralisia cerebral grave: a Associação Cruz Verde, na Zona Sul de São Paulo. Nunca foi pra casa, nunca recebeu visitas de parentes. Foi deixado pela família ainda na maternidade, assim que nasceu e recebeu o diagnóstico de que não viveria mais de quatro anos.
Guilherme é um dos 204 pacientes que moram na Cruz Verde. No prédio arejado e iluminado, de paredes claras e equipe sorridente, crianças, adolescentes e adultos que sofrem com paralisia cerebral e microcefalia graves, recebem diversos tratamentos, como fisioterapia, fonoterapia, hidroterapia e terapia ocupacional. Nenhum deles consegue caminhar, todos usam fraldas, a maioria não pode engolir e se alimenta por sondas, poucos falam. Cerca de 70% foram abandonados pelas famílias e irão viver no hospital até a morte.
A paralisia cerebral é uma condição na qual o paciente tem uma ou mais partes do cérebro lesionadas, causando a morte de neurônios. Pode ser provocada enquanto a criança ainda se desenvolve dentro do útero da mãe, por doenças contraídas ou pelo uso de drogas. No momento do parto, por falta de oxigênio, ou nos primeiros anos de vida, por paradas cardiorrespiratórias ou acidentes que afetem diretamente a oxigenação do cérebro.
O estado provoca graves dificuldades motoras, com atrofia e entortamento dos membros, dificuldades respiratórias, epilepsia e algum grau de atraso intelectual. Em alguma medida, todos eles compreendem o mundo ao redor e têm as interações limitadas pelos problemas de fala e de visão que resultam das lesões neurais. A paralisia cerebral pode acontecer associada à microcefalia - situação em que as crianças nascem com cérebros menores ou não o desenvolvem com o passar do tempo - em uma interação ainda pouco explicada pela ciência. O atendimento de cada criança na Cruz Verde é complexo e custa R$ 4 mil por mês.
— As mães que abandonam as crianças não têm qualquer estrutura econômica, social ou familiar para fazer frente ao desafio de cuidar delas. Além do preconceito, da rejeição, essas mães normalmente já foram abandonadas pelo pai da criança. Algumas são usuárias de drogas, não têm família e já têm muitos filhos — afirma a assistente social do hospital Jéssica Pereira da Silva.
Atendimento de cada criança na Cruz Verde é complexo e custa R$ 4 mil por mês - Marcos Alves
Ricardo* tinha 10 anos quando a casa onde morava pegou fogo. Ele era o responsável pelos cuidados de três irmãos menores enquanto a mãe trabalhava. Embora tenha sido o primeiro a sair da casa em chamas, ele acabou voltando para tentar salvar os familiares. Depois de resgatar os irmãos e de inalar uma grande quantidade de fumaça, sofreu uma parada cardiorrespiratória que lhe causou paralisia cerebral grave. Ainda no hospital, Ricardo foi abandonado pela família que salvou. Ocupa há oito anos um dos berços de uma ala da Cruz Verde. Não fala, nem anda. Mas segue o interlocutor com o olhar. Nunca recebeu visita ou foi procurado.
Aos 12 anos, Luana*, que nasceu com paralisia cerebral, pesava apenas 12 quilos quando chegou ao hospital, em extrema desnutrição, depois de ser retirada da família por maus-tratos. Ela depende de uma traqueostomia e um respirador para se manter viva. Júlia*, uma simpática menina de dois anos que distribui sorrisos quando alguém chega perto de seu leito, nasceu de uma mulher que teve sucessivas crises de epilepsia durante a gestação, e teve o cérebro lesionado. A mãe a deixou, visita raramente.
— Quando a mãe vem, ela diz: "isso eu não quero na minha casa". As pessoas não querem cuidar, mal querem olhar, há muito preconceito. Temo que o aumento de casos de microcefalia provoque um surto de abandonos — afirma a neuropediatra, especialista em paralisia cerebral, Adriana Ávila de Espíndola.
A dor da rejeição Fernanda Silva Costa, de 38 anos, conheceu dentro de casa. Ela é mãe de Artur, de 3 anos, que nasceu com microcefalia e paralisia cerebral. A criança não enxerga, não fala, não anda, não consegue se sentar sozinha, não engole nenhuma comida que não seja pastosa. Ela e o marido se desdobram nos cuidados com o pequeno, que incluem uma agenda médica extensa. Mas a mãe de Fernanda, avó de Artur, se recusa a chegar perto da criança.
— Ela não o pega no colo, arruma desculpas para não acompanhar no médico, parece que sente nojo dele. Isso machuca muito. Agora estamos tentando matriculá-lo em alguma escola, mas nenhuma delas aceita, dizem que não têm condições. Os pais não deixam suas crianças chegarem perto do Artur. Não querem deixá-lo entrar na sociedade — conta Fernanda, que leva o filho para tratamento na Cruz Verde.
Além do preconceito, as mães enfrentam a falta de terapias e opções médicas no sistema público de saúde para tratar suas crianças. Pacientes com paralisia cerebral precisam de estimulação contínua para uma maior qualidade de vida. Com custo de R$ 15 milhões anuais, a Cruz Verde se equilibra entre a escassez de verba pública - o SUS custeia 50% das despesas - e a necessidade de doações de mais de 50 empresas para seguir funcionando. Os administradores se assombram diante da possibilidade de que a demanda por seus cuidados aumente diante do nascimento em massa de bebês com microcefalia, resultante da infecção por zika vírus. A superintendente do hospital Marilena Pacios resume a aflição:
— O que faremos agora diante de uma parcela dessa geração nascendo quase sem cérebro? Isso é uma tragédia.
*Nomes fictícios
Fonte: O Globo
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/brasil/familias-abandonam-criancas-com-microcefalia-paralisia-cerebral-18447204#ixzz3yT3A2v6P
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terça-feira, 26 de janeiro de 2016
As injustiças da Justiça brasileira
Erros e descasos em processos criminais levam à prisão de inocentes por até duas décadas
por André Miranda / Dandara Tinoco
26/01/2016 6:00 / Atualizado 26/01/2016 12:50
RIO - A ausência de dados oficiais sobre as prisões provocadas por erros dos agentes públicos é um indício da invisibilidade dessas “vítimas” do sistema penal: órgão do Ministério da Justiça, o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) diz não contar com estudos a respeito de condenados injustamente e sugere uma consulta aos bancos de dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ); já o CNJ afirma não acompanhar esses casos e sugere que o Depen seja procurado. Pesquisas independentes, no entanto, mostram a gravidade das prisões injustas no Brasil. Em 2013, só no Rio, 772 foram presos, supostamente em flagrante, para depois serem absolvidos. O levantamento foi realizado pelo Instituto Sou da Paz em parceria com o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), da Universidade Cândido Mendes. O número, que inclui pessoas inocentadas e liberadas por falta de provas, corresponde a cerca de 10% dos 7.734 flagrantes na cidade durante o ano.
— Isso mostra a triste realidade do sistema de Justiça criminal no Brasil — critica Ivan Marques, diretor do Instituto Sou da Paz: — Nossos juízes e policiais têm uma ânsia de encarcerar as pessoas. Os erros cometidos não são poucos. Há casos de gente presa provisoriamente por mais de cem dias e que depois é absolvida. É um absurdo do ponto de vista público, pelo valor gasto pelo Estado em prisões, e um fracasso do ponto de vista humano.
Assassinato cometido por homônimo
Marcos Mariano da Silva, preso por engano em Pernambuco - Hans Von Manteuffel / Agência O Globo/30-03-2005
Era apenas uma coincidência de um nome em comum, mas erros e mais erros da Justiça brasileira transformaram a vida do pernambucano Marcos Mariano da Silva. Em 1976, o então mecânico e motorista foi preso por um assassinato cometido por um homônimo na mesma cidade em que morava, Cabo de Santo Agostinho (PE). Condenado, passou seis anos encarcerado, até o verdadeiro criminoso ser detido por outro delito. Marcos, então, foi solto, mas seu martírio ainda não havia se encerrado. Três anos depois, ele foi parado numa blitz e reconhecido por policiais que sabiam da primeira acusação, mas não de sua inocência. O juiz que cuidou dessa nova prisão tampouco se preocupou em ler seu processo e o mandou de volta para o presídio, onde permaneceu até 1998. Nesse período, contraiu tuberculose e ficou cego, até mais uma vez ser solto pelo reconhecimento do equívoco. No total, Marcos passou 19 anos preso e, depois, iniciou uma nova luta por reparação. Em 2011, no dia em que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu pelo pagamento de uma indenização de R$ 2 milhões, Marcos sofreu um infarto e morreu.
HIV contraído na prisão
Heberson Lima: preso injustamente, contraiu HIV na cadeia - Divulgação / Arquivo Pessoal
Para Héberson Lima, de 34 anos, o tempo em que esteve na prisão levou não apenas dois anos e sete meses, mas também tomou dele trabalho, saúde, a família e a vontade de viver. O então auxiliar de serviços foi preso em 2003, ao ser acusado por um vizinho de estuprar uma criança de 9 anos em Manaus. No cárcere, ele foi violentado e adquiriu HIV. O caso mudou de rumo apenas quando a defensora pública Ilmair Faria Siqueira constatou que, embora a vítima tivesse reconhecido Héberson, as feições descritas pela menina não coincidiam com a do acusado. Segundo seu relato inicial, o verdadeiro autor do crime era banguela, alto e “aloirado”, um perfil que definitivamente não era o de Héberson.
— Quando o promotor viu o resultado da perícia sobre as características físicas, não teve opção, a não ser a absolvição — relata a defensora.
Uma década após ser solto, o amazonense ainda tenta que os danos que sofreu sejam reparados. Depois da prisão, ele perdeu o emprego, separou-se da mulher e teve de se submeter a tratamento para o HIV. Entre idas e vindas de processos pedindo indenização, ele agora aguarda o desfecho de ação em que solicita R$ 150 mil do Estado em favor dos dois filhos, de 13 e 15 anos.
— A prisão só me trouxe desgraça. Ficávamos amontoados, e os presos se maltratavam. Eu achava que ia sair, mas passou o primeiro ano, o segundo ano, e eu fiquei esperando. Pensei em suicídio — lembra Héberson: — Hoje, sou doente e não tenho vontade de viver. Trabalho fazendo bico, um pouco aqui e ali. Mas nem esforço físico eu posso fazer.
Ao ser questionado sobre a expectativa em ainda receber ressarcimento pela prisão, ele dispara:
— A esperança é a última que morre, mas tomara que eu não morra antes dela.
Menina presa com vinte homens
Este ano, espera-se que uma jovem receba uma indenização de R$ 85 mil por outro descaso da Justiça. Em 2007, quando tinha 15 anos, ela foi levada por furto de um celular para uma delegacia de Abaetetuba, no interior do Pará. Tanto o delegado quanto a juíza que analisaram seu caso tiveram certeza se tratar de um rapaz e a deixaram por mais de um mês numa cela com 20 homens. A adolescente foi estuprada seguidamente, até a OAB do Pará ter ciência do caso. Hoje, ela vive em outra cidade, com uma nova identidade fornecida pelo Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte. A história de Abaetetuba levou organizações de direitos humanos a buscarem e descobrirem outros casos semelhantes no Pará.
— Na época, um jogava a responsabilidade para o outro. O delegado dizia que tinham informado a juíza, mas a juíza dizia que não foi informada de que era uma menina — afirma Celina Bentes Hamoy, advogada do Centro de Defesa da Criança que defendeu a adolescente: — Quatro delegados foram denunciados e condenados por tortura e por omissão. Mas nunca foram presos, aguardam recurso. Já a juíza ficou três anos afastada, mas depois foi reconduzida ao cargo.
'Estamos na Idade Média'
Mais do que um erro pontual, casos de prisões injustas costumam ser fruto de equívocos em série. Os suspeitos são reconhecidos a partir de fotos; policiais muitas vezes são as únicas testemunhas de um crime; e há uma carência do uso de tecnologia nas investigações. Por exemplo, uma cena extremamente comum em filmes e séries é pouco disseminada no Brasil: a coleta de impressões digitais no local de um crime.
— Estamos na Idade Média — afirma Fábio Tofic, vice-presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD): — Em crimes de homicídio, as principais provas são depoimentos e, algumas vezes, uma mal-ajambrada confissão do réu. Os exames necroscópicos normalmente ajudam a explicar algumas coisas, mas não trazem certeza sobre a autoria. Nas melhores hipóteses, consegue-se um confronto entre a arma encontrada com o réu e o exame balístico. Além disso, há a questão da preservação da prova ao longo da sua movimentação. Algumas vezes as provas são esquecidas anos em um saquinho plástico guardado num armário de delegacia.
Para o juiz Fábio Uchôa, titular do 1º Tribunal do Júri do Rio de Janeiro, no entanto, os equívocos cometidos pelo Judiciário correspondem a exceções. Ele afirma que o número de casos desse tipo não é significativo.
— Os erros são pouquíssimos, se considerarmos o universo de pessoas julgadas. O número é até não considerável. Claro que o ideal é que não haja erro algum, mas qualquer obra humana está sujeita a erros — avalia o magistrado: — Acho que a Justiça criminal brasileira atende bem à sua finalidade.
Nos EUA, 1.731 pessoas soltas desde 1989
Série "Making a Murderer" conta a história de Steven Avery - Divulgaçao
A série “Making a murderer”, exibida desde dezembro no Netflix, acompanha a história de Steven Avery, um americano de 53 anos que ficou preso entre 1985 e 2003 por uma condenação de estupro. Depois de 18 anos, contudo, um exame de DNA comprovou que Avery não foi o autor do crime, e ele foi solto.
O antigo drama do americano já justificaria a grande repercussão da série, mas houve um novo desdobramento que tornou sua história ainda mais cinematográfica — e trágica. Em 2005, enquanto movia um processo contra a polícia e a promotoria responsáveis por sua prisão, Avery foi acusado de um novo crime, o assassinato de uma fotógrafa. Dois anos depois, acabou condenado à prisão perpétua. Hoje, está num presídio de segurança máxima no estado de Wisconsin.
Em “Making a murderer”, as diretoras Laura Ricciardi e Moira Demos montaram um quebra-cabeças com entrevistas, análises de peritos e material de arquivo para sustentar a inocência de Avery. Elas levantam dúvidas sobre o procedimento da Justiça e argumentam que ele foi perseguido pelas autoridades locais desde a década de 1980. De fato, a única certeza é que a série provocou um grande debate nos EUA, com gente defendendo sua soltura com a mesma gana com que outros querem mandá-lo para a forca.
A história de Avery também aumentou o debate sobre injustiças nas condenações nos EUA. A Escola de Direito da Universidade de Michigan mantém o projeto Registro Nacional de Exonerações, em que mapeia casos de liberações por erros da Justiça americana. Desde 1989, foram 1.731 pessoas soltas. O último, Ben Baker, deixou a prisão há 12 dias depois de cumprir dez de 18 anos de uma sentença por porte de cocaína e heroína em Chicago. Ele foi solto porque ficou comprovado que o policial que o investigou forjava provas contra suspeitos que se negavam a pagar suborno.
Fonte: O Globo
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domingo, 24 de janeiro de 2016
As tragédias dos índios Krenak
O índio torturado Manoel Vieira das Graças, Manoel Pankararu, nas ruínas do que sobrou do Reformatório destruído pela enchente do Rio Doce em 1979Foto: Michel Filho / Agência O Globo
Na história oficial, o Reformatório Krenak, instalado pelo governo no auge do regime militar, servia para “corrigir índios desajustados”. Para a etnia, não passou de uma “cadeia”, palco de espancamento, tortura e desaparecimentos. O Ministério Público Federal está pedindo a reparação pelas violações
RESPLENDOR (MG) - O sorriso que intensifica as rugas ao redor, no rosto de Dejanira Krenak, de 65 anos, dá lugar a um semblante consternado. Incomoda lembrar quando “não podia ser alegre, acender fogo, falar a língua, tomar um gole”. Eram algumas das proibições impostas pelo governo militar, que manteve o Reformatório Krenak na terra da etnia, de 1969 a 1972, para receber índígenas criminosos ou considerados de mau comportamento. Convênio firmado pela Fundação Nacional do Índio (Funai) deu à Polícia Militar de Minas Gerais a tarefa de cuidar das aldeias da região, no Vale do Rio Doce, já cobiçada à época por fazendeiros e mineradores. Quem desobedecesse às regras ficava preso.
94 indígenas em reformatório
Não só os krenaks conheceram a “cadeia”, como eles se referem ao reformatório. Pelo menos 94 indígenas de 15 etnias levados de 11 estados passaram por lá, segundo dois inquéritos do Ministério Público Federal (MPF) em Minas que investigam essa passagem dos anos de chumbo. Manoel Vieira das Graças, de 68 anos, é um dos que chegaram no caminhão apinhado de gente. Pankararu, da aldeia Brejo dos Padres, em Tacaratu (PE), conta que foi levado à força para o presídio com o pai, depois de se envolver em uma briga:
— Botaram nós na cadeia. Sofremos demais aqui. Batiam, machucavam os índios.
Em meio às ruínas do antigo reformatório, onde diz ter passado muitos anos, Manoel mostrou o local do “cubículo”, uma solitária, pequena e abafada, onde indisciplinados passavam noites de castigo. Havia uma passagem de água que gotejava em quem estivesse lá, o que era visto como uma forma de tortura. De dia, os indígenas tinham que trabalhar na roça e na limpeza do posto militar.
Pankararu diz não gostar de ir ao local, porque rememora a “escravidão”. Manoel é citado na lista oficial de “confinados”. Os motivos para as prisões, mostra o documento, iam de embriaguez, vadiagem, homicídio, roubos, até pederastia. Mulheres também eram punidas. Laurita Felix, de 84 anos, conta que a mãe, Bastianinha, ficou detida por três meses porque “bebeu um tantinho de pinga”. Segundo ela, era comum os presos ficarem o primeiro dia sem comer ou beber:
— Eu fui levar almoço e água para dar a ela. Eles disseram: “Não vai dar, não, porque ela é muito teimosa” — lembra.
Os índios tinham que respeitar regras, como não falar a própria língua ou pedir autorização para deixar a aldeia. Para José Alfredo de Oliveira, o Cacique Nego, era uma humilhação:
— A gente tinha que sair só debaixo de ordem, igual a um ladrão, um assassino. Uma vez, passei para o lado de lá do rio para jogar uma sinuquinha, aí me prenderam, fiquei 17 dias preso.
Os desaparecimentos intrigam os krenak mais antigos. O alvo principal eram os que tentavam fugir. Se capturados, apanhavam até “vomitar sangue”, diz Laurita. Alguns sumiam depois. Entre os “chefes” do período, o que mais aparece nos relatos dos indígenas é o do “capitão Pinheiro”, hoje major reformado da PM mineira e responsável pelo controle da região na época, tido como “bravo” e “ruim”.
Em 1972, os indígenas no local foram removidos para a Fazenda Guarani, em Carmésia (MG), que o governo de Minas deu à Funai em troca das terras tradicionais dos krenak. Esperança de um recomeço, a nova morada virou um castigo. As péssimas condições e a falta de comida, agravadas por não haver rio próximo, estão registradas em documentos oficiais.
Os krenak se dispersaram nos anos 70. Muitos já haviam passado por uma primeira expulsão. É o caso de Euclides Krenak. Com 105 anos, ele ficou mais da metade da vida entre aldeias em Mato Grosso do Sul e São Paulo. Mesmo após a área ser devolvida aos krenak, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 1993, eles relutavam em voltar.
— Tive que ir atrás dele para garantir que não tinha mais polícia aqui — conta a irmã, Dejanira.
Apesar da idade, Euclides mantém ar vigilante. De tempos em tempos, olha para a janela, como se esperasse a chegada de alguém. E resume que “morreu muito índio” na terra onde quer ser enterrado.
O MPF ajuizou, há um mês, ação pedindo reparação do Estado aos krenaks, que incluem desculpa pública, ações para resgate da língua tradicional e revisão territorial. O procurador da República Edmundo Antonio Dias defende a medida:
— O reformatório era um presídio sem previsão legal, destinado a confinar indígenas em razão de condutas em geral sequer previstas pela legislação penal, sem qualquer julgamento. Os índios não podiam viver sua própria cultura, praticar seus rituais. É uma continuação do processo de desterritorialização que começou com o Brasil Colônia e que foi intensificado, no século passado, durante o período do regime militar.
A Funai, em nota, reconheceu a violência sofrida pelos indígenas na ditadura e lembrou que a Comissão Nacional da Verdade estimou ao menos 8.350 indígenas mortos “em decorrência da ação direta ou da omissão de agentes governamentais”.
Além do órgão indigenista, foram acionados judicialmente a Fundação Rural Minas, o estado de Minas e o major Manoel Pinheiro. A Rural Minas informou que não colaborou com as supostas violações. Os demais não retornaram.
Visão desoladora. Família indígena observa o Rio Doce tomado por por rejeitos: cerca evita que bois bebam a água - Michel Filho / Agência O Globo
Na terra indígena Krenak, que abriga cerca de 400 pessoas em quatro mil hectares, na margem esquerda do Rio Doce, cercas foram colocadas recentemente, parte do plano de redução de danos das empresas envolvidas no rompimento da barragem do Fundão, em Mariana (MG). A medida visa evitar que animais criados pelos indígenas, especialmente bois, bebam água do rio. Com os olhos úmidos, Irani Felix aponta incrédula para o obstáculo:
— Nunca pensei ter uma cerca impedindo a gente de chegar no rio — comenta.
O pequeno Naktã, de 5 anos, filho mais novo de Irani, reclama de não ter mais onde aprender a nadar. Apesar do chinelo do Capitão América e joguinhos no celular da mãe, que o deixam tão semelhante a qualquer garoto de fora da aldeia, a criança mostra uma relação diferente com o Rio Doce. Fala com pesar sobre o “montão de peixe” que morreu perto da casa da família. E lista córregos e riachos próximos onde ele talvez possa encontrar lambari.
Pescar e beber água é a preocupação de José Cecílio Damasceno, ou Takruko, como se apresenta logo depois de usar o nome de “branco”. O indígena fala com desespero da sujeira que tomou conta do leito do rio, chamando-o de “rio do amargor”. Além da renda obtida com o trabalho de barqueiro pela prefeitura, ele recorria ao Doce para reforçar o orçamento:
— O rio dava tudo para nós. Se eu precisava de um pacote de açúcar, pescava e vendia para os restaurantes. Agora está tudo morto.
A água mineral que vem sendo distribuída pelas empresas, segundo ele, não “mata a sede da gente”. Em todas as casas da terra indígena, há caixas azuis que armazenam a água distribuída por carros-pipa, destinada aos animais e afazeres domésticos. Na última semana, porém, as chuvas que atingiram a região têm dificultado a chegada do recurso.
— Choveu demais e, em muitas estradas, os carros-pipa não passam. Teve queda de barreira, está muito difícil — diz Douglas Krenak, líder jovem da etnia.
Barbicha, roupas esportivas, internet em casa, Douglas representa as mudanças pelas quais o povo Krenak passou ao longo do tempo. As seis aldeias que formam a terra indígena guardam pouca semelhança com o que era na década de 1960 e 1970, quando os militares passaram a comandar o local. A mata diminuiu, deu lugar a pastos, que alimentam os bois criados pelos indígenas. A comunidade se engajou num projeto de produção de leite para cooperativas, que hoje representa boa parte da renda dos moradores.
Carros, motos e antenas parabólicas são itens quase obrigatórios na porta das casas de alvenaria, bem modestas, onde os indígenas moram. O casamento com “brancos” é outra prática comum da geração jovem das aldeias. O cabelo geralmente escorrido e escuro deixou de ser regra entre a criançada que corre na frente das casas. Nem por isso, defende o procurador Edmundo Antônio Dias, perdem a condição de indígenas:
— Segundo a Convenção 169 (da OIT), povo indígena é o que se reconhece como tal, esteja ele onde estiver. Não é porque as condições mudaram, que o jovem passou a estudar, fazer faculdade, que se perdem os valores próprios deles.
O povo Krenak pede à Funai uma revisão territorial da terra indígena já demarcada. Eles reivindicam a área de Sete Salões, que fica do outro lado do rio e é parte de um parque estadual, muito visitado por turistas. Segundo a Funai, o grupo de trabalho que fará os estudos necessários à identificação e à eventual nova delimitação deverá ser retomado no primeiro semestre deste ano. Os indígenas alegam que se trata de um local sagrado, onde os antepassados viviam.
Atualmente, há no Brasil 37 terras indígenas delimitadas, 66 declaradas, oito homologadas e 434 regularizadas, fase final do procedimento, segundo a Funai. No total, são 545 áreas nas mais diferentes fases de reconhecimento.
Fonte: O Globo
Na história oficial, o Reformatório Krenak, instalado pelo governo no auge do regime militar, servia para “corrigir índios desajustados”. Para a etnia, não passou de uma “cadeia”, palco de espancamento, tortura e desaparecimentos. O Ministério Público Federal está pedindo a reparação pelas violações
RESPLENDOR (MG) - O sorriso que intensifica as rugas ao redor, no rosto de Dejanira Krenak, de 65 anos, dá lugar a um semblante consternado. Incomoda lembrar quando “não podia ser alegre, acender fogo, falar a língua, tomar um gole”. Eram algumas das proibições impostas pelo governo militar, que manteve o Reformatório Krenak na terra da etnia, de 1969 a 1972, para receber índígenas criminosos ou considerados de mau comportamento. Convênio firmado pela Fundação Nacional do Índio (Funai) deu à Polícia Militar de Minas Gerais a tarefa de cuidar das aldeias da região, no Vale do Rio Doce, já cobiçada à época por fazendeiros e mineradores. Quem desobedecesse às regras ficava preso.
94 indígenas em reformatório
Não só os krenaks conheceram a “cadeia”, como eles se referem ao reformatório. Pelo menos 94 indígenas de 15 etnias levados de 11 estados passaram por lá, segundo dois inquéritos do Ministério Público Federal (MPF) em Minas que investigam essa passagem dos anos de chumbo. Manoel Vieira das Graças, de 68 anos, é um dos que chegaram no caminhão apinhado de gente. Pankararu, da aldeia Brejo dos Padres, em Tacaratu (PE), conta que foi levado à força para o presídio com o pai, depois de se envolver em uma briga:
— Botaram nós na cadeia. Sofremos demais aqui. Batiam, machucavam os índios.
Em meio às ruínas do antigo reformatório, onde diz ter passado muitos anos, Manoel mostrou o local do “cubículo”, uma solitária, pequena e abafada, onde indisciplinados passavam noites de castigo. Havia uma passagem de água que gotejava em quem estivesse lá, o que era visto como uma forma de tortura. De dia, os indígenas tinham que trabalhar na roça e na limpeza do posto militar.
Pankararu diz não gostar de ir ao local, porque rememora a “escravidão”. Manoel é citado na lista oficial de “confinados”. Os motivos para as prisões, mostra o documento, iam de embriaguez, vadiagem, homicídio, roubos, até pederastia. Mulheres também eram punidas. Laurita Felix, de 84 anos, conta que a mãe, Bastianinha, ficou detida por três meses porque “bebeu um tantinho de pinga”. Segundo ela, era comum os presos ficarem o primeiro dia sem comer ou beber:
— Eu fui levar almoço e água para dar a ela. Eles disseram: “Não vai dar, não, porque ela é muito teimosa” — lembra.
Os índios tinham que respeitar regras, como não falar a própria língua ou pedir autorização para deixar a aldeia. Para José Alfredo de Oliveira, o Cacique Nego, era uma humilhação:
— A gente tinha que sair só debaixo de ordem, igual a um ladrão, um assassino. Uma vez, passei para o lado de lá do rio para jogar uma sinuquinha, aí me prenderam, fiquei 17 dias preso.
Os desaparecimentos intrigam os krenak mais antigos. O alvo principal eram os que tentavam fugir. Se capturados, apanhavam até “vomitar sangue”, diz Laurita. Alguns sumiam depois. Entre os “chefes” do período, o que mais aparece nos relatos dos indígenas é o do “capitão Pinheiro”, hoje major reformado da PM mineira e responsável pelo controle da região na época, tido como “bravo” e “ruim”.
Em 1972, os indígenas no local foram removidos para a Fazenda Guarani, em Carmésia (MG), que o governo de Minas deu à Funai em troca das terras tradicionais dos krenak. Esperança de um recomeço, a nova morada virou um castigo. As péssimas condições e a falta de comida, agravadas por não haver rio próximo, estão registradas em documentos oficiais.
Os krenak se dispersaram nos anos 70. Muitos já haviam passado por uma primeira expulsão. É o caso de Euclides Krenak. Com 105 anos, ele ficou mais da metade da vida entre aldeias em Mato Grosso do Sul e São Paulo. Mesmo após a área ser devolvida aos krenak, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 1993, eles relutavam em voltar.
— Tive que ir atrás dele para garantir que não tinha mais polícia aqui — conta a irmã, Dejanira.
Apesar da idade, Euclides mantém ar vigilante. De tempos em tempos, olha para a janela, como se esperasse a chegada de alguém. E resume que “morreu muito índio” na terra onde quer ser enterrado.
O MPF ajuizou, há um mês, ação pedindo reparação do Estado aos krenaks, que incluem desculpa pública, ações para resgate da língua tradicional e revisão territorial. O procurador da República Edmundo Antonio Dias defende a medida:
— O reformatório era um presídio sem previsão legal, destinado a confinar indígenas em razão de condutas em geral sequer previstas pela legislação penal, sem qualquer julgamento. Os índios não podiam viver sua própria cultura, praticar seus rituais. É uma continuação do processo de desterritorialização que começou com o Brasil Colônia e que foi intensificado, no século passado, durante o período do regime militar.
A Funai, em nota, reconheceu a violência sofrida pelos indígenas na ditadura e lembrou que a Comissão Nacional da Verdade estimou ao menos 8.350 indígenas mortos “em decorrência da ação direta ou da omissão de agentes governamentais”.
Além do órgão indigenista, foram acionados judicialmente a Fundação Rural Minas, o estado de Minas e o major Manoel Pinheiro. A Rural Minas informou que não colaborou com as supostas violações. Os demais não retornaram.
Visão desoladora. Família indígena observa o Rio Doce tomado por por rejeitos: cerca evita que bois bebam a água - Michel Filho / Agência O Globo
Na terra indígena Krenak, que abriga cerca de 400 pessoas em quatro mil hectares, na margem esquerda do Rio Doce, cercas foram colocadas recentemente, parte do plano de redução de danos das empresas envolvidas no rompimento da barragem do Fundão, em Mariana (MG). A medida visa evitar que animais criados pelos indígenas, especialmente bois, bebam água do rio. Com os olhos úmidos, Irani Felix aponta incrédula para o obstáculo:
— Nunca pensei ter uma cerca impedindo a gente de chegar no rio — comenta.
O pequeno Naktã, de 5 anos, filho mais novo de Irani, reclama de não ter mais onde aprender a nadar. Apesar do chinelo do Capitão América e joguinhos no celular da mãe, que o deixam tão semelhante a qualquer garoto de fora da aldeia, a criança mostra uma relação diferente com o Rio Doce. Fala com pesar sobre o “montão de peixe” que morreu perto da casa da família. E lista córregos e riachos próximos onde ele talvez possa encontrar lambari.
Pescar e beber água é a preocupação de José Cecílio Damasceno, ou Takruko, como se apresenta logo depois de usar o nome de “branco”. O indígena fala com desespero da sujeira que tomou conta do leito do rio, chamando-o de “rio do amargor”. Além da renda obtida com o trabalho de barqueiro pela prefeitura, ele recorria ao Doce para reforçar o orçamento:
— O rio dava tudo para nós. Se eu precisava de um pacote de açúcar, pescava e vendia para os restaurantes. Agora está tudo morto.
A água mineral que vem sendo distribuída pelas empresas, segundo ele, não “mata a sede da gente”. Em todas as casas da terra indígena, há caixas azuis que armazenam a água distribuída por carros-pipa, destinada aos animais e afazeres domésticos. Na última semana, porém, as chuvas que atingiram a região têm dificultado a chegada do recurso.
— Choveu demais e, em muitas estradas, os carros-pipa não passam. Teve queda de barreira, está muito difícil — diz Douglas Krenak, líder jovem da etnia.
Barbicha, roupas esportivas, internet em casa, Douglas representa as mudanças pelas quais o povo Krenak passou ao longo do tempo. As seis aldeias que formam a terra indígena guardam pouca semelhança com o que era na década de 1960 e 1970, quando os militares passaram a comandar o local. A mata diminuiu, deu lugar a pastos, que alimentam os bois criados pelos indígenas. A comunidade se engajou num projeto de produção de leite para cooperativas, que hoje representa boa parte da renda dos moradores.
Carros, motos e antenas parabólicas são itens quase obrigatórios na porta das casas de alvenaria, bem modestas, onde os indígenas moram. O casamento com “brancos” é outra prática comum da geração jovem das aldeias. O cabelo geralmente escorrido e escuro deixou de ser regra entre a criançada que corre na frente das casas. Nem por isso, defende o procurador Edmundo Antônio Dias, perdem a condição de indígenas:
— Segundo a Convenção 169 (da OIT), povo indígena é o que se reconhece como tal, esteja ele onde estiver. Não é porque as condições mudaram, que o jovem passou a estudar, fazer faculdade, que se perdem os valores próprios deles.
O povo Krenak pede à Funai uma revisão territorial da terra indígena já demarcada. Eles reivindicam a área de Sete Salões, que fica do outro lado do rio e é parte de um parque estadual, muito visitado por turistas. Segundo a Funai, o grupo de trabalho que fará os estudos necessários à identificação e à eventual nova delimitação deverá ser retomado no primeiro semestre deste ano. Os indígenas alegam que se trata de um local sagrado, onde os antepassados viviam.
Atualmente, há no Brasil 37 terras indígenas delimitadas, 66 declaradas, oito homologadas e 434 regularizadas, fase final do procedimento, segundo a Funai. No total, são 545 áreas nas mais diferentes fases de reconhecimento.
Fonte: O Globo
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