sábado, 14 de setembro de 2013

O problema dos adolescentes que ficam acordados até tarde

Eles encontram energia para bater papo, jogar videogame e ver TV justamente à noite

Jaqueline Sordi
jaqueline.sordi@zerohora.com.br

As noites costumam ser barulhentas na casa da família Pimentel. Assim que o sol se põe, o volume dos jogos de videogame começa a se mesclar com barulho da TV, conversas ao telefone e mensagens de celular. Enquanto a servidora pública Luciana Santos prepara a janta para os dois filhos, Pedro, 14 anos, e Roberta, 18, os jovens se preparam para o turno mais agitado do dia.

A excitação — sonora, visual e mental — normalmente só dá trégua depois da meia-noite, não sem antes provocar um desgaste nos pais. O chavão "só mais cinco minutinhos", usado pelos filhos para estender por meia hora as conversas ao telefone, ou por uma hora os jogos no tablet, é contestado por Luciana e seu marido, o delegado Roberto Pimentel, 53 anos, com ordens para irem imediatamente à cama. Raramente elas são cumpridas.

— O Pedro, às vezes, fica trancado no quarto com tablet e TV ligada, então nem sabemos bem a hora em que ele pega no sono — admite a mãe.

As consequências são sentidas logo na manhã seguinte. Para o menino, acordar às 6h30min por causa da escola é um sacrifício. Como resultado das poucas horas na cama, a atenção em sala de aula fica comprometida. Quando o sono não é recuperado, até as atividades extracurriculares são prejudicadas.

— Quando ele dorme à tarde, nada o acorda. Em algumas ocasiões, acaba perdendo as aulas de karatê, que costuma frequentar três vezes por semana — conta Luciana.

Assim como na maioria das famílias com adolescentes, os conflitos entre o casal e os filhos aparecem, principalmente, na hora de dormir. O sono dos jovens, que é motivo de preocupação para muitos pais, é também assunto recorrente de trabalhos científicos.

Diferentemente do que muitas famílias pensam, o comportamento de Pedro, semelhante ao da grande maioria dos adolescentes, não se trata apenas de uma rebeldia juvenil. Atuam fatores psicológicos e biológicos nesse sono tardio.

Bom senso para entender etapa peculiar da formação

A psicanalista Katia Radke, membro da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre (SPPA) e professora do Centro de Estudos, Atendimento e Pesquisa da Infância e Adolescência (Ceapia), destaca que os pais precisam ter bom senso nesta etapa da vida dos filhos e entender que é um momento peculiar na formação deles.

A adolescência é o momento da solidificação da identidade e, para consolidar suas personalidades, eles tentam impor uma certa resistência às regras dos pais, de quem sentem necessidade de se diferenciar. Esse comportamento acaba afetando as rotinas estabelecidas por eles, como a hora de ir dormir.

— Está na etimologia da palavra: adolescer significa crescer. Os jovens precisam se diferenciar para se legitimarem como indivíduos e, por isso, precisam ter uma rotina diferente daquela imposta pela família, mas sem romper completamente com as normas estabelecidas.

No campo de batalha, os hormônios

Além da revolução psicológica em curso nesta etapa da vida, a adolescência é caracterizada por uma revolução hormonal que impacta em rotinas, hábitos e ciclos biológicos. Dentro dela está a produção da melatonina, hormônio que regula a vontade de dormir.

Conforme a médica Michele Becker, neurologista infantil do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e do Hospital da Criança Conceição, a vontade de dormir e acordar mais tarde faz parte do processo natural de amadurecimento.

Ao longo da infância e da adolescência, o corpo vai se adaptando ao ritmo biológico de dormir e acordar conforme o ciclo dia-noite. Essa adaptação é influenciada por alterações hormonais características de cada etapa da vida. Antes do amanhecer, por exemplo, há aumento da secreção do hormônio cortisol, que prepara o organismo para a atividade. Ao escurecer, é a vez da melatonina, que prepara para o sono.

No início da puberdade, influências hormonais atuam sobre o relógio biológico, causando a chamada "síndrome do atraso de fases do sono", um retardo de cerca de duas horas no início do sono e no despertar. Ainda não se sabe as causas exatas para o fenômeno.

— Nesta fase do desenvolvimento, é muito comum que os adolescentes queiram dormir e acordar tarde. Os pais devem inicialmente entender que isso faz parte da adolescência e somente intervir se for exagerado ou se estiver trazendo prejuízos ao jovem — destaca Michele.

Um carrossel de distrações tecnológicas

Ainda que dormir e acordar mais tarde sejam típicos da adolescência, a gurizada, em geral, acaba exagerando. Eles vão para a cama ainda mais tarde do que o ideal e, por terem de acordar cedo para as atividades cotidianas, acabam dormindo muito menos do que deveriam.

A neurologista infantil Michele Becker explica que, na adolescência, o período ideal de sono gira em torno de nove horas, sendo maior que o de adultos — de oito horas diárias. Apesar disso, pesquisas mostram que a média nesse período da vida está entre seis e sete horas por noite. E muitas vezes o sono não é de qualidade.

É aí que novas tecnologias — tablets, computadores, televisão, smartphones —, tão sedutores para jovens e adultos, podem se tornar inimigas do bem-estar físico e mental.
O uso das tais distrações pouco antes de dormir faz com que os jovens prolonguem seu estado de alerta e demorem mais a cair no sono. Elas aumentam a produção de adrenalina, o que deixa a pessoa mais agitada e ansiosa, explica Michele.

Além disso, conforme Camila Morelatto de Souza, psiquiatra da Infância e Adolescência e pesquisadora do Laboratório de Cronobiologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, aparelhos eletrônicos que emitem determinados tipos de luz (luzes de coloração mais azulada, por exemplo), se utilizados à noite, podem atrasar ainda mais o início da fase de sono.

Com um sono de pior qualidade, os adolescentes tendem a ter problemas de concentração e memória, estresse, irritação, desatenção e sonolência excessiva, enumera a psicanalista Katia Radke.

— Dormir pouco gera um excesso que a mente não dá conta, o que pode trazer muitos prejuízos tanto na esfera social quanto biológica — comenta.

Já que proibir o uso desses aparelhos não é viável no mundo atual, saber impor limites e negociar é a melhor estratégia para garantir que os filhos tenham uma boa noite de sono:

— Os filhos podem usar a internet, jogar games e assistir televisão depois do sol se pôr. Só é preciso estabelecer horários determinados para estas práticas, e garantir que eles fiquem sem estímulos tecnológicos por um tempo antes de irem para a cama.

Conforme Michele, o recomendável é que crianças ou adolescentes não assistam televisão ou utilizem o computador por pelo menos uma hora antes de dormir.

Cinco recomendações para regular o sono dos adolescentes

1)Dormir o mesmo número de horas diárias. Deve-se manter uma permanência de horas de sono durante todos os dias, inclusive finais de semana

2) Não praticar exercícios físicos até quatro horas antes de dormir, já que o corpo necessita desse tempo para relaxar

3) Desligar a televisão e o computador quando for dormir, já que a luz desses aparelhos mantém o cérebro funcionando como se estivéssemos acordados, atrasando a produção de neuro-hormônios que regulam o sono, como a melatonina

4) Não usar computador pelo menos uma hora antes de dormir. O corpo precisa de uma preparação tranquila para o sono. Desligar-se de fatores externos ajuda a sinalizar o cérebro de que é hora de dormir

5) Evitar alimentos estimulantes à noite ou pelo menos quatro horas antes de dormir, como os ricos em cafeína. Nessa lista estão chocolate, chá preto, chimarrão, café e refrigerantes

Sinais de que o adolescente não dorme o suficiente

1) sonolência diurna

2) cansaço excessivo

3) falta de motivação

4) desatenção

5) irritabilidade

O que ocorre enquanto dormimos?

Durante o sono, o cérebro não está apenas descansando. Na verdade, neste momento o corpo está realizando tarefas essenciais que teria dificuldades de fazer com a pessoa acordada.

Enquanto dormimos, liberamos hormônios, restaurarmos o maquinário necessário para realizar a neurotransmissão, fazemos e refazemos novas conexões sinápticas etc.


VIDA


quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Brigas entre estudantes..aumentam a cada dia

Pagodeiro se entrega e vai a julgamento: 'vim provar minha inocência'

O pagodeiro Evandro Gomes Correia Filho se entregou nesta quinta-feira, após passar quase cinco anos foragido - ele compareceu ao segundo dia de seu próprio julgamento, no Fórum de Guarulhos (SP), pelo homicídio da ex-mulher, Andréia Cristina Bezerra Nóbrega, e por tentativa de homicídio contra o próprio filho, Lucas Macedo Nóbrega Correia, 10 anos. "Vim provar minha inocência, vou provar que ela se suicidou", disse Evandro ao chegar à corte, acompanhado de seis advogados.

Para esta quinta-feira, além do depoimento de Evandro, outras seis testemunhas de defesa eram esperadas, complementando os 11 depoimentos do primeiro dia. Porém, cinco dos convocados foram dispensados, restando apenas a irmã do réu, Evandra de Mello Correia.

Na quarta-feira, a acusação arrolou as três irmãs de Andréia, para mostrar que Evandro ameaçava a ex-mulher com frequência, uma psiquiatra infantil, para provar a validade e importância do depoimento de Lucas, a pediatra do garoto na Santa Casa de Misericórdia, em São Paulo, e o dono de um estacionamento próximo ao apartamento de Andréia em Guarulhos, que afirmou ter sido ameaçado por Evandro, além de Lucas, que foi o primeiro a depor.

Já a defesa ouviu apenas quatro testemunhas, a maioria para tentar provar que Andréia tinha muito ciúme de Evandro e que também ameaçava suas ex-namoradas. Além disso, um policial militar conhecido de Evandro também prestou depoimento. A estratégia da defesa com essa testemunha foi mostrar que Evandro se preocupou com o fato da data do crime ao ligar para esse conhecido e pedir ajuda.

Disfarçado, o pagodeiro alegou inocência durante uma entrevista em 2010 no escritório do seu advogado Foto: André Lessa / Agência Estado Disfarçado, o pagodeiro alegou inocência durante uma entrevista em 2010 no escritório do seu advogado Foto: André Lessa / Agência Estado

Vítima caiu do prédio onde morava

Andréa morreu após cair da janela do terceiro andar do prédio onde morava, em Guarulhos, enquanto o menino foi internado com uma fratura do maxilar, após cair sobre a marquise da edificação.

Entre as testemunhas que serão ouvidas pelo juiz está o filho de Evandro, Lucas, hoje com 10 anos. Ele será ouvido em sigilo. No momento do depoimento, o plenário será esvaziado. Na época do crime, ele foi ouvido por delegado, um promotor, uma psicóloga e uma assistente social. O garoto chegou a desenhar um homem com uma faca na mão e uma mulher com uma criança no colo. Relatou ainda uma briga entre o casal.

Em 2010, usando peruca, barba falsa, óculos escuros e bigode, Evandro negou participação na morte da ex-mulher, durante uma entrevista coletiva no escritório de seu advogado. Naquele ano, o inquérito policial apontou Corrêa como o autor do crime. A Justiça decretou a prisão preventiva dele no final de 2008, mas como ele nunca apresentou à Justiça, é considerado foragido. Ele aproveitou a lei que impede prisões em período eleitoral para dar sua versão do caso em São Paulo. O disfarce foi usado para que ele não fosse reconhecido na cidade onde morava, em um Estado do Nordeste. Na ocasião, o pagodeiro reafirmou que a ex-mulher se jogou com o filho do apartamento depois de uma discussão.

Terra Notícias

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Doze anos após ataques de 11 de Setembro, mais de 1.000 socorristas são diagnosticados com câncer

Vítimas trabalharam, viveram ou estudaram na área próxima ao World Trade Center

Nos últimos anos, o câncer se tornou uma realidade para mais de 1.000 homens e mulheres que sacrificaram a própria saúde durante os trabalhos que sucederam os atentados de 11 de setembro de 2001 — e esse número deve crescer.

Tina Engel, uma enfermeira oncologista de um hospital no Queens, em Nova York, trabalha no local há apenas dois meses e já identificou 12 novos casos de câncer, além de 25 pacientes que aguardam o resultado de seus diagnósticos.

Amadeo Pulley, um policial de 47 anos, foi diagnosticado com câncer de rim em maio.

— Dá um nó na garganta quando você primeiramente precisa contar para sua mulher. Mas eu disse para minha família e meus dois filhos que ficarei bem. Nós vamos superar isso.

De acordo com o jornal New York Daily News, 12 anos após os ataques terroristas que deixaram quase 3.000 mortos, um estudo do Mount Sinai Medical Center encontrou uma taxa de câncer 15% maior entre os socorristas da tragédia do que entre as pessoas não expostas às toxinas do Marco Zero, resultantes da fumaça tóxica.


Desde agosto, 1.140 pessoas e socorristas que trabalharam, viveram ou estudaram na área próxima ao ataque foram diagnosticados com câncer pelo Instituto Nacional de Segurança e Saúde Ocupacional.

Especialistas como Jim Melius, líder de um programa médico voltado para as vítimas do 11 de Setembro, acreditam que o número deve crescer.

— Há mais casos por aí, nós só sabemos das pessoas que fazem parte de nosso programa porque são financiadas pelo governo, não aqueles que foram tratados por seus médicos particulares. Por causa das substâncias cancerígenas presentes no ar na região do Marco Zero, pessoas que foram expostas estão vulneráveis.

Assim como a maioria dos socorristas que estiveram no local dos ataques, o engenheiro Marty Cervellione, de 63 anos, desenvolveu refluxo respiratório e gástrico nos primeiros anos após o ocorrido. Ele permaneceu dois meses trabalhando no local onde as Torres Gêmeas foram derrubadas, repleto de objetos queimados e fumaça tóxica.

Um sintoma mais alarmante — hemorragia interna — levou ao diagnóstico de câncer gastroesofágico em 2011. Desde então, Cervellione já passou por inúmeras sessões de quimioterapia. Em 2013, um novo câncer foi descoberto e, com ele, vieram mais cirurgias e tratamentos.

— Todos sempre imaginaram que estávamos em perigo por conta da contaminação, mas o mundo inteiro esperava por nós. Senti-me muito bem por servir, não havia vontade de sair dali.

R7

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Menina de oito anos morre no Iêmen em lua de mel com marido de 40

Uma criança de oito anos morreu no último sábado (07/09) no Iêmen após a lua de mel com o marido de 40 anos, informaram nesta segunda-feira (09/09) as agências dpa e AFP. Segundo os médicos, a menina morreu com ferimentos internos no útero.

A jovem, chamada Rawan, foi vendida pelo padrasto para um saudita por cerca de R$ 6 mil, segundo o jornal alemão Der Tagesspiegel. A morte aconteceu na área tribal de Hardh, na fronteira com a Arábia Saudita.

Ativistas de direitos humanos pressionam para que o saudita e a família da menina sejam responsabilizados pela morte. "Após este caso horrível, repetimos nossa exigência para uma lei que restrinja o casamento para maiores de 18 anos", afirmou um membro do Centro Iemenita de Direitos Humanos para a dpa.

Em 2010, outra garota de 13 anos já havia morrido com sangramentos internos cinco dias após o casamento (forçado), de acordo com outra organização de direitos humanos que atua na região.

Há quatro anos, uma lei tentou colocar a idade mínima de 17 anos para o casamento. No entanto, ela foi rejeitada por parlamentares conservadores, que a classificaram de "não islâmica".

Fonte: Opera Mundi


Geledés Instituto da Mulher Negra

Violência crua, um flagrante de trabalho infantil em matadouro

Crianças de 12 anos trabalham com facas afiadas no corte de bois no interior do Rio Grande do Norte. Banalização da violência afeta desenvolvimento, alertam especialistas

Texto e fotos por Daniel Santini, da Repórter Brasil, especial para o Promenino

Atenção: texto e imagens fortes a seguir


Enviado a Lagoa de Pedras (RN) - O boi branco está amarrado pela perna esquerda, com uma corda atada a uma cerca de madeira. São doze homens dentro do matadouro municipal de Lagoa de Pedras, município do interior do Rio Grande do Norte com população estimada em 7.372 pessoas e rebanho de 5.100 bovinos. Duas crianças esperam, trepadas na cerca. O boi hesita. Um dos homens levanta uma marreta e, sem pestanejar, desce ela com toda força na direção da testa do animal.

Uma fração de segundo, o boi desvia a cabeça, a pancada passa a milímetros do seu olho direito. O lugar cheira a sangue e merda. Um dos meninos sorri. Os homens gritam, o boi gira, desesperado, preso à corda. A segunda marretada é precisa. O boi branco cai, tendo espasmos, tentando coices inúteis, morre devagar. O corpo é arrastado para fora, outro boi é trazido para dentro do galpão aberto, sem paredes, sem nenhuma estrutura. Homens jogam água no chão de cimento onde ficou sangue, há mofo na mureta que limita o espaço, o ferro que segura as telhas está todo enferrujado.

Do lado de fora, onde há mais espaço para trabalhar, outros dois meninos de 12 anos com facas pontiagudas e afiadas estão debruçados sobre outro boi recém-morto. Praticamente um em cada três habitantes de Lagoa de Pedras tem menos de 15 anos. Em 2010, a mortalidade infantil do município era de 29,6 para cada mil nascidos vivos, média bem acima da nacional (19,7) e da estadual (16,7). A atividade em matadouros está entre as Piores Formas de Trabalho Infantil estabelecidas pela Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário. Assim como os adultos, as duas crianças trabalham de chinelos, ficando descalças em diversos momentos para andar sobre a carne, com o cuidado de se equilibrar para não fazer os órgãos internos romperem.

Apenas um dos trabalhadores usa botas de plástico. Não há nenhum outro equipamento de proteção. Os meninos hesitam ao verem a chegada da equipe de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego. A auditora fiscal do trabalho Marinalva Cardoso Dantas, coordenadora do Fórum Estadual de Erradicação do Trabalho da Criança e de Proteção ao Adolescente Trabalhador, para ao lado dos dois. Ao seu lado, a auditora fiscal Virna Soraya Damasceno olha com dificuldade para a cena crua, vermelha. A carne, mesmo com o animal morto, ainda se mexe. São breves espasmos dos músculos, agora já descobertos, sem pele. O pai de uma das crianças, depois de cumprimentar a todos educadamente, dá um grito para um dos meninos. “Vai ficar aí parado? Não tem de ter vergonha, você está trabalhando, não na rua roubando!”.

O mais magricelo volta a se debruçar e trabalhar, e fica praticamente dentro da barriga do boi. O outro ainda titubeia por alguns momentos, antes de abaixar e ajudar o colega. Nenhum dos outros garotos que estavam esperando o outro boi ser morto se aproxima enquanto a fiscalização está presente.

A auditora Marinalva Dantas registra a situação com uma câmara fotográfica, identifica as crianças e conversa com elas. As informações servirão de base para um relatório a ser entregue ao Conselho Tutelar da cidade e para a cobrança de providências da Prefeitura em relação às condições de trabalho no matadouro municipal. A estratégia de autuar e responsabilizar o poder público é a mesma utilizada em ações em outros matadouros públicos e em feiras livres em outras das cidades da caatinga onde o emprego de crianças em tarefas pesadas insalubres é cotidiano, comum.

Em um contexto grave de pobreza e miséria, responsabilizar as famílias pura e simplesmente não basta, explica a auditora. Adultos e crianças trabalham nos abatedouros por comida. Os meninos costumam receber, em troca da limpeza do “fato” do boi, como são chamadas as entranhas do animal, miúdos e tripas de menor valor.

Também é difícil responsabilizar quem se beneficia economicamente do sistema estabelecido. Em Lagoa de Pedras, os bois costumam ser levados ao abatedouro por pequenos produtores locais e são abatidos no domingo, na véspera da feira livre local, onde a carne é vendida, muitas vezes, também por meninos. A cidade é uma das mais carentes do país. Com Índice de Desenvolvimento Humano Municipal de 0.553 (em um critério que vai de 0 a 1), Lagoa de Pedras ocupava em 2010 a 5.150ª posição entre os 5.565 municípios brasileiros.

Banalização


O trabalho infantil é tido como algo normal na região. Fiscalizar a prática não é tarefa fácil e há até quem hostilize os auditores. É fácil ouvir os adultos defenderem, mesmo dentro dos matadouros, que criança tem de trabalhar “para não virar vagabundo”, “para não se envolver com droga” e “para aprender uma profissão”, só para citar alguns dos argumentos repetidos a esmo.

A psicóloga infantil Christiane Sanches, do Centro de Referência às Vítimas da Violência, do Instituto Sedes Sapientiae de São
Paulo, alerta, no entanto, que crianças vítimas de trabalho infantil estão mais sujeitas a problemas, em especial as que se deparam com realidades cruas como a do abate de animais. “Quando a criança se depara diretamente com uma situação de extrema violência, ela rompe uma fase de desenvolvimento. A fantasia é importante, é uma forma de a criança se relacionar com a realidade”, explica, ressaltando que brincar e imaginar são atividades fundamentais para a formação de adultos responsáveis, capazes de manter boas relações sociais, relações afetivas e independência.

Nos abatedouros, a banalização da morte é marcada por episódios de crueldade e o trabalho envolve ações violentas. Entre as atividades que os garotos cumprem estão arrancar toda a pele do animal recém-morto puxando aos poucos e separando o couro com breves golpes e cortar a cabeça e as patas. A noção do que é vida e morte se dilui na mesma medida que o sangue se espalha pelas mãos, pés e pernas desnudas de moleques magrelos. A auditora fiscal Marinalva Dantas conta que em uma das ações flagrou crianças “brincando” de espetar um boi ainda vivo com lâminas.

Mestre em Distúrbios do Desenvolvimento, a psicóloga Christiane Sanches explica que a frieza e falta de sensibilidade podem ser mecanismos de defesa de crianças que tiveram contato com eventos de extrema agressividade. “A família tem de ter a preocupação em relação a uma profissão, mas dentro de uma faixa de desenvolvimento adequada. É preciso respeitar etapas. O trabalho infantil é uma ruptura do que se espera de determinadas fases. Quanto menor a faixa etária, mais grave a situação”, alerta, destacando que o fato de a atividade ser considerada normal pela comunidade agrava a situação. “Ao fazer o corte, a criança está seguindo o modelo da família, está exercendo um papel dentro da sociedade. Se não aceitar, está excluída, o que provoca desamparo emocional. Não trabalhar vira uma vergonha”, diz.

Estômago aberto, sangue e fezes

Em um canto do abatedouro, um dos cachorros que ronda o local aproxima-se de um pedaço de carne crua sangrando. Com uma machadinha na mão, um dos adultos que trabalha quebrando os ossos da base do peito de um boi morto para ao perceber o avanço, gira o instrumento e dá um golpe com o cabo. O animal dá um ganido, late e se afasta rápido, a tempo de evitar a pancada. A dois passos, outro trabalhador carrega o intestino de um boi.

Ele faz furos com o facão para o ar sair e a pele não romper ao ser erguida, leva com cuidado o órgão até o fundo do terreno e, com um golpe seco, abre o intestino. A merda escorre em um canal aberto junto com sangue e outros dejetos. Um tanto se espalha no chão, o homem caminha descalço sobre a sujeira. O cheiro é insuportável. A menos de dois passos, os garotos trabalham no boi, terminando de separar os pedaços de carne. “A gente se corta às vezes. Eu já fiquei com o pé todo em carne viva”, conta um dos trabalhadores adultos, puxando e ajeitando um pedaço de carne com a faca. “Trabalho com isso desde que eu tinha 9 anos. Aqui todo mundo é assim. E trabalho para viver. Melhor do que roubar, né?”, conta.

Por si só, as condições de trabalho em abatedouros e empresas de processamento de carne já são consideradas problemáticas. Em 2011, de acordo com dados do Ministério da Previdência Social (MPAS), ocorreram 19.453 acidentes de trabalho e 32 mortes envolvendo o setor. Os problemas levaram o Ministério do Trabalho e Emprego a estabelecer em abril de 2013 a Norma Regulamentadora nº 36, que, entre outras medidas, determina adequação e organização de postos de trabalho.

Em Lagoa de Pedra, crianças e adultos que trabalham no matadouro ostentam cortes abertos, marcas de acidentes leves ou profundos. “Trabalhadores com lesões e feridas nas mãos devem ser afastados da função e evitar o contato direto com a carne, uma vez que isso pode facilitar tanto a contaminação da carne que está sendo manipulada como a infecção do trabalhador”, explica a bióloga e veterinária Isabel Cristina Lopes Dias, mestre em Saúde e Ambiente.

“A desproteção desses trabalhadores e o contato direto e/ou indireto com animais e/ou suas secreções são situações críticas de exposição e transmissão de microrganismos zoonóticos. As crianças estão mais vulneráveis tanto às doenças quanto aos acidentes, pois precisam realizar tarefas e manusear instrumentos desconexos de sua capacidade física e psicológica, justamente em uma fase em que são mais imaturas e ingênuas.”

promenino

"Nada nos chamou a atenção", diz gerente de restaurante que Champignon frequentou antes de morrer


Músico e a mulher jantaram com um casal de amigos na véspera da morte de Champignon

Champignon, ex-baixista do Charlie Brown Jr, foi encontrado morto nesta segunda-feira (9), em seu apartamento no bairro do Morumbi, em São Paulo. Antes do ocorrido, o músico e sua mulher, Claudia Bossle Campos, saíram com amigos para jantar em um restaurante japonês no domingo (8). Segundo a gerente do estabelecimento, os funcionários não presenciaram nenhuma briga na mesa do casal por conta do movimento no local.

— Os funcionários só registram o pedido e entregam, então não tenho como falar, mas não aconteceu nada que nos chamasse a atenção. O restaurante estava muito lotado e minha memória não gravou.

Fãs vão ao IML de São Paulo se despedir de Champignon
... A delegada Milena Suegama, responsável pelo caso, afirma que a mulher do músico disse em depoimento que os dois discutiram durante o jantar em um restaurante japonês e que, por isso, subiram em silêncio no elevador.

De acordo com o boletim de ocorrência feito sobre o caso, o músico havia tomado duas garrafas de saquê no restaurante.

Entenda o caso

A delegada revelou à reportagem do Hoje em Dia, da Record, que foram encontradas duas marcas de tiros no ambiente que o baixista usava como escritório e estúdio. Um disparo estava no chão, como se o músico tivesse testado a arma. O outro foi o tiro fatal na cabeça.

Os tiros no apartamento foram feitos com uma pistola .380. Além desta arma, o músico teria uma espingarda calibre 12 em casa.

Champignon tinha 35 anos e teve uma carreira consolidada como baixista do Charlie Brown Jr. O músico também teve passagens pelas extintas bandas Revolucionnarios e Nove Mil Anjos. A morte de Champignon acontece seis meses depois do falecimento de Chorão, seu parceiro musical por décadas. Chorão morreu em 6 de março deste ano por overdose de cocaína.

R7
Verbratec© Desktop.