sábado, 24 de agosto de 2013

'Me sinto sozinho', disse filho de PMs a colegas de escola antes de chacina

Segundo amigos, Marcelo Pesseghini se queixava da ausência dos pais.
Polícia quer traçar perfil de suspeito de matar família e se suicidar em SP.

De acordo com depoimentos dados à Polícia Civil de São Paulo por cinco colegas de escola Marcelo Pesseghini, principal suspeito de matar a família e se suicidar em seguida, o adolescente se queixava que se sentia "sozinho" mesmo quando seus pais, que eram policiais militares, voltavam cansados do trabalho. Está sendo investigado se o casal passava por alguma crise conjugal e se isso poderia ter contribuído de algum modo para o estudante de 13 anos cometer os crimes. Os parentes da vítima não acreditam que o garoto seja o assassino.

“Me sinto sozinho”, disse Marcelo aos amigos do Colégio Stella Rodrigues, segundo eles contaram ao Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP). O órgão investiga a autoria da chacina ocorrida entre os dias 4 e 5 de agosto dentro de duas casas num mesmo terreno na Brasilândia, na Zona Norte da capital.

O DHPP pretende ouvir ainda na próxima semana mais dois amigos do colégio que teriam aparecido caminhando ao lado de ‘Marcelinho’, como era chamado, em imagens gravadas por câmeras de segurança. A investigação também quer colher os depoimentos de cinco policiais militares que poderiam ter entrado nas residências onde as vítimas foram encontradas mortas. Mais de 40 pessoas já falaram com o departamento.

Também são aguardados os laudos do Instituto Médico Legal (IML) e do Instituto de Criminalística (IC), da Política Técnico-Científica, para corroborar com a tese de que Marcelinho assassinou com tiros nas cabeças: os pais, o sargento das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) Luís Marcelo Pesseghini, de 40 anos, e a cabo Andreia Regina Bovo Pesseghini, de 36 anos, a avó materna Benedita de Oliveira Bovo, de 67 anos, e a tia-avó Bernadete Oliveira da Silva, de 55 anos. Em seguida, o investigado teria se matado com um disparo na cabeça. A arma usada foi uma só: a pistola .40 da mãe.

O motivo dos assassinatos e do suposto suicídio ainda não são conhecidos. O objetivo dos policiais com os depoimentos e com os laudos é o de traçar o perfil psicológico do garoto de 13 anos; tentar esclarecer o caso e entender quais teriam sido as razões que levaram Marcelinho, o único suspeito, a cometer os crimes. Entre as hipóteses estão a de surto psicótico desencadeado por algum grande trauma. O estudante morava com os pais num dos imóveis. No outro ficavam a avó e a tia-avó. Quando não estava em casa, ia para a escola ou estava fazendo tratamento contra uma doença genética que tinha. Segundo relatos de testemunhas, ficava a maior parte do tempo em casa, mesmo durante as brincadeiras com os poucos amigos que possuía.

Game
Desde o dia dos crimes, algumas informações levadas ao conhecimento do DHPP, principalmente por conta dos depoimentos dos colegas, mostram que Marcelinho havia criado um grupo, “Os Mercenários", inspirado no game "Assassins Creed". Um mês antes da tragédia, o suspeito havia colocado a foto do personagem principal do jogo na sua página pessoal do Facebook.

Segundo autoridades ligadas à investigação, no grupo "Os Mercenários" havia uma lista com nomes de desafetos que deveriam ser mortos. Um dos nomes seria o da diretora do Colégio Stella Rodrigues, Maristela Rodrigues.

Ganhariam pontos quem matasse parentes num paralelo com o game, que dá pontos ao jogador. Para os colegas, no entanto, o grupo seria uma diversão e não havia intenção de ser colocado em prática.

A influência do jogo de videogame foi citada também pelo advogado Arles Gonçalves Júnior, presidente da comissão de segurança da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo (OAB-SP). Na sexta-feira (16), ele afirmou que os depoimentos prestados revelam que o menino apresentou uma mudança de comportamento influenciada pelo jogo de videogame.

No dia 8 deste mês, a desenvolvedora de games Ubisoft, criadora do jogo Assassin's Creed, divulgou nota de repúdio à ligação feita entre o jogo e o assassinato da família Pesseghini.

O computador da família Pesseghini, que foi apreendido pela polícia, está sendo analisado para ajudar a traçar o perfil de Marcelinho.

Flechada
Segundo um dos colegas ouvidos, Marcelinho disse que havia tentando dar uma flechada na avó, mas não tinha conseguido

No dia do crime, Marcelo estava cabisbaixo dentro da sala de aula, e um dos amigos perguntou, brincando: 'tentou matar a avó de novo e não conseguiu?' Marcelo respondeu 'não, hoje consegui'. Um dos meninos disse também que naquele dia antes de entrar na sala de aula, Marcelo foi pra uma roda de amigos e disse ‘hoje matei meus pais’.

Um dos garotos falou que um dia Marcelo chegou à escola com um ferimento no rosto. O amigo perguntou o que era. Ele disse que havia atirado com uma pistola .40, e o tranco da arma o machucou.

Outro depoimento revelou que um dia Marcelo chegou à escola orgulhoso e contente dizendo ‘hoje meu pai matou dois bandidos’. Uma funcionária da escola que também já depôs, revelou que os pais foram chamados e advertidos que não deveriam fazer esse tipo de comentário perto dele.

Doença

A polícia investiga se os crimes poderiam estar relacionados à doença do garoto, que teria pouca expectativa de vida. A pneumologista Neiva Damaceno, que acompanhou o tratamento de Marcelinho contra a fibrose cística, prestou depoimento na quinta-feira (22) na polícia e reafirmou que nem a doença nem os remédios poderiam provocar alterações no comportamento do garoto, que não corria risco de morte. O DHPP queria saber se o uso contínuo de medicamentos poderia ter contribuído para os crimes.

Entre os medicamentos que Marcelinho tomava estavam vitaminas, insulina injetável e outros remédios. A fibrose cística é uma doença genética que afeta o funcionamento de secreções do corpo, levando a problemas nos pulmões e no sistema digestivo. Ela não tem cura e pode levar à morte precoce. Quando era bebê, alguns médicos teriam dito aos pais que ele não sobreviveria até os 4 anos.

Crime

Para a polícia, Marcelinho assassinou a família entre a noite do dia 4 e a madrugada do dia 5. A investigação aponta que, depois, ele foi para o Colégio Stella Rodrigues com o carro da mãe de madrugada, assistiu às aulas pela manhã, confessou os crimes a colegas, retornou de carona para a residência da família na Brasilândia, e se suicidou.

Novas imagens de câmeras de segurança mostram os dois colegas deixando a escola ao lado de Marcelinho, no dia 5 de agosto. Cerca de dez minutos depois, ele atravessa a rua e pega carona com o pai de um outro amigo para ir para casa.

Na quarta-feira (21), o delegado-geral da Polícia Civil, Maurício Blazek, disse que, apesar das investigações ainda não terem terminado, todas as evidências apontam para Marcelinho como autor dos crimes.

Laudos necroscópicos e da cena do crime que estão sendo feitos pela Polícia Técnico-Científica devem ficar prontos nos próximos dias e vão esclarecer questões ainda não explicadas pelas investigações, como a provável hora em que cada um morreu, quem foi baleado primeiro e porque a mãe foi a única que parecia estar acordada quando foi baleada. Ela estava ajoelhada sobre o colchão onde o marido dormia e com as mãos cruzadas sob a cabeça. As demais vítimas pareciam ter sido assassinadas durante o sono.

Para parentes das vítimas, Marcelinho não é o assassino. Eles acham que os crimes foram cometidos por bandidos.

G1

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