16 de setembro de 2013 - Dezenas de milhares de pessoas fugiram durante nova onda de ataques e assassinatos brutais perpetrados por grupos armados e forças do governo no noroeste da República Centro-Africana (RCA), divulgou a organização humanitária internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF). Em Bossangoa, são mais de 30 mil deslocados internos e há outros milhares nas regiões do entorno. Todos estão vivendo em condições precárias com acesso limitado ou inexistente a abrigo, água limpa, alimento e saneamento. MSF pede que todos os grupos armados respeitem a segurança de civis, da equipe médica e de agentes humanitários, além de mais assistência humanitária ao país.
“No último mês, tratamos mais de 60 pessoas em Bossangoa com ferimentos resultantes da violência, principalmente tiros e golpes de machete, incluindo mulheres e crianças”, afirma a cirurgiã Erna Rijinierse, de MSF. “Mais de 80% das cirurgias corresponderam a ferimentos relacionados ao conflito. MSF está horrorizada com o que estamos vendo, e isso inclui incêndios de vilarejos e cenas terríveis de assassinato. As pessoas que fogem estão desesperadas por assistência, bem como pela sensação de proteção que a presença organizações de ajuda traz.”
MSF ouviu diversos relatos em primeira mão de ataques caracterizados por segmentação religiosa. Isso inclui a execução, por homens armados, de oito pessoas que haviam se separado de um grupo maior quando fugiam de caminhão, e o assassinato deliberado de dois homens em um vilarejo, o que levou muitos outros da mesma religião a fugir.
Nesse clima de medo e violência, as pessoas estão fugindo para o meio da mata ou juntando-se em grupos maiores, para ter mais segurança. Em Bossangoa, estima-se que 28 mil pessoas estejam abrigadas na Missão Católica, superando em muito sua capacidade; 1.200 pessoas estão em um hospital, o que já transformou cerca de metade do prédio em um acampamento improvisado, e outras 1 mil pessoas estão buscando abrigo próximo a uma pista de pouso, enquanto mais 400 estão reunidas em uma escola. Com a continuidade da estação chuvosa, pessoas que estão nas florestas estão particularmente expostas ao risco de contraírem malária – a maior causa de morte na RCA.
“As pessoas não têm abrigo e dormem onde podem, dentro das igrejas, escolas ou debaixo de árvores. Os lugares estão superlotados e as pessoas cozinham, comem, dormem e defecam no mesmo local. Sob essas condições de saúde desastrosas, o risco de surtos de doenças é alto”, afirma Ellen Van der Velden, coordenadora geral de MSF na RCA, logo após visitar os locais. “Atualmente, MSF é uma das poucas organizações de ajuda atuando nas regiões afetadas pelo conflito no país, oferecendo cuidados de saúde que incluem cirurgia, provisão de água e saneamento e suporte nutricional. Mas muito mais precisa ser feito urgentemente.” Em todas as suas instalações, MSF trata pessoas com base em suas necessidades médicas, independentemente de convicções políticas, religiosas ou quaisquer afiliações.
Desde outubro, violência e confrontos mortais têm sido reportados em Bouca e Garga, no noroeste da RCA, e em Mbaiki, no sudoeste. De lá para cá, civis, equipes médicas e agentes humanitários têm estado sujeitos a agressões físicas. MSF testemunhou diretamente a execução de um profissional de saúde, além de múltiplos e violentos ataques a agentes humanitários. Em Bouca, a organização continua a prestar assistência a 400 famílias que têm vivido em um complexo desde que suas casas foram incendiadas em setembro. Se a instabilidade continuar, o acesso das pessoas a cuidados de saúde no país, já testado, será perigosamente prejudicado.
A RCA tem sido cenário de décadas de conflito político-militar que alcançou status de emergência humanitária e de saúde crônica. Como golpe de estado ocorrido em março, a situação se deteriorou ainda mais. O Seleka, grupo rebelde que liderou o golpe, tornou-se o governo de fato do país. Os termos “forças do governo” utilizados neste texto referem-se ao Seleka, ex-Seleka ou atores armados afiliados ao grupo. Desde o início de setembro, conflitos violentos e mortais entre grupos armados e as forças do governo tem acontecido em diversas partes do país.
O conflito agrava as necessidades médicas, que já são enormes, mesmo nas áreas estáveis. O sistema de saúde sofre com a escassez de pessoal qualificado e há poucos estabelecimentos públicos fora da capital. A falta de medicamentos essenciais é frequente e muitas pessoas não têm recursos para pagar pelo tratamento de que precisam. Em resumo, uma grande proporção da população não tem acesso aos mais básicos cuidados de saúde e as taxas de mortalidade estão acima do patamar de emergência.
MSF atua na RCA desde 1996. Atualmente, a organização mantém seis programas regulares (em Paoua, Carnot, Zemio, Boguila, Batangafo e Kaco Ndélé) e iniciou recentemente atividades de emergência em Bossangoa, Bira, Bouca e Gadzi. No final de 2012, MSF contava com 1.300 profissionais no país.
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