sábado, 21 de abril de 2012

Maior parte das ocorrências atendidas pela Polícia Militar em São Paulo é para resolver briga entre marido e mulher


R7 teve acesso ao ranking de chamados da corporação, que recebe 43 mil ligações por dia

Um dos quesitos para trabalhar como atendente na central de atendimento da Polícia Militar em São Paulo é ter bom preparo psicológico para conseguir suportar os gritos, choros e histórias tristes sem se abalar. Mas há algum tempo este preparo esta sendo “canalizado” quase que totalmente para atendimentos sociais. Do total de chamados para o 190 que viram ocorrências policiais de fato, as brigas – principalmente envolvendo marido e mulher - são as que lideram as ligações no telefone.

Em março, o R7 conversou com o ex-comandante da Rota (Rondas Ostensivas Tobias Aguiar), tenente coronel Paulo Telhada, que já tinha falado sobre essa mudança no perfil de atendimento da corporação. Agora, a reportagem teve acesso ao ranking da PM. Em 2011, os desentendimentos registraram 275 mil ocorrências com envio de viatura, de acordo com o porta-voz do comando de policiamento da PM, capitão Cleodato Moisés do Nascimento. [Veja abaixo o ranking das chamadas]

— Os números de ligações para este tipo de chamada mais que dobram [podem passar das 500 mil]. São desentendimentos entre familiares, vizinhos, no trânsito. Mas o que lidera o grupo são as brigas entre marido e mulher. Às vezes, se a polícia não for até o local, podem acabar até em morte. Pode não ser nada grave, mas preocupa.

Para esse tipo de atendimento, Nascimento afirma que não só o atendente telefônico, mas também o policial que vai até à ocorrência se torna uma espécie de “mediador”, para facilitar um desfecho pacífico da situação. Segundo ele, 50% das chamadas “desinteligências” são resolvidas no próprio local da discussão, a outra metade acaba na delegacia.

— Claro que se há alguma agressão visível, as pessoas são levadas para o DP. Grande parte das discussões entre casais são por causa de homens que bebem e chegam tarde em casa. Mas já chegou caso de um marido pegar a mulher na cama com outro, e ela expulsar o homem de casa e não o amante [risos]. Na hora do atendimento tem todo um trabalho, mas depois vira comédia [interna da corporação].

Nascimento conta que para trabalhar no atendimento do 190, o policial militar precisa ter experiência de dois anos nas ruas e passar por testes psicológicos. Atualmente, o serviço recebe, em média, 43 mil ligações por dia. Nos fins de semana, esse número pode aumentar, segundo o capitão. No domingo 8 de abril, por exemplo, a corporação registrou 60 mil chamados. O capitão justifica esse aumento dizendo que dias de e sol e calor sempre “aumentam as encrencas”.

Em segundo lugar no ranking estão as chamadas para abordagem de pessoas suspeitas. No terceiro lugar está a perturbação de sossego, o famoso barulho que incomoda.

— Uma das maiores dificuldades da polícia nestes casos é que a vítima não quer aparecer. Seria muito melhor a vítima aparecer reclamando do barulho. Grande parte dos casos é de reclamações de barulhos em casas e apartamentos [Veja na arte abaixo quem mais reclama de barulho]. A média é de 350 ligações deste tipo por dia, mas pode subir nos fins de semana.

De acordo com Nascimento, só depois desses três tipos de ocorrências é que vem os chamados para furtos, roubos e outros. Nesse último item entram os homicídios, por exemplo.

Polícia é único canal
Segundo a PM, das cerca de 43 mil chamadas diárias, 65% são de pedidos de informações, 15% são trotes e 20% tornam-se efetivamente ocorrência policial (e abrangem o ranking citado acima). Para o especialista em segurança pública José Vicente da Silva, o fato de a Polícia Militar ser o único canal que funciona 24 horas e em que a pessoa é atendida, pode explicar essa mudança no perfil dos chamados.

— São Paulo é um dos poucos Estados do Brasil em que isso acontece. Além disso, o governo precisa orientar a população de que existem telefones específicos para cada caso. Se for um caso com animais, é outro telefone de serviço; acidente de trânsito tem os bombeiros. É preciso orientar também as pessoas procurarem delegacias.

Segundo o consultor, uma das formas de diminuir esse excedente de chamadas equivocadas para a polícia e melhorar o atendimento à população é adotar um sistema semelhante ao que funciona nos Estados Unidos. Lá, existe um sistema integrado entre bombeiros, polícia, assistência social.

— Lá, as ligações caem em um call center e, se a pessoa fala que aconteceu um acidente, por exemplo, imediatamente é transferida para a área específica. Se for um morador de rua passando mal, irá um atendimento social da prefeitura. Aqui, o ideal é procurar informações antes de ligar para o 190.

Já o professor em Segurança Pública da Fesp-SP (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo) discorda de que a função da Polícia Militar de São Paulo esteja sendo deturpada e afirma que o policial funciona como um especialista em combate aos conflitos sociais. Segundo ele, quando o governo é ausente em determinadas questões, é a polícia quem assume este papel.

— A primeira impressão que se tem é que polícia só tem função de combate à criminalidade, mas não é só isso. Eles têm a função de combater os conflitos sociais. Ajudar em uma briga de rua ou uma mulher gestante que passa mal é parte da função policial.

R7

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