segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Principal suspeita da FAB para acidente aéreo é de falha humana


Manobra do piloto após arremetida em Santos pode ter levado a perda de sustentação e queda

BRASÍLIA — Militares que acompanham as investigações das causas do acidente com o avião Cessna que caiu na última quarta-feira no litoral paulista, matando o candidato à Presidência da República do PSB, Eduardo Campos, e mais seis pessoas, acreditam que é forte a possibilidade de ter havido falha humana, depois do procedimento de arremetida. O entendimento é que o piloto, ao desistir do pouso, pode ter tentado se manter em condições visuais com a pista e fez uma curva mais acentuada do que deveria. Segundo militares, a manobra pode ter levado o avião a perder sustentação, e, mesmo com as turbinas ao máximo, não haveria como o piloto controlar a aeronave.

‘DESORIENTAÇÃO ESPACIAL’

Durante o procedimento, o piloto pode ter perdido sua total concentração na arremetida por instrumentos, desviando sua atenção para fora da aeronave. Com isso, pode ter sido levado à uma situação de “desorientação espacial”, o que explicaria a curva fora do previsto e a consequente perda de sustentação, resultando na forte colisão com o solo.

A avaliação tem como base as últimas informações da Aeronáutica de que o voo estava normal, da decolagem até o momento do ponto crítico, em que o piloto deveria visualizar a pista e realizar a aterrissagem. Segundo a Força Aérea Brasileira (FAB), o piloto falou ao sistema de rádio da base área de Santos que estava arremetendo por causa da visibilidade ruim e que iria aguardar a melhora do tempo para pousar.

A FAB já refez a trajetória do avião e tem condições de projetar o grau de angulação da curva realizada pelo piloto, pelo local da queda, considerando que a aeronave já estava sobre a pista, quando o piloto decidiu abortar o pouso. Além disso, a rota do avião é captada pelos radares.

O brigadeiro da reserva Jorge Kersul Filho, que chefiou o Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) até 2010 e comandou três grandes investigações (acidentes de Gol, TAM e Air France), disse que essa linha de investigação parece ser bem provável diante do que já foi divulgado. Mas, lembrou o brigadeiro, a equipe de investigadores terá que demonstrar essas possibilidades. Os peritos podem, também, concluir que faltam dados e informações suficientes para provar as causas do acidente e encerrar a investigação, apontando apenas as hipóteses:

— Essas linhas de raciocínio estão corretas. As investigações devem apontar para isso. Mas os peritos terão que demonstrar essas hipóteses, no final do processo. Podem também concluir que não é possível provar nada e encerrar a investigação, apontado apenas as hipóteses — explicou.

Sobre a dúvida de que o grau de inclinação da curva realizada pelo piloto teria levado à perda de sustentação da aeronave, Kersul respondeu:

— Com um grande ângulo de inclinação, o piloto fica sem condições de recuperar o avião da situação de queda. Ou seja, ele pode puxar o motor e não conseguir realinhar as asas do avião. O nome técnico do procedimento é recuperação de altitude anormal. Os pilotos fazem muitos treinamentos para isso. Acontece que a pessoa não vê o excesso de inclinação, falta horizonte, e, aí, só puxa o motor e não adianta mais nada.

Um experiente piloto da FAB explicou ao GLOBO que a tentativa de se manter em condições visuais, durante a arremetida é uma manobra arriscada, em condições meteorológicas adversas. De acordo com a carta de aproximação da base de Santos, o correto seria o piloto subir para 4 mil pés (o ponto de espera de melhora do tempo), em curva ascendente à esquerda. Nessa posição, ele poderia circular o aeroporto e, quando o tempo melhorasse, realizar o pouso novamente. A tentativa de se manter visual significa permanecer abaixo das nuvens, que já estavam baixas naquele dia, explicou essa fonte.

BRIGADEIRO: É DIFÍCIL HAVER UMA ÚNICA CAUSA

Segundo militares, em caso de perda de sustentação, o avião “ganha vida própria, e o piloto vira um mero passageiro”. Kersul destacou, no entanto, que é preciso aguardar a conclusão das investigações e lembrou que um acidente quase nunca tem uma única causa, mas acontece por uma conjunção da fatores.

Na tarde do dia 13 de agosto, dia do acidente, a Aeronáutica divulgou um Notam (um comunicado para pilotos), a fim de informar que estava suspendendo temporariamente o procedimento de descida por instrumentos na pista para verificar se o instrumento de auxílio à navegação aérea estava funcionando sem problemas. A medida é uma rotina em casos de acidente, e, durante o período de restrição, um avião do Grupo Especial de Inspeção em Voo (GEIV) faz procedimentos para testar o equipamento. Depois dos trabalhos e sem encontrar falhas, o Notam foi cancelado, e o pouso com instrumentos voltou a ser liberado.

Segundo relatório da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), em 2003, um jato particular Mitsubishi MU-300 enfrentou problemas semelhantes ao do Cessna na pista da base aérea de Santos. O avião tinha partido do Rio e, por conta das condições meteorológicas, teve que arremeter na primeira tentativa de pouso. Na segunda, o piloto conseguiu pousar, mas não teve como parar o avião, que caiu na água. Não houve feridos.


O Globo

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