Uma mulher transforma a doença do filho em esperança para muitas famílias de vários cantos do Brasil. Assim nasceu a Associação de Apoio à Criança Cardiopata Pequenos Corações
Marcia Adriana Rebordões estava grávida de cinco meses do segundo filho, Thiago, quando os médicos disseram que ele não sobreviveria mais do que três dias após o parto. Veio do ecocardiograma fetal o diagnóstico: Síndrome de Hipoplasia do Coração Esquerdo (SHCE), uma grave má formação que causa a morte dos bebês ainda no primeiro mês de vida em 95% dos casos. “Era tudo muito desanimador. Procurei informações na internet e não encontrei nada”, lembra Marcia Adriana, 38 anos. Foi então que, junto com o marido, Paulo, saiu de Bauru, interior de São Paulo, rumo à capital para consultar médicos especializados.
Depois de muita procura, o casal encontrou uma equipe que tratava de cardiopatia congênita e deu suporte à gravidez de Marcia Adriana. Graças a esse apoio, Thiago nasceu e viveu três anos e meio. Chegou a ficar seis meses no hospital e passou por três cirurgias. “Apesar de tudo, ele sorria o tempo todo. Era uma criança feliz.” Além dos pais, mais uma pessoa acompanhava tudo isso muito de perto: a primeira filha do casal, Vitória, que tinha 6 anos quando Thiago nasceu. “Nos afastamos para cuidar dele, e depois tive que me reaproximar, com acompanhamento psicológico. Hoje ela sabe que tem o espaço dela em casa, assim como ele.” A morte do menino aconteceu há um ano, mas esse não é o único lado da história: em 2007, a advogada criou um site – o http://www.pequenoscoracoes.com.br/ – e gerou esperança em mais de 350 outras mães com a Associação de Apoio à Criança Cardiopata Pequenos Corações.
Com as raras informações sobre a doença, Marcia Adriana em pouco tempo atraiu mensagens de diversas gestantes na mesma situação, e acabou estendendo o repertório para outras cardiopatias. Ela deixou o emprego em uma área de finanças para se dedicar à associação ao lado das amigas internautas Larissa Mendes, que mora na Itália, Fabíola Bilro, de Recife, e Patrícia Drummond, de São Paulo, também mães de cardiopatas.
Outra prioridade da ONG são os projetos de conscientização da sociedade e do governo, como a inclusão do ecocardiograma fetal nos exames de rotina de qualquer pré-natal.
Como Marcia Adriana, mulheres de outras cidades e estados buscam tratamento para os filhos em São Paulo, e muitas não têm condições de pagar estadia e alimentação. Para acolhê-las, a associação decidiu alugar, no começo deste ano, dois quartos de hotel na região central da capital, que abrigam de cinco a dez pessoas. Os familiares recebem um kit de higiene pessoal, além de café da manhã e jantar. Foram 150 atendimentos nos primeiros seis meses. Quando não há mais espaço, as pessoas são encaminhadas à Associação de Assistência à Criança e ao Adolescente Cardíacos e aos Transplantados do Coração, outra ONG que funciona na capital.
A estrutura da organização ainda é pequena. Há uma secretária, uma psicóloga e uma professora de artesanato. “Diante de tudo, as mães se sentem impotentes e desqualificadas. As aulas de artes servem para distrair um pouco”, diz Marcia Adriana. Voluntários dão apoio emocional às famílias e todo o tipo de informação necessária, desde como encaminhar a criança para tratamento e cirurgia até quais são os benefícios oferecidos pelo governo, além de prestar assessoria jurídica.
A associação vem se estruturando cada vez mais. Recentemente, foi registrada em cartório e, com o CNPJ, poderá ter parceiros empresariais e expandir suas ações. Hoje, a Pequenos Corações se mantém com contribuições de pequenos mantenedores (familiares e médicos) e da venda do Calendário Pequenos Corações com fotos de crianças cardiopatas. “Nosso sonho é alugar um imóvel e ter uma sede oficial, onde abrigaríamos ainda mais famílias.” Muitos se surpreendem com a opção de Marcia Adriana. “Preferi, em vez de lamentar, compartilhar com outras mães tudo que eu aprendi.” Paralelo à ONG, a advogada tentava ser mãe novamente e, enquanto fazíamos esta reportagem, ela teve a confirmação que tanto queria: está grávida de trigêmeos.
Nota da redação: Após o encerramento desta edição, infelizmente, Marcia Adriana Rebordões perdeu os bebês.
Crescer
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