Tive uma boa conversa sobre mesada com a Cássia D'Aquino, que se especializou em educação financeira infantil. Muitos leitores tinham as mesmas dúvidas, inclusive parecidas com as minhas (e ressalto a participação da fofíssima Marina Mainhard, de 11 anos, que mandou sua perguntinha). Acho que consegui juntar todos os temas nas perguntas que levei à Cássia.
Na primeira pergunta, a Cássia faz uma diferenciação importante entre mesada e semanada. Ao longo da entrevista, passamos a usar o termo mesada, mais generalizado, mas ele se refere a ambos os casos.
Vejam o que a educadora pensa sobre o assunto. Tomara que ajude os pais a terem mais elementos para tomar suas decisões.
A partir de que idade se deve dar mesada? E com que periodicidade?
A mesada (nota minha: mais no sentido de mês mesmo) é mais eficaz depois dos 11 anos de idade. Até os 11 anos, a criança ainda não tem o pensamento abstrato perfeitamento desenvolvido. Aos oito ou nove anos, compreende a expressão "mês", mas não consegue projetar, do ponto de vista da abstração, a noção desse tempo. Portanto, antes dos 11, recomendo que se dê uma semanada.
Por volta dos seis ou sete anos, a criança entra na fase em que se oganiza mais. É um bom momento para iniciar a semanada com intenção mais didática. Mas pode começar até antes, por volta dos três anos e pouco, com caráter completamente diferente. Neste caso, é uma quantia irrisória: uma moedinha, quase nada toda semana, R$ 1 a R$ 2, para que a criança vá aprendendo a se organizar no tempo.
É fundamental que os pais façam um calendário grandão para a criança ir marcando quando receberá aquele dinheiro. Com tão pouco dinheiro, não é a intenção fazer um orçamento ou uma poupança. É apenas para ensinar que há o tempo de espera, e nunca mais que uma semana. Sábado é um bom dia para marcar isso, porque em geral a família está junta. Os pais podem ir até a banca comprar o chocolate que a criança quer, por exemplo.
O processo deve ser sempre acompanhado da explicação, breve, de que aquilo é para aprender a lidar com o dinheiro. A mesada é somente um instrumento para aprender alguma coisa.
Existe um valor ideal para cada idade?
Em princípio, quanto mais maduro o filho, maior a possibilidade de receber quantias maiores. Isso nem sempre coincide com a idade. Mas, para crianças até 11 anos, fui me dando conta de uma indicação de faixa de distribuição que funciona bem: R$ 1 por idade a cada semana. Uma criança de oito anos, portanto, teria de receber R$ 8 por semana. Depois dos 11 anos, o cálculo vai sofrendo reajustes.
A mesada deve ter duas linhas de utilização. Uma parte é para compras pequenas, e faz parte a criança se arrepender de algumas decisões. A outra parte é para poupança, mas sempre de curto prazo, até umas duas semanas. É o dinheirinho na gaveta, no jarro, para comprar algo mais caro que se queira.
Depois dos 11 anos, o melhor é o equivalente a R$ 2 por idade por semana. Depois dos 14, o valor subiria para R$ 3. Recomendo que os pais não se distanciem muito desse cálculo, para o filho não perder muito a noção do dinheiro.
Então não deve haver relação com o poder aquisitivo dos pais...
O valor da mesada não tem muito a ver com quanto o adulto ganha, mas com a forma como a criança se organiza com o dinheiro. O filho não deve ter uma quantia tão grande ou tão pequena que o impeça de se organizar bem. E os pais devem dar alguma caderneta para os filhos anotarem os gastos e se organizarem.
Como fazer para a mesada não se tornar uma angústia para os filhos?
Não faz sentido, por exemplo, punir o desempenho escolar com a mesada. Os pais devem sacar notas miúdas e não esquecer a data do pagamento. Também devem deixar os filhos consumirem algumas coisas que querem. Se fizerem isso, não tem por que virar uma angústia.
Se os pais não se sentirem confortáveis com o instrumento da mesada, não devem dar. Usem outra forma de educação financeira, e há várias (oba, já é tema para uma nova conversa com a Cássia e outros especialistas...).
Os pais devem combinar com os filhos algum mecanismo de reajuste da mesada?
Pais não devem criar para si um compromisso desse tipo. Se por algum motivo não conseguirem honrar, será um problema dobrado: prometeram e não cumpriram. Salários são problemas dos adultos.
Em um caso de desemprego, é importante que pai e mãe, casados ou separados, acertem-se antes sobre suas finanças e decidam que cortes podem ser feitos. Os filhos têm de ver que os pais têm controle da situação, e os pais devem dizer a eles que atitudes estão sendo tomadas. Já se há um aperto na família por causa de uma obra, os pais devem explicitar que o novo custo trará um ganho para todos. Em geral, os filhos respondem bem a esses apelos dos pais para segurar o dinheiro.
Para os adolescentes, o mais indicado é ligar o reajuste mais a argumentações dos filhos. Começou a namorar e precisa de vez em quando dar presentes? Vai mais ao cinema? Por volta dos 11 ou 12 anos, os filhos começam a sair e vão querendo aumento. A adolescência é a hora de aproveitar a argumentação, perguntar por que o filho quer mais. Isso faz com que ele exercite a capacidade de negociar.
Que gastos a mesada deve cobrir?
Quando a criança é muito pequena, gastos miudinho. Figurinhas, um lanche na escola... Do contrário, a criança pode ser solapada por uma série de obrigações de que não dará conta. Conforme for amadurecendo, as atribuições irão crescendo.
Os pais devem ser capazes de perceber se a criança está dando conta das obrigações. A mesada não pode ser fonte de conflito. É preciso ver também o grau de maturidade de cada um, que não necessariamente acompanha a idade.
Se a criança fica sem dinheiro, a mesada deve ser rígida ou flexível?
Na semanada, a criança pode se recompor. Se foi à falência na quinta-feira, na segunda-feira já tem chance de recuperar a situação. A mesada deve ensinar, e falências ensinam um bocado.
Mas os pais têm de ficar de olho: se a falta de dinheiro acontece repetidamente, isso pode ser um sinal. A criança pode estar recebendo dinheiro demais e perdeu a mão. Ou até pode estar se envolvendo com drogas e álcool. Nesses casos, a mesada funciona também como um aviso.
Os pais devem cobrar satisfações ou outra contrapartida para o uso da mesada?
Não se deve exigir um balanço de cada centavo que o filho gastou. Com isso, só se consegue uma criança sob controle. E quebrar a cara, eventualmente, é algo até bem-vindo. Os pais têm de supervisionar, mas sem estar grudados.
E não acho que os pais devem atrelar a mesada a alguma tarefa. Todo mundo vai aprender em algum momento que a vida não é fácil. Exigir tarefas como contrapartida à mesada é criar alguém que vai fazer as coisas estimulado pelo dinheiro. A mesada não é um salário. Se a criança tem a missão de arrumar a cama, deve entender que vai fazê-lo para ajudar a família ou, em último caso, porque os pais estão mandando.
Blog Mamãe, eu quero
Na primeira pergunta, a Cássia faz uma diferenciação importante entre mesada e semanada. Ao longo da entrevista, passamos a usar o termo mesada, mais generalizado, mas ele se refere a ambos os casos.
Vejam o que a educadora pensa sobre o assunto. Tomara que ajude os pais a terem mais elementos para tomar suas decisões.
A partir de que idade se deve dar mesada? E com que periodicidade?
A mesada (nota minha: mais no sentido de mês mesmo) é mais eficaz depois dos 11 anos de idade. Até os 11 anos, a criança ainda não tem o pensamento abstrato perfeitamento desenvolvido. Aos oito ou nove anos, compreende a expressão "mês", mas não consegue projetar, do ponto de vista da abstração, a noção desse tempo. Portanto, antes dos 11, recomendo que se dê uma semanada.
Por volta dos seis ou sete anos, a criança entra na fase em que se oganiza mais. É um bom momento para iniciar a semanada com intenção mais didática. Mas pode começar até antes, por volta dos três anos e pouco, com caráter completamente diferente. Neste caso, é uma quantia irrisória: uma moedinha, quase nada toda semana, R$ 1 a R$ 2, para que a criança vá aprendendo a se organizar no tempo.
É fundamental que os pais façam um calendário grandão para a criança ir marcando quando receberá aquele dinheiro. Com tão pouco dinheiro, não é a intenção fazer um orçamento ou uma poupança. É apenas para ensinar que há o tempo de espera, e nunca mais que uma semana. Sábado é um bom dia para marcar isso, porque em geral a família está junta. Os pais podem ir até a banca comprar o chocolate que a criança quer, por exemplo.
O processo deve ser sempre acompanhado da explicação, breve, de que aquilo é para aprender a lidar com o dinheiro. A mesada é somente um instrumento para aprender alguma coisa.
Existe um valor ideal para cada idade?
Em princípio, quanto mais maduro o filho, maior a possibilidade de receber quantias maiores. Isso nem sempre coincide com a idade. Mas, para crianças até 11 anos, fui me dando conta de uma indicação de faixa de distribuição que funciona bem: R$ 1 por idade a cada semana. Uma criança de oito anos, portanto, teria de receber R$ 8 por semana. Depois dos 11 anos, o cálculo vai sofrendo reajustes.
A mesada deve ter duas linhas de utilização. Uma parte é para compras pequenas, e faz parte a criança se arrepender de algumas decisões. A outra parte é para poupança, mas sempre de curto prazo, até umas duas semanas. É o dinheirinho na gaveta, no jarro, para comprar algo mais caro que se queira.
Depois dos 11 anos, o melhor é o equivalente a R$ 2 por idade por semana. Depois dos 14, o valor subiria para R$ 3. Recomendo que os pais não se distanciem muito desse cálculo, para o filho não perder muito a noção do dinheiro.
Então não deve haver relação com o poder aquisitivo dos pais...
O valor da mesada não tem muito a ver com quanto o adulto ganha, mas com a forma como a criança se organiza com o dinheiro. O filho não deve ter uma quantia tão grande ou tão pequena que o impeça de se organizar bem. E os pais devem dar alguma caderneta para os filhos anotarem os gastos e se organizarem.
Como fazer para a mesada não se tornar uma angústia para os filhos?
Não faz sentido, por exemplo, punir o desempenho escolar com a mesada. Os pais devem sacar notas miúdas e não esquecer a data do pagamento. Também devem deixar os filhos consumirem algumas coisas que querem. Se fizerem isso, não tem por que virar uma angústia.
Se os pais não se sentirem confortáveis com o instrumento da mesada, não devem dar. Usem outra forma de educação financeira, e há várias (oba, já é tema para uma nova conversa com a Cássia e outros especialistas...).
Os pais devem combinar com os filhos algum mecanismo de reajuste da mesada?
Pais não devem criar para si um compromisso desse tipo. Se por algum motivo não conseguirem honrar, será um problema dobrado: prometeram e não cumpriram. Salários são problemas dos adultos.
Em um caso de desemprego, é importante que pai e mãe, casados ou separados, acertem-se antes sobre suas finanças e decidam que cortes podem ser feitos. Os filhos têm de ver que os pais têm controle da situação, e os pais devem dizer a eles que atitudes estão sendo tomadas. Já se há um aperto na família por causa de uma obra, os pais devem explicitar que o novo custo trará um ganho para todos. Em geral, os filhos respondem bem a esses apelos dos pais para segurar o dinheiro.
Para os adolescentes, o mais indicado é ligar o reajuste mais a argumentações dos filhos. Começou a namorar e precisa de vez em quando dar presentes? Vai mais ao cinema? Por volta dos 11 ou 12 anos, os filhos começam a sair e vão querendo aumento. A adolescência é a hora de aproveitar a argumentação, perguntar por que o filho quer mais. Isso faz com que ele exercite a capacidade de negociar.
Que gastos a mesada deve cobrir?
Quando a criança é muito pequena, gastos miudinho. Figurinhas, um lanche na escola... Do contrário, a criança pode ser solapada por uma série de obrigações de que não dará conta. Conforme for amadurecendo, as atribuições irão crescendo.
Os pais devem ser capazes de perceber se a criança está dando conta das obrigações. A mesada não pode ser fonte de conflito. É preciso ver também o grau de maturidade de cada um, que não necessariamente acompanha a idade.
Se a criança fica sem dinheiro, a mesada deve ser rígida ou flexível?
Na semanada, a criança pode se recompor. Se foi à falência na quinta-feira, na segunda-feira já tem chance de recuperar a situação. A mesada deve ensinar, e falências ensinam um bocado.
Mas os pais têm de ficar de olho: se a falta de dinheiro acontece repetidamente, isso pode ser um sinal. A criança pode estar recebendo dinheiro demais e perdeu a mão. Ou até pode estar se envolvendo com drogas e álcool. Nesses casos, a mesada funciona também como um aviso.
Os pais devem cobrar satisfações ou outra contrapartida para o uso da mesada?
Não se deve exigir um balanço de cada centavo que o filho gastou. Com isso, só se consegue uma criança sob controle. E quebrar a cara, eventualmente, é algo até bem-vindo. Os pais têm de supervisionar, mas sem estar grudados.
E não acho que os pais devem atrelar a mesada a alguma tarefa. Todo mundo vai aprender em algum momento que a vida não é fácil. Exigir tarefas como contrapartida à mesada é criar alguém que vai fazer as coisas estimulado pelo dinheiro. A mesada não é um salário. Se a criança tem a missão de arrumar a cama, deve entender que vai fazê-lo para ajudar a família ou, em último caso, porque os pais estão mandando.
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