O mais famoso geneticista brasileiro tentou que um casal não descobrisse que o filho não era seu provocando um aborto
Há anos que tentavam ter filhos. Nada resultava. Suspeitavam que a causa fosse a infertilidade do homem, mas, arrastados pela publicidade de uma clínica de reprodução assistida que tinha a mais elevada taxa de sucesso da América Latina, marido e mulher resolveram, em 1993, pedir a opinião do geneticista Roger Abdelmassih. O especialista brasileiro disse-lhes que os exames comprovavam que o casal tinha condições para gerar um filho, mas aconselhou-lhes a fertilização in vitro, um procedimento que seria mais rápido e eficaz. Com a garantia de que seriam usados os seus óvulos e espermatozóides e inebriados com a promessa de uma gravidez rápida, mulher e homem concordaram, e os embriões foram implantados. A mulher engravidou. Finalmente, a gravidez há muito desejada tinha-se concretizado. Estavam felizes.
Mas o marido, que há muito suspeitava da sua infertilidade, continuava com a cabeça cheia de dúvidas. Se lhe tinham dito que era infértil, como podiam os seus espermatozóides gerar um filho? Durante uma das consultas, confrontou Abdelmassih com as suspeitas e ameaçou que faria um teste de ADN depois de o bebé nascer. O médico expulsou-o do consultório aos gritos. Na consulta seguinte, Abdelmassih deu à mulher grávida dois comprimidos: um devia ser tomado naquele momento, o outro passado três horas. Não chegou a tomar o segundo. Foi parar às urgências do hospital com dores abdominais que indicavam um início de aborto. O Citotec, medicamento receitado pelo médico, era usado no tratamento da úlcera e foi retirado do mercado brasileiro em 1998, pelos seus efeitos secundários abortivos.
No hospital conseguiram impedir o aborto e a gravidez prosseguiu. Meses depois, a mulher teve gémeos. Quando deixou de amamentar, toda a família fez testes de ADN. Os resultados desmontaram a grande mentira da famosa clínica de Abdelmassih: ela era a mãe biológica, mas ele não era o pai biológico daquelas crianças.
O casal quis mover um processo contra a clínica, mas o médico propôs-lhes um acordo: 600 mil reais (260 mil euros) pelo seu silêncio. Em troca, assinaram um termo, com uma data anterior, a autorizar o uso de esperma de terceiros. Anos depois, o casal separou-se, mas o pai criou as crianças como se fossem suas e os gémeos, hoje com 17 anos, nunca souberam que não eram filhos biológicos do seu pai.
A clínica do "horror" Esta foi a primeira história a levantar suspeitas sobre os métodos utilizados nos processos de reprodução da Clínica Abdelmassih, a clínica de São Paulo que se orgulhava de ter atendido 20 mil pessoas, gerado 8 mil vidas e de ter uma taxa de sucesso de fertilização de 47,1%, contra os 31,1% da Rede Latino-Americana de Reprodução Assistida.
Uma investigação do Ministério Público e da polícia de São Paulo, descoberta e publicada pela revista "Época", revela que pelo menos mais dois casais que foram assistidos por Abdelmassih descobriram, depois do nascimento do filho, que o seu ADN só era compatível com um dos dois. Os depoimentos de um casal de São Paulo, outro do Rio de Janeiro, e outro de Espírito Santo foram comprovados com exames laboratoriais. O Ministério Público está convencido de que alguns dos 8 mil bebés gerados na clínica do médico número um na reprodução assistida no Brasil não são filhos de quem imaginam ser.
Os casais tinham um grande desejo de ter filhos e o doutor Abdelmassih fazia--lhes a vontade, mas, ao que tudo indica, esconderia os seus métodos pouco éticos. Se o material genético do casal não era bom, se a probabilidade de aqueles óvulos ou de aqueles espermatozóides gerarem um filho era diminuta, em segredo o médico implantava embriões de estranhos, mas com mais possibilidades de sucesso, no útero das futuras mães.
Além de ter acesso à investigação, a "Época" conseguiu obter mais pormenores sobre a alegada manipulação de embriões através de um engenheiro químico, ex-colaborador do médico. Paulo Henrique Ferraz Bastos, que foi sócio de dois geneticistas russos contratados por Abdelmassih, não duvida que mais exames de ADN a ex-pacientes irão revelar que aquelas práticas não eram isoladas e que eram mesmo o modus operandi da clínica. O engenheiro clínico gravou clandestinamente 70 horas de conversa que descrevem alguns procedimentos ilegais usados na clínica de reprodução. A cientista russa chegou a dizer que "não dava para provar que eles faziam uso indevido de óvulos" - "Porque óvulo não fala."
Há anos que tentavam ter filhos. Nada resultava. Suspeitavam que a causa fosse a infertilidade do homem, mas, arrastados pela publicidade de uma clínica de reprodução assistida que tinha a mais elevada taxa de sucesso da América Latina, marido e mulher resolveram, em 1993, pedir a opinião do geneticista Roger Abdelmassih. O especialista brasileiro disse-lhes que os exames comprovavam que o casal tinha condições para gerar um filho, mas aconselhou-lhes a fertilização in vitro, um procedimento que seria mais rápido e eficaz. Com a garantia de que seriam usados os seus óvulos e espermatozóides e inebriados com a promessa de uma gravidez rápida, mulher e homem concordaram, e os embriões foram implantados. A mulher engravidou. Finalmente, a gravidez há muito desejada tinha-se concretizado. Estavam felizes.
Mas o marido, que há muito suspeitava da sua infertilidade, continuava com a cabeça cheia de dúvidas. Se lhe tinham dito que era infértil, como podiam os seus espermatozóides gerar um filho? Durante uma das consultas, confrontou Abdelmassih com as suspeitas e ameaçou que faria um teste de ADN depois de o bebé nascer. O médico expulsou-o do consultório aos gritos. Na consulta seguinte, Abdelmassih deu à mulher grávida dois comprimidos: um devia ser tomado naquele momento, o outro passado três horas. Não chegou a tomar o segundo. Foi parar às urgências do hospital com dores abdominais que indicavam um início de aborto. O Citotec, medicamento receitado pelo médico, era usado no tratamento da úlcera e foi retirado do mercado brasileiro em 1998, pelos seus efeitos secundários abortivos.
No hospital conseguiram impedir o aborto e a gravidez prosseguiu. Meses depois, a mulher teve gémeos. Quando deixou de amamentar, toda a família fez testes de ADN. Os resultados desmontaram a grande mentira da famosa clínica de Abdelmassih: ela era a mãe biológica, mas ele não era o pai biológico daquelas crianças.
O casal quis mover um processo contra a clínica, mas o médico propôs-lhes um acordo: 600 mil reais (260 mil euros) pelo seu silêncio. Em troca, assinaram um termo, com uma data anterior, a autorizar o uso de esperma de terceiros. Anos depois, o casal separou-se, mas o pai criou as crianças como se fossem suas e os gémeos, hoje com 17 anos, nunca souberam que não eram filhos biológicos do seu pai.
A clínica do "horror" Esta foi a primeira história a levantar suspeitas sobre os métodos utilizados nos processos de reprodução da Clínica Abdelmassih, a clínica de São Paulo que se orgulhava de ter atendido 20 mil pessoas, gerado 8 mil vidas e de ter uma taxa de sucesso de fertilização de 47,1%, contra os 31,1% da Rede Latino-Americana de Reprodução Assistida.
Uma investigação do Ministério Público e da polícia de São Paulo, descoberta e publicada pela revista "Época", revela que pelo menos mais dois casais que foram assistidos por Abdelmassih descobriram, depois do nascimento do filho, que o seu ADN só era compatível com um dos dois. Os depoimentos de um casal de São Paulo, outro do Rio de Janeiro, e outro de Espírito Santo foram comprovados com exames laboratoriais. O Ministério Público está convencido de que alguns dos 8 mil bebés gerados na clínica do médico número um na reprodução assistida no Brasil não são filhos de quem imaginam ser.
Os casais tinham um grande desejo de ter filhos e o doutor Abdelmassih fazia--lhes a vontade, mas, ao que tudo indica, esconderia os seus métodos pouco éticos. Se o material genético do casal não era bom, se a probabilidade de aqueles óvulos ou de aqueles espermatozóides gerarem um filho era diminuta, em segredo o médico implantava embriões de estranhos, mas com mais possibilidades de sucesso, no útero das futuras mães.
Além de ter acesso à investigação, a "Época" conseguiu obter mais pormenores sobre a alegada manipulação de embriões através de um engenheiro químico, ex-colaborador do médico. Paulo Henrique Ferraz Bastos, que foi sócio de dois geneticistas russos contratados por Abdelmassih, não duvida que mais exames de ADN a ex-pacientes irão revelar que aquelas práticas não eram isoladas e que eram mesmo o modus operandi da clínica. O engenheiro clínico gravou clandestinamente 70 horas de conversa que descrevem alguns procedimentos ilegais usados na clínica de reprodução. A cientista russa chegou a dizer que "não dava para provar que eles faziam uso indevido de óvulos" - "Porque óvulo não fala."
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