quinta-feira, 10 de junho de 2010

Trabalho infantil ainda atinge 270 mil crianças e adolescentes em Pernambuco



Recife abriga um jovem trabalhador que sonha em ser bombeiro. O menino de 12 anos, residente no Córrego da Areia, no bairro da Macaxeira, Zona Norte da capital pernambucana, é o “cara do milho” há quase três anos. Ajudante número 1 da avó, vendedora de tapiocas e quitutes regionais nas ruas do bairro dos Aflitos, o garoto tem um rotina de responsabilidades diárias. Quando a escola não está em greve, o trabalho começa ao meio-dia. Até as 19h30, hora do fim do "expediente", a brasa que cozinha o milho não pode ficar sem assistência, o lixo não deve acumular e o cliente apressado e mal educado tem que ser atendido prontamente, com delicadeza. O menino não percebe que trabalha, nem que fica tantas horas em pé. A sobrecarga de serviços acaba sendo ‘sutil’. Ele nasce dentro dessa rotina que já faz parte da cultura da família, e a sociedade não reprova a “ajuda” que o garoto oferece à avó trabalhadora.
No entanto, de acordo com estudo publicado pelo Fórum Estadual de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil em Pernambuco, esse jovem faz parte, sim, do total de 270 mil crianças e adolescentes do Estado que são explorados no trabalho. “É bastante alta a intensidade desse tipo de ocorrência. Meninos e meninas que trabalham no comércio ambulante informal são vítimas, precocemente, de exploração. Esse tipo de situação, mesmo banalizada, é muito grave e está no mesmo patamar do trabalho do aviãozinho, aquele garoto que realiza o comércio ilícito de drogas e o transporte de armas”, afirma Paulo Lago, do Centro Dom Helder Câmara de Estudos e Ação Social (Cendhec), entidade fortemente envolvida na construção de um Plano Estadual de Combate ao Trabalho Infantil, proposta presente no Pacto da Vida, mas que tem previsão de aprovação apenas em 2011.
O Cendhec, juntamente com o Ministério Público do Trabalho do Estado, através da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE), encabeça a movimentação, em Pernambuco, das atividades de esclarecimentos à população, promovidas em função do Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil, lembrado neste sábado (12) e comemorado desde 2002 pela Organização Internacional do Trabalho.

As atividades que duraram toda uma semana envolveram panfletagens, palestras, apresentações culturais e um jogo de futebol entre crianças e artistas nesta quarta (9), no Quartel do Derby, Zona Central da capital. As ações, neste ano de Copa do Mundo, acompanham o título do mote da campanha: “Cartão Vermelho ao trabalho Infantil”, promovida pelo craque da seleção Robinho.
Esses esclarecimentos mais corpo a corpo junto à população realmente precisa ser feito, principalmente nos estados nordestinos que aceitam com certa naturalidade o trabalho infantil de embaladores em supermercados, de gazeteiros juvenis nas ruas, de crianças que trabalham em feiras livres e meninas que se escravizam em´casas de família´. É que, do total de 4,4 milhões de crianças e adolescentes brasileiros de 5 a 17 anos que trabalham no País, quase 2 milhões estão no Nordeste, segundo o dado mais recente de 2008 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), calculada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Os números assustam, ainda são altos, mas o panorama estatístico em Pernambuco, que ainda possui a maior concentração de trabalho infantil vinculado às atividades de agricultura familiar na zona rural, acompanha a queda percentual de crianças e adolescentes que trabalham no Brasil.
De acordo com o coordenador de projetos do Programa Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil, da Organização Internacional do Trabalho da ONU (Ipec-OIT), Renato Mendes, em entrevista por telefone ao JC Online, “hoje podemos dizer que apenas 0,9% das crianças menores de dez anos de idade trabalham. O Brasil praticamente extinguiu a exploração nessa faixa de idade. No entanto a situação ainda não é confortável no País".
"Mesmo com o avanço da queda nos casos em cerca de 50% nos últimos 18 anos, o ritmo de diminuição de práticas de exploração de mão de obra infantil no Brasil de 2003 a 2008 não acompanhou o ritmo acelerado de queda de 1992 a 2003. O País chegou ao núcleo mais duro; agora é mais difícil a ação”.
O extrato mais duro a qual se refere o representante máximo do tema na OIT Brasil é a exploração invisível, de difícil combate, que é aquela onde as crianças que possuem de dez a quinze anos de idade são forçadas, por necessidade ou imposição, a trabalhar no tráfico de drogas, na exploração sexual, na agricultura familiar e no trabalho doméstico.
Mas os números positivos do Brasil, elogiados e incluídos no relatório fruto de discussões da 2ª Conferência Global sobre Trabalho Infantil, realizada em maio, na Holanda, agora servirão de referência para ratificação de medidas sugeridas para 2016em um encontro que vai ser realizado nesta sexta (11), na Suíça.
Entre as inúmeras citações positivas sobre a ação do Brasil no combate à exploração do trabalho infantil, há destaque para a ratificação de protocolos da OIT; o pedido de ajuda e orientação requerido pelo Governo a essa entidade vinculada à Organização das Nações Unidas (ONU); a mobilização nacional da sociedade e da mídia para atacar e discutir o tema; o trabalho de conscientização de agricultores familiares realizado pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag); os programas sociais de assistência social do Governo Federal; a implantação de ações específicas de combate à exploração, como o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), agora focado em atividades de arte-educação e cidadania; e o próprio desenvolvimento econômico do país, que propiciou uma maior redistribuição de renda para as camadas sociais mais vulneráveis.

JCOnline

Como denunciar a exploração no trabalho de crianças e adolescentes

- Na dúvida, ligue para o Disque 100 (serviço gratuito e nacional):
Criado pela Secretaria de Direitos Humanos para receber denúncias de exploração sexual contra crianças e adolescentes, o Disque 100 acaba recebendo também denúncias de outros tipos de violência e até de crianças desaparecidas. As denúncias são encaminhadas aos órgãos competentes em até 24 horas. O serviço funciona todos os dias, das 8h às 22h.

- Denúncia via Ministério Público do Trabalho de Pernambuco:
(81) 2101.3200 ou codin@prt6.gov.br
Criado pelo MPTPE, órgão vinculado à Procuradoria Regional do Trabalho da 6ª Região, o serviço recebe denúncias de exploração sexual e de tráfico de crianças e adolescentes.

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