segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Desconfiado de técnicos, tráfico proibiu telefone por oito meses em favela


Criminosos pensam que funcionários podem ser policiais disfarçados

Durante oito meses, entre o ano passado e o início de 2010, a população ficou sem telefone no morro do Chapadão, em Costa Barros, na zona norte do Rio de Janeiro, porque os traficantes não permitiam que empresas responsáveis pelo serviço entrassem na comunidade. O relato é de uma moradora, que não quis se identificar, com medo de possíveis represálias.
Relatos de outras testemunhas ao R7 revelam que o tráfico também dificulta o funcionamento dos serviços públicos na comunidade. As empresas também são forçadas a se submeterem às regras estabelecidas pelos bandidos.
- Durante muito tempo, houve restrição para algumas equipes, porque usavam uniformes semelhantes aos de policiais militares. Houve companheiros que apanharam, por exemplo, na favela do Jacarezinho, por serem confundidos com policiais - afirmou um representante do Sintel (Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Telecomunicações)
Funcionários de empresas de energia encontram dificuldades. Por muitas vezes, são impedidos de remover gatos de energia em comunidades.
- Equipes já foram sequestradas pelo poder paralelo. Já houve ameaças de morte. Armas foram apontadas para a cabeça. Os traficantes acham que os carros das empresas podem ter policiais disfarçados. Um funcionário precisou ser afastado por questões psicológicas após ser ameaçado - disse um membro do Sindicato dos Eletricitários.
Segundo ele, para garantir a segurança dos técnicos, as empresas não costumam realizar atendimentos nas comunidades após as 18h.

Gatonet do tráfico impedia empresas legalizadas de vender serviços no Alemão
Até mesmo empresas que oferecem entretenimento aos moradores sofrem com a pressão do tráfico . Como os criminosos exploram clandestinamente a comercialização de sinais de TV a cabo, as empresas que prestam o serviço de forma legal não podiam entrar. Com a ocupação no Complexo do Alemão, as prestadoras já começaram a ganhar espaço novamente.
Já as lojas de eletrodomésticos que fazem entrega nas favelas correm o risco de ter cargas saqueadas, ou, então, o caminhão roubado para ser usado como barricada para o tráfico, como ocorreu recentemente na favela Vila Cruzeiro.
A dificuldade de entrar em favelas também atinge os oficiais de justiça, que precisam cumprir mandados em comunidades carentes. Para realizar seu trabalho, muitas vezes, os profissionais necessitam ser escoltados por policiais.
- Já fiquei quatro horas em cárcere privado na Mangueira. Somos sempre revistados. Não podemos mentir. Querem saber se estamos armados. Hoje em dia, o mesmo oficial costuma ir a uma mesma favela porque já é conhecido - disse um representante da associação da categoria.
Em 2009, um oficial de Justiça foi assassinado por um traficante na comunidade Vila São Luiz, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Ele foi morto com 11 tiros após ser confundido com um policial.
Quem mais sofre, no entanto, são motoristas do transporte alternativo (Kombis) que precisam pagar "pedágio" aos bandidos para circular.
- Toda semana tenho que pagar R$ 200 para o tráfico na Ilha do Governador. Um fiscal vai para recolher o dinheiro e entregar para quem "é de direito". Ou paga ou se afasta - afirmou um topiqueiro.
Mario Hugo Monken


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