Levantamento do Tribunal de Contas do Estado (TCE) revela desempenho gaúcho ruim na oferta de creche e pré-escola
Um levantamento elaborado pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) revela dados preocupantes sobre os rumos da Educação Infantil no Rio Grande do Sul. De acordo com a radiografia, 96,1% dos municípios gaúchos oferecem menos vagas em creches do que a meta estabelecida pelo Plano Nacional de Educação (PNE), criado em 2001. O mesmo vale para as vagas na pré-escola, que em 77,2% das cidades também estão abaixo do alvo.
Para chegar a esse diagnóstico, o TCE comparou dados do Censo Escolar 2009 e do IBGE com as diretrizes do PNE. A ideia, segundo Hilário Royer, coordenador da pesquisa, foi avaliar até que ponto os objetivos estão sendo cumpridos. A partir daí, foi possível elaborar um ranking, baseado no total de matrículas na Educação Infantil e no número de habitantes de até cinco anos de cada município. Além de identificar 141 cidades onde simplesmente não há registro de matrículas em creches, o TCE chegou a uma estimativa de vagas que precisam ser criadas para atender à exigência mínima. Os dados assustam.
Ao todo, o PNE prevê que pelo menos 50% das crianças de até três anos tenham acesso a creche. No Estado, só 19 municípios passam dessa marca. Seriam necessárias mais 174,1 mil vagas do tipo para atingir o mínimo desejado. Na pré-escola, o PNE estabelece a meta de 80%, mas 383 cidades estão abaixo. Seriam necessárias mais 84,4 mil vagas. Ao todo, faltam 258,6 mil vagas no Estado.
– Temos uma das menores taxas de natalidade do país e, ainda assim, as prefeituras, principais responsáveis, não dão conta – avalia Royer.
Para o presidente da Federação das Associações dos Municípios (Famurs), Vilmar Zanchin, os prefeitos estão trabalhando, mas haveria uma questão cultural, principalmente em cidades menores, que levaria casais a optar por deixar os filhos em casa, com avós.
Cidades como Muçum, no Vale do Taquari, mostram que é possível universalizar o acesso. Lá, 88,6% das crianças são atendidas, o melhor índice do Estado, e não faltam vagas. A preocupação com a educação levou o prefeito Tarso Bastiani a aumentar de 25% para 27% o investimento na área.Vice-presidente do TCE, Cezar Miola espera que outros administradores sigam o exemplo e aumentem os recursos voltados à Educação Infantil – cuja oferta é considerada obrigatória pelo Supremo Tribunal Federal.
"A escolinha é fundamental para o desenvolvimento da criança"
Entrevista Tania Beatriz Marques, professora da UFRGS
Professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Tania Beatriz Iwaszko Marques é uma defensora da Educação Infantil. Para a educadora, os benefícios para as crianças que desde cedo frequentam creches e escolinhas são muitos: da convivência com os colegas aos estímulos para o desenvolvimento físico e mental. Ela concedeu a seguinte entrevista a Zero Hora:
Zero Hora – Qual é a importância da Educação Infantil?
Tania Beatriz Iwaszko Marques – A escolinha é fundamental para o desenvolvimento das crianças. Porque essa é uma fase em que o cérebro está em plena formação. É nessa época que elas começam a se relacionar com o mundo ao seu redor e a se situar nele. Por isso é tão importante que sejam estimuladas de diferentes formas, com brincadeiras, canções e conversas, por pessoas com formação adequada.
ZH – Muitos pais creem que podem cuidar melhor de seus filhos em casa, em família. Estão certos?
Tania – Na escolinha são construídas as primeiras noções de respeito ao outro, por exemplo. Entre crianças que ficam apenas em casa, cuidadas por avós ou familiares, esse processo muitas vezes não acontece. É importante essa relação próxima com a família e com o carinho dos pais e avós, mas também é importante que as crianças frequentem a Educação Infantil.
ZH – Muita gente associa creche a assistencialismo. Como a senhora avalia isso?
Tania – Muita gente pensa assim e acredita que qualquer um pode cuidar da criança nessa idade. Mas é justamente o contrário.
Na pior colocada, avó terá de deixar emprego
Letícia Barbieri
Em fevereiro, depois de terminado seu período de licença-maternidade, a auxiliar de vendas Chaiane Gomes de Azevedo, 18 anos, terá de voltar ao trabalho sem ter uma escola onde deixar o filho, hoje com 27 dias.
Para que a criança não fique com estranhos, a mãe dela, Maria Inês da Silva Gomes, 44 anos, já decidiu que vai largar o emprego de merendeira para cuidar do neto. A situação ocorre em Jaquirana, município gaúcho com o pior índice de oferta de vagas na Educação Infantil
– A maioria não tem uma mãe como a minha para fazer isso. Ela está abrindo mão do trabalho por causa dessa situação – conta Chaiane.
Com 5 mil habitantes, o município da região serrana tem apenas 19 das suas 445 crianças de até cinco anos atendidas pela Educação Infantil – o equivalente a apenas 4,27%.
As dificuldades financeiras de uma cidade pequena são a justificativa oferecida pelo prefeito Ivanor Rauber (PP) para a falta de uma escola infantil.
Somente agora, com verba do Ministério da Educação, o primeiro estabelecimento do tipo começa a ganhar forma. Até junho do ano que vem, Jaquirana espera inaugurar o prédio. O investimento é de cerca de R$ 1,5 milhão. A promessa é de 120 vagas para as crianças de até cinco anos.
– Aqui, as mães que trabalham em firmas são poucas. A maioria mora no interior. As famílias vivem da pecuária, e as crianças ficam em casa – diz Rauber.
O prefeito promete traçar um plano para criar novas vagas.
Juliana Bublitz
ZERO HORA
Um levantamento elaborado pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) revela dados preocupantes sobre os rumos da Educação Infantil no Rio Grande do Sul. De acordo com a radiografia, 96,1% dos municípios gaúchos oferecem menos vagas em creches do que a meta estabelecida pelo Plano Nacional de Educação (PNE), criado em 2001. O mesmo vale para as vagas na pré-escola, que em 77,2% das cidades também estão abaixo do alvo.
Para chegar a esse diagnóstico, o TCE comparou dados do Censo Escolar 2009 e do IBGE com as diretrizes do PNE. A ideia, segundo Hilário Royer, coordenador da pesquisa, foi avaliar até que ponto os objetivos estão sendo cumpridos. A partir daí, foi possível elaborar um ranking, baseado no total de matrículas na Educação Infantil e no número de habitantes de até cinco anos de cada município. Além de identificar 141 cidades onde simplesmente não há registro de matrículas em creches, o TCE chegou a uma estimativa de vagas que precisam ser criadas para atender à exigência mínima. Os dados assustam.
Ao todo, o PNE prevê que pelo menos 50% das crianças de até três anos tenham acesso a creche. No Estado, só 19 municípios passam dessa marca. Seriam necessárias mais 174,1 mil vagas do tipo para atingir o mínimo desejado. Na pré-escola, o PNE estabelece a meta de 80%, mas 383 cidades estão abaixo. Seriam necessárias mais 84,4 mil vagas. Ao todo, faltam 258,6 mil vagas no Estado.
– Temos uma das menores taxas de natalidade do país e, ainda assim, as prefeituras, principais responsáveis, não dão conta – avalia Royer.
Para o presidente da Federação das Associações dos Municípios (Famurs), Vilmar Zanchin, os prefeitos estão trabalhando, mas haveria uma questão cultural, principalmente em cidades menores, que levaria casais a optar por deixar os filhos em casa, com avós.
Cidades como Muçum, no Vale do Taquari, mostram que é possível universalizar o acesso. Lá, 88,6% das crianças são atendidas, o melhor índice do Estado, e não faltam vagas. A preocupação com a educação levou o prefeito Tarso Bastiani a aumentar de 25% para 27% o investimento na área.Vice-presidente do TCE, Cezar Miola espera que outros administradores sigam o exemplo e aumentem os recursos voltados à Educação Infantil – cuja oferta é considerada obrigatória pelo Supremo Tribunal Federal.
"A escolinha é fundamental para o desenvolvimento da criança"
Entrevista Tania Beatriz Marques, professora da UFRGS
Professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Tania Beatriz Iwaszko Marques é uma defensora da Educação Infantil. Para a educadora, os benefícios para as crianças que desde cedo frequentam creches e escolinhas são muitos: da convivência com os colegas aos estímulos para o desenvolvimento físico e mental. Ela concedeu a seguinte entrevista a Zero Hora:
Zero Hora – Qual é a importância da Educação Infantil?
Tania Beatriz Iwaszko Marques – A escolinha é fundamental para o desenvolvimento das crianças. Porque essa é uma fase em que o cérebro está em plena formação. É nessa época que elas começam a se relacionar com o mundo ao seu redor e a se situar nele. Por isso é tão importante que sejam estimuladas de diferentes formas, com brincadeiras, canções e conversas, por pessoas com formação adequada.
ZH – Muitos pais creem que podem cuidar melhor de seus filhos em casa, em família. Estão certos?
Tania – Na escolinha são construídas as primeiras noções de respeito ao outro, por exemplo. Entre crianças que ficam apenas em casa, cuidadas por avós ou familiares, esse processo muitas vezes não acontece. É importante essa relação próxima com a família e com o carinho dos pais e avós, mas também é importante que as crianças frequentem a Educação Infantil.
ZH – Muita gente associa creche a assistencialismo. Como a senhora avalia isso?
Tania – Muita gente pensa assim e acredita que qualquer um pode cuidar da criança nessa idade. Mas é justamente o contrário.
Na pior colocada, avó terá de deixar emprego
Letícia Barbieri
Em fevereiro, depois de terminado seu período de licença-maternidade, a auxiliar de vendas Chaiane Gomes de Azevedo, 18 anos, terá de voltar ao trabalho sem ter uma escola onde deixar o filho, hoje com 27 dias.
Para que a criança não fique com estranhos, a mãe dela, Maria Inês da Silva Gomes, 44 anos, já decidiu que vai largar o emprego de merendeira para cuidar do neto. A situação ocorre em Jaquirana, município gaúcho com o pior índice de oferta de vagas na Educação Infantil
– A maioria não tem uma mãe como a minha para fazer isso. Ela está abrindo mão do trabalho por causa dessa situação – conta Chaiane.
Com 5 mil habitantes, o município da região serrana tem apenas 19 das suas 445 crianças de até cinco anos atendidas pela Educação Infantil – o equivalente a apenas 4,27%.
As dificuldades financeiras de uma cidade pequena são a justificativa oferecida pelo prefeito Ivanor Rauber (PP) para a falta de uma escola infantil.
Somente agora, com verba do Ministério da Educação, o primeiro estabelecimento do tipo começa a ganhar forma. Até junho do ano que vem, Jaquirana espera inaugurar o prédio. O investimento é de cerca de R$ 1,5 milhão. A promessa é de 120 vagas para as crianças de até cinco anos.
– Aqui, as mães que trabalham em firmas são poucas. A maioria mora no interior. As famílias vivem da pecuária, e as crianças ficam em casa – diz Rauber.
O prefeito promete traçar um plano para criar novas vagas.
Juliana Bublitz
ZERO HORA
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