quarta-feira, 28 de abril de 2010

Casal de lésbicas do Rio Grande do Sul comemora decisão do STJ favorável à adoção de duas crianças


PORTO ALEGRE - A psicóloga Luciana Reis Maidana, 36 anos, e a fisioterapeuta Lídia Brignol Guterres, 44 anos, que tiveram confirmado o direito de compartilhar a adoção de dois meninos, de seis e sete anos, comemoraram a decisão inédita do Superior Tribunal de Justiça (STJ). A decisão, unânime, cria precedente para que outros casais gays adotem filhos em conjunto.
- Agora somos duas mães - disse Luciana.

É a primeira vez que um tribunal superior reconhece o direito. Até agora, os casais homossexuais driblavam a legislação, aproveitando a brecha que permite a solteiros adotar. Adotavam juntos, mas apenas um dos companheiros aparecia nos registros como pai ou mãe. Foi o que aconteceu com as lésbicas de Bagé. Juntas há 13 anos, elas adotaram um menino em 2002 e outro em 2003. Na certidão de nascimento, ambos, hoje com seis e sete anos, apareciam apenas como filhos de Luciana. Com a decisão do STJ, passa a ser oficialmente reconhecido que os meninos têm duas mães. O caso também será analisado pelo Supremo Tribunal federal (STF), já que o Ministério Público do Rio Grande do Sul, que contestava a adoção, também entrou com recurso no órgão.
Os próprios ministros do STJ reconheceram como inovadora a sua decisão. O parecer deles foi de que deve prevalecer o interesse da criança. - Esse julgamento é muito importante para dar dignidade ao ser humano, para o casal e para as crianças. Se não for dada a adoção, as crianças não terão direito a plano de saúde, herança e em caso de separação ou morte podem ficar desamparadas - disse o relator, Luis Felipe Salomão.
O caso tramitava desde 2005, quando a Vara de Infância e Juventude de Bagé permitiu a Luciana e Lídia o registro dos meninos. O Ministério Público Estadual recorreu. Na época, o promotor da cidade André Barbosa de Borba justificou afirmando que a adoção conjunta só seria permitida em caso de casamento ou união estável. Ele afirmava que, como não havia lei regulamentando a união entre pessoas do mesmo sexo, a adoção seria irregular. Em 2006, Luciana e Lídia obtiveram nova vitória, no Tribunal de Justiça do Estado, que reconheceu a entidade familiar. O MP, porém, voltou a recorrer, o que levou o caso para Brasília.
O ministro Luis Felipe Salomão explicou que o laudo da assistência social recomendou a adoção, assim como parecer do Ministério Público Federal. A expectativa é de que a decisão do STJ abra caminho para uma legislação que reconheça o direito de adoção por homossexuais.
- Não estamos legislando. A lei sempre veio a posteriori - disse o presidente da quarta turma do STJ, ministro João Otávio de Noronha.
Luciane e Lídia não são o único casal homossexual a obter o direito a adoção na Justiça, mas são o primeiro a obter sentença favorável em um tribunal superior. A defensora pública Patrícia Aléssio, que defende Luciane e Lídia desde o início, observa que outros casos não chegaram a Brasília porque, em geral, promotores e procuradores do MP têm concordado com as decisões dos tribunais - o que não ocorreu no caso de Bagé.
Luciana falou sobre a decisão do STJ ao jornal Zero Hora:

Zero Hora - Como vocês receberam a decisão do STJ?

Luciana - Foi uma alegria imensa, sem igual. Estávamos esperando por isso desde 2006, quando o magistrado de Bagé foi favorável a nós. Mas então o processo foi para Porto Alegre, o Ministério Público recorreu e ficou complicado. Foram anos em que estivemos muito ansiosas e preocupadas.

ZH - Qual será o próximo passo de vocês agora?

Luciana - O próximo passo é adicionar o nome da Lídia como mãe na certidão dos nossos filhos. Eles foram adotados no meu nome.

ZH - O que preocupava vocês no caso de não conseguirem a decisão favorável?

Luciana - A nossa preocupação é que nossos filhos ficassem sem amparo legal no caso de acontecer algo comigo. Estamos juntas há 13 anos e, desde as adoções, as duas somos mães. Toda mulher tem esse desejo, de ser mãe e de formar uma família.

ZH - Por que vocês resolveram agora falar em público, depois de anos mantendo-se anônimas?

Luciana - O anonimato foi para a preservação dos dois meninos e porque nossa intenção não era levantar uma bandeira. Resolvemos falar para abrir a porta para que outros casais tenham consciência de que agora é possível adotar e ter uma vida normal. Esperamos que muitos outros busquem esse direito.

ZH - Alguma vez vocês sofreram preconceito?

Luciana - Todo mundo sempre soube que eles têm duas mães, mas até hoje nunca houve preconceito. Vamos ver a partir de agora.


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