domingo, 13 de junho de 2010

Vigilante irá a júri popular por crime cometido em dezembro de 2008


Ele é acusado de matar a ex-mulher em um restaurante da Asa Norte

Está marcado para amanhã o julgamento do vigilante Marcelo Rodrigues Moreira, 33 anos, no Tribunal do Júri de Brasília. Ele é acusado de matar a facadas a ex-mulher Ana Paula Mendes de Moura, também 33, em 15 de dezembro de 2008. O crime ocorreu em um dia de semana em um movimentado restaurante da 404 Norte. Além da repercussão de um dos casos mais chocantes praticados no Plano Piloto nos últimos anos, será o primeiro júri em que a Subsecretaria de Proteção às Vítimas da Violência (Pró-Vítima) atuará como assistente da acusação.
A advogada Iara Lobo de Figueiredo representará o órgão, vinculado à Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania do DF. A assessora jurídica da Pró-Vítima auxiliará o Ministério Público do Distrito Federal durante o júri responsável pela condenação ou absolvição do réu acusado de homicídio duplamente qualificado — motivo torpe e Lei Maria da Penha. “Trata-se de um homem (Marcelo) que em nenhum momento esteve preocupado com a família ou com uma mãe de três filhos. Sempre esteve mais preocupado com a vida dele, mesmo depois do crime”, afirmou Iara.
O assassinato ocorreu no local de trabalho da vítima, o restaurante Fulô do Sertão. O ex-marido de Ana Paula a matou por volta das 13h15, durante o horário de almoço. Dezenas de pessoas testemunharam o ataque. Entre elas, a subsecretária da Pró-Vítima, a jornalista Valéria Velasco. Marcelo invadiu o local vestido com um paletó escuro, puxou um facão e seguiu em direção à ex-mulher. Ana Paula estava no caixa. Percebeu a chegada de Marcelo, correu para o banheiro, mas o encontrou fechado. Em seguida, recebeu pelas costas a facada que lhe tirou a vida.
O acusado tentou fugir, mas acabou alcançado e rendido por funcionários do próprio restaurante. Três homens o seguraram até a chegada da polícia. Foi nesse momento que, segundo os responsáveis pela acusação do réu, Marcelo lamentou o crime, mas se manifestou preocupado apenas com a própria situação. “No dia do crime, ele ligou insistentemente para ela. Queria voltar, mas ela não. Tanto que pouco antes ela entrou com uma ação penal por causa da insistência e de ameaças”, disse Iara. A prisão em flagrante obrigou Marcelo a responder ao processo detido no Complexo Penitenciário da Papuda.
Ana Paula e Marcelo viveram juntos por 8 anos. Antes do assassinato, ela tentou várias iniciativas legais para mantê-lo afastado. Registrou ocorrências em um período de seis anos. Formalizou as primeiras em janeiro e julho de 2002 por lesão corporal e perturbação da tranquilidade. Mais tarde, em 2007, o denunciou à polícia mais uma vez por perturbação. No ano seguinte, o acusou de ameaça e ofensa. Ainda conseguiu uma ordem judicial que obrigava o vigilante a se manter afastado por pelo menos 200m. Nada serviu para impedir o fim trágico.

Mobilização
A luta de Ana Paula por manter o ex-marido afastado teve como testemunhas os próprios familiares dela. Maria de Fátima Mendes de Moura, uma das três irmãs da vítima, a acompanhou em uma das idas à Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam). Ficou inclusive com ela a guarda dos filhos de Ana Paula, de 11, 15 e 17 anos — o réu não é pai de nenhum deles. “Sou hoje a mãe dos três e ainda tenho de cuidar da nossa mãe, que era doente e piorou muito depois que tudo aconteceu. Sabemos que esse julgamento é importante, mas será apenas um consolo. Nada vai trazê-la de volta”, afirmou.
Os familiares de Ana Paula aguardam com expectativa o julgamento popular que definirá o futuro do vigilante Marcelo Moreira. Nesta segunda-feira, por exemplo, parentes, amigos e conhecidos comparecerão ao Tribunal do Júri de Brasília vestidos com camisetas brancas estampadas com foto da vítima. “Estamos chamando todos aqueles que faziam parte do ciclo de amigos da Ana Paula para o Tribunal do Júri. Ele (Marcelo) não pode ficar solto, pois pode fazer isso com outras pessoas”, avaliou Maria de Fátima.
O advogado de Marcelo, Alexandre Kennedy Sampaio, seguirá a mesma estratégia adotada desde que assumiu o caso. Explorará uma possível semi-imputabilidade do acusado. Segundo ele, o vigilante não tem noção plena dos próprios atos por conta de traumas na infância. “O Marcelo tem as faculdades mentais reduzidas, um histórico de distúrbios mentais desde criança. Sofre hoje de insônia e de problemas emocionais”, argumentou. Sampaio tentou no início do processo um atestado de insanidade mental para o cliente. Mas uma psicóloga do Instituto de Medicina Legal (IML) não detectou distúrbios.
O defensor também adiantou ao Correio que não irá negar a autoria do crime diante do júri. Mesmo assim, sustentou que, apesar de Marcelo ter chegado ao Fulô do Sertão armado com um facão, não procurou Ana Paula motivado a tirar a vida dela. “A intenção dele nunca foi matá-la”, alegou. Para o advogado, o vigia, caso seja condenado, deveria cumprir pena em um regime especial ou em um manicômio. Existe a possibilidade de que o julgamento exija mais de um dia para ser concluído, uma vez que pelo menos 10 testemunhas serão ouvidas.

Assessoria
O programa existe desde março de 2009. Tem como finalidade dar visibilidade aos direitos dos cidadãos atingidos direta ou indiretamente por crimes violentos, assegurando atendimentos multidisciplinares nas áreas psicossocial e jurídica.

Mais rigor
A Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, foi criada para coibir e prevenir a violência contra a mulher. Tornou mais rigorosa a punição dos acusados ao tipificar a violência doméstica e familiar como violação aos direitos humanos. Os casos são julgados em varas criminais.

Guilherme Goulart
Correio Braziliense

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Verbratec© Desktop.