quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Família de adolescente baleado por PM autoriza doação de órgãos



Jovem teve morte cerebral constatada na madrugada desta quinta.
Mãe contou ao G1 sua relação e seus últimos momentos com o filho.


A recepcionista Maria Lucinéia Bento, de 45 anos, autorizou na manhã desta quinta-feira (23) a doação dos órgãos de seu filho, Leonardo Bento, de 17 anos. O adolescente teve morte cerebral constatada nesta madrugada após ser baleado nesta quarta-feira (22) por uma policial militar em frente à escola em que estudava, na Estrada do M’Boi Mirim, Zona Sul de São Paulo. Segundo a PM, o disparo foi acidental, depois que a policial foi cercada por jovens. Testemunhas contestam a versão.
Após uma noite sem dormir, Maria Lucinéia estava nesta manhã no Hospital do M’Boi Mirim, onde seu filho segue internado para a realização de outros exames. Apenas após o fim do processo, previsto para esta tarde, poderá ser feita a retirada dos órgãos e a liberação do corpo. “Autorizei a doação de órgãos. Vai salvar outras vidas. Ele é novo, tem os órgãos perfeitos. Era meu filho único, fiquei sem objetivo na vida. Trabalhava para sustentar meu filho, minha vida era cuidar dele, eu vivia para ele”, contou ela ao G1 nesta manhã.
A recepcionista vivia apenas com o filho em uma casa alugada. Os dois eram muito próximos e dormiam no mesmo quarto – um dos sonhos do adolescente era ter uma casa própria com seu próprio dormitório. O jovem estava no segundo ano do Ensino Médio, e sua mãe queria que ele fizesse o terceiro ano no ensino técnico. “Ele queria fazer engenharia mecânica, então eu ia matriculá-lo no ensino técnico de mecânica para ele ver se era isso mesmo. Ele fazia inglês aos sábados, eu ia colocar na informática para ocupar o tempo dele, não fiEla viu o filho pela última vez na manhã de quarta, quando o jovem se despediu antes de ir para a escola. Leonardo havia dormido mais cedo que o normal no dia anterior e se disse muito feliz ao acordar. “Ele foi tomar banho cantando, foi se despedir de mim falando que estava tão feliz, disse que me amava”, contou ela. O adolescente passou o dia na escola, e por volta das 18h40, Maria Lucinéia recebeu uma ligação de seu irmão contando que o filho estava internado.
A família não quis dar detalhes da gravidade do ocorrido, e ela seguiu com o irmão para o Hospital das Clínicas, para onde o garoto foi transferido. No HC, foram feitos mais exames e um neurologista avaliou o menino, constatando a morte cerebral. “Não entendi nada, fiquei desesperada, não queria acreditar que meu filho estava morto. Aí liguei para minha chefe, que é médica, e ela falou: ‘É muito grave’, e começou a chorar.”
Como nada podia ser feito, Leonardo foi encaminhado para o hospital de origem, onde permanece internado para a realização dos exames complementares. Nesta manhã, grande parte da família se reunia no local para tentar confortar a recepcionista.
car na rua, com más companhias”, contou a mulher.
“Ele era um menino muito bom, amoroso, querido por todo mundo da minha vizinhança, da escola, parentes, muito educado, menino exemplar. Era muito amigo, companheiro, obediente”, contou a mãe de Leonardo. “A minha ficha não caiu ainda, estou meio em estado de choque. Enquanto ele estiver entubado eu vou ter esperança que ele vai voltar.”

Festa
De acordo com a recepcionista, o filho não ia todos os dias à festa que ocorria em frente à escola, pois ela o controlava. “Ele estava naquela fase de novos amigos, eu andei podando algumas amizades, mas era muito tranquilo, amoroso. Eu confiava nele, mas não confio nas pessoas com quem ele andava. Não quero dizer que ele era santo, mas pelo que conheço dele, ele não era de fazer coisa errada”, afirmou.
Amigos do adolescente disseram que ele não fez nada que justificasse o tiro. Ele estava na garupa de uma moto quando foi baleado, deixando o local da festa. A mãe do jovem espera que os responsáveis sejam identificados e punidos. “Espero justiça, espero que eles melhorem esses policiais que estão na rua, para não cometer mais esse tipo de delito. Nada justifica ela [a PM que atirou] ter tirado a vida dele. Ele tinha muita vida pela frente. Agora acabou com a minha vida, estou sem chão."
Em nota, a PM informou que o disparo foi acidental e ocorreu no momento em que a policial foi cercada por várias pessoas que tentavam pegar sua arma. A polícia havia sido chamada por volta das 17h30 para resolver um tumulto provocado por jovens que interditavam a avenida e consumiam bebidas alcoólicas. A policial seria encaminhada ao Presídio Militar Romão Gomes.

Juliana Cardilli


G1

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