domingo, 12 de dezembro de 2010

Falta de informação faz portadores de marca-passo evitarem esportes, celular e até sauna


Pacientes deixam de realizar atividades e ficam mais expostos a doenças

O advogado Edilson Avelar, de 53 anos, ficou oito anos sem ir às sessões de sauna de que ele tanto gosta. Os culpados pela mudança de hábito foram uma parada cardiorrespiratória que ele sofreu em julho de 2002, o marca-passo que passou a utilizar depois isso e a falta de informações sobre o uso adequado do aparelho.
Um estudo desenvolvido em uma clínica particular de Vitória, no Espírito Santo, demonstrou que muitos pacientes portadores de marca-passo consideram que o aparelho os impede de realizar diversas atividades que, na verdade, eles estão aptos a fazer.
De acordo com os resultados da pesquisa, dentre os 198 pacientes entrevistados, 27% julgam que fazer sexo é inadequado após a implantação do marca-passo, 30% evitam dormir sobre o lado em que está o aparelho, 42% deixam de andar de bicicleta, 46% evitam usar o computador com internet, 47% acham arriscado nadar na praia, e o mesmo percentual evita o telefone celular, 58% não fazem esportes de recreação ou academia e 75% acreditam que fazer sauna não é seguro, dentre outros resultados.
Segundo o coordenador da pesquisa, o médico Jorge Elias Neto, da Clínica do Ritmo e especialista da Sobrac (Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas), apesar de os pacientes receberem orientações sobre o que podem e o que não podem fazer após o implante, muitos não se sentem seguros. Com isso, ao abandonar atividades que poderiam melhorar a qualidade de suas vidas, eles abrem a porta para uma série de doenças, como depressão.
- Não adianta agregar tecnologia aos aparelhos se os pacientes não estão informados e aptos a usar adequadamente o marca-passo. Isso é impactante porque interfere na qualidade de vida do indivíduo, como caminhar ou ir à praia. Com o passar do tempo, pode causar uma série de outras doenças.
No caso de Edilson, ele só voltou às sessões de sauna em junho passado – oito anos após implantar o marca-passo – e depois de uma atitude simples: perguntou ao seu médico se havia alguma restrição.
- Tinha deixado de fazer a sauna porque, como o aparelho é subcutâneo, achava que iria esquentar e podia danificar. Mas resolvi perguntar ao meu médico e vi que não tinha problema.
De acordo com o cardiologista Martino Martinelli, professor da USP (Universidade de São Paulo) e diretor da Unidade Clínica de Estimulação Cardíaca do Incor (Instituto do Coração), as limitações desses pacientes não são impostas pelo marca-passo, mas, sim, pela doença que levou à implantação do aparelho.
- Se o indivíduo tem um coração de tamanho normal e sem doença, ele pode fazer tudo o que as demais pessoas. O marca-passo está lá para permitir que ele possa fazer mais coisas.

O marca-passo
A função de um marca-passo é corrigir os batimentos cardíacos lentos por meio da emissão de impulsos elétricos. Com isso, ele contribui para que o coração envie uma quantidade adequada de sangue para os órgãos. Segundo Martinelli, o aparelho atua fisiologicamente como o coração.
- Ele aumenta o batimento cardíaco durante a prática de exercícios e situações de ansiedade e diminuem durante o sono.
As principais doenças que levam à implantação de um marca-passo, de acordo com Martinelli, são infarto, doença de Chagas e coração dilatado.
Implantados cirurgicamente, o aparelho é composto por uma bateria de lítio, um gerador de impulsos e eletrodos que o conectam ao coração. A duração média da bateria é de cinco anos, mas o paciente precisa ser acompanhado regularmente por um médico durante esse período. Depois isso, a bateria é trocada por meio de uma pequena cirurgia.
Sobre as restrições que o aparelho impõe, Martinelli afirma que os portadores de marca-passo devem evitar atividades físicas que provoquem choque, como taekwondo, judô e beisebol. Já futebol e basquete, só podem ser praticados com proteção.
Além disso, é preciso evitar locais com campo magnético, que podem interferir no funcionamento eletrônico do marca-passo. Por isso, é preciso ficar longe de campos de alta tensão, lugares mal aterrados e detectores de metais e armas. Martinelli afirma ainda que aparelhos de raios-x e ultrassom não causam problemas.
- O paciente tem muitos mitos, como ficar longe de eletrodomésticos. Alguns acreditam que não podem fazer sexo porque não podem chacoalhar muito. Ou então que o aparelho muda de posição quando ele sobe ou desce uma ladeira. Mesmo alguns médicos acham que isso causa problemas. Mas é tudo mito.
Segundo Neto, apesar de os pacientes serem informados, falta padronização na informação. Ele diz que os portadores deveriam receber um material didático, além de serem lembrados periodicamente do que podem ou não fazer.
- O marca-passo ainda é um tabu. As pessoas comuns e até médicos dão respostas erradas e o paciente passa a incorporar no seu dia a dia o que os outros dizem.

Vida melhor
Apesar de muitos pacientes evitarem algumas atividades, o estudo mostrou que 78% dos entrevistados afirmaram que suas vidas melhoraram após a implantação do marca-passo.
Segundo Neto, isso ocorre porque as doenças que motivam a instalação do aparelho são, em geral, de alto risco e geram sintomas graves.
- Mas esses pacientes poderiam estar muito melhores se se permitissem mais.
É o caso do aposentado Vicente Nolasco Costa, de 84 anos, que há mais de 13 anos usa o aparelho. Ele afirma que atualmente faz caminhadas e exercícios como flexão pelo menos três vezes por semana.
- Faço 85 anos no mês que vem, mas tenho disposição de 60 ou um pouco mais. Se eu não tivesse marca-passo, já tinha morrido há muito tempo.
Já Edilson, que voltou a fazer a sua sauna, tem hoje uma vida praticamente igual à de antes do marca-passo. A única diferença é o futebol.
- Tenho uma vida absolutamente normal. Tirando a bolinha que eu não jogo mais, o resto está tudo tranquilo.

Diego Junqueira


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