sábado, 13 de março de 2010

Para recuperar a autoestima, a peruca

Por Natalia Cuminale

Com direito a convidados de peso, joias valiosas e os habituais selinhos, Hebe Camargo retornou na última segunda-feira ao palco de seu programa no SBT como se nunca tivesse deixado o comando da atração semanal para tratar um câncer no peritônio. A alegria da apresentadora segue expansiva. Dois detalhes, porém, denunciavam a luta contra a doença: ela está mais magra e usava peruca - a queda dos cabelos, vale lembrar, é um dos efeitos da quimioterapia a que Hebe se submeteu.
"Antes de fazer a peruca, eu disse a ela que aquele não era um momento para mudanças na aparência. O ideal é que ela voltasse ao programa com o mesmo visual de sempre, com o cabelo com que todos estamos acostumados", conta a cabeleireira Nilta Murcelli. Mestre na arte de confeccionar perucas há 50 anos, Nilta fez quatro modelos para a apresentadora. Sua habilidade no ofício é diretamente proporcional à recuperação da autoestima de mulheres que, como Hebe, enfrentam uma doença debilitante.
Outras mulheres famosas já trilharam o caminho que Hebe segue agora, em busca da recuperação. Estão entre elas a ministra Dilma Rousseff, a empresária Eliana Tranchesi, dona da Daslu, e a autora de novelas globais Glória Perez. "É um momento muito difícil para qualquer mulher que tem que cobrir sua cabeça", diz Yaffie Begun, responsável pelas perucas usadas por Glória e Eliana. "Uma cliente uma vez me disse que a peça foi tão importante quanto a quimioterapia: uma cuida da parte física, a outra, da emocional."
O item surge na vida das mulheres no momento em que elas estão mais vulneráveis. Depois de passar pelas difíceis fases de diagnóstico e tratamento quimioterápico, vem a apreensão: quando as mechas começarão a cair? "O médico avisa, mas você não sabe quando isso vai acontecer de fato. De repente, você passa a mão na cabeça e os tufos começam a cair. Foi aí que eu pensei em usar uma peruca", explica Márcia Oliveira, dona-de-casa que venceu um câncer de mama há quatro anos. "Além do mal-estar da própria doença, você ainda tem de ficar sem cabelo. Mas a peruca salva nessa hora, não deixa você ficar constrangida, recupera a autoestima."
No Reino Unido, a preocupação com a situação de mulheres como Márcia, Hebe, Dilma, Eliana e Glória produziu um fato interessante. A organização social Macmillan Cancer formou uma aliança com a maior rede de salões de beleza do país, Toni & Guy, para treinar cabelereiros para que eles deem atenção especial a pacientes que sofrem de câncer e perdem os cabelos. O treinamento dos profissionais dura dois dias e ensina como cortar uma peruca e como oferecer suporte emocional ao doente.
No Brasil, a decisão de procurar um peruqueiro normalmente surge em conjunto com a família. As pessoas que chegam para encomendar a peruca são levadas para salas privativas e recebem uma variedade de itens para experimentar. Segundo Nilta, é importante procurar o lugar com antecedência. "Se o médico disse que vai cair o cabelo, é bom que o paciente venha logo, para facilitar na hora da escolha do modelo. Assim, posso ver o rosto da cliente e o tipo de corte que ela usa", explica.
Confeccionada com cabelos naturais brasileiros, o valor de uma peruca pode variar entre 600 reais e 9.000 reais, dependendo da qualidade e do tipo da encomenda. Se a peça for utilizada diariamente, é preciso lavá-la uma vez por semana. O procedimento é feito no salão, já que, se for realizado em casa, corre-se o risco de deformação.
Outra alternativa é a prótese capilar, que difere da peruca no modo de colocação. Feita com cabelo importado da Índia, pode ser usada com mais frequência, inclusive para nadar. "É uma peça leve, que não aperta e também dá mais segurança", explica Heloisa Penteado, proprietária da Hair Look. Segundo Heloisa, 90% de sua clientela são pacientes que fazem tratamentos contra tumores.
Embora exista uma variedade de recursos, há quem prefira assumir a vida sem o cabelo. Esse foi o caso da apresentadora Ana Maria Braga, que logo depois de aparecer de peruca resolveu adotar o cabelo bem curto. A dona de casa Nair Aparecida Gil, de 79 anos, também tentou usar peruca, mas preferiu cobrir a cabeça com lenços e gorros de crochê. "Minha filha comprou uma peruca bonita e sofisticada. Sai do salão com ela, mas aquilo pesava na minha cabeça, achei que ficou esquisito", conta Nair, que descobriu o câncer há três anos.
No momento em que o cabelo começa a cair, a peruca, prótese ou lenço se tornam os principais aliados da mulher. Mas basta crescer um só fio para que elas sejam rapidamente descartadas. "Só tenho a agradecer pela existência da peruca, mas não posso negar é que uma sensação muito boa quando você não precisa mais dela", conta Márcia. "Quando o cabelo cai, você não acredita que ele vai voltar. Mas quando ele reaparece, surge uma sensação de saúde e recuperação."
Por que o cabelo cai? - De acordo com o dermatologista do Hospital Israelita Albert Einstein, Francisco Le Voci, o termo técnico para a perda de cabelo é alopecia. Os quadros de alopecia são divididos em dois grandes grupos: cicatricial e não-cicatricial. No primeiro, o folículo piloso (raiz) é afetado de forma definitiva por doenças inflamatórias, infecciosas ou traumas permanentes. A segunda situação é diagnosticada quando a perda é temporária e reversível, como interrupção por causa de medicação, traumas emocionais e déficits nutricionais. "São mais de cem causas para perda de cabelo, desde a mais comum, que é a calvície, até perdas temporárias e definitivas", explica Le Voci.
A queda de cabelo provocada pela quimioterapia é considerada alopecia não-cicatricial. "A função da quimioterapia é impedir que as células anormais (câncer) continuem se multiplicando. Um dos efeitos colaterais disso é a queda de cabelo. As drogas quimioterápicas atuam no ciclo do crescimento de cabelo e interferem na produção de novos fios", esclarece o dermatologista.

Veja.com

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