Gabriel (nome fictício) experimentou maconha aos 14 anos. Estudioso e sem nunca ter preocupado os pais, o adolescente foi aprovado no primeiro vestibular para o curso de Engenharia Elétrica aos 17 anos. Na universidade se tornou viciado em drogas, o que o levou a nove meses de internação em uma clínica particular para dependentes químicos.
A curiosidade própria da idade, a frustração com o fim de um namoro de dois anos, a predisposição, o convívio com colegas e professor usuários, segundo a mãe, foram motivos para a mudança de comportamento do adolescente, hoje com 22 anos. “Ele começou a faltar aula do estágio, perdeu o semestre, não tomava banho. Trocou o dia pela noite”, afirmou a mãe de Gabriel que não quis se identificar.
Ela já procurou tratamento para o filho em Barbacena-MG, Birigui-SP e em Uberlândia. “Hoje ele está em uma fase de estabilidade, apesar de não estar abstinente”, disse. “Ele já usou várias drogas: cocaína, crack, mas a fissura dele é pela maconha”. Gabriel foi internado sem o seu consentimento. “Não tive outra escolha”, disse a mãe, que também precisou se tratar de depressão.
No Centro de Atenção Psicossocial para Tratamento de Álcool e outras Drogas (Caps AD), dos 118 pacientes, 19 têm de 12 a 17 anos e, segundo a coordenadora e psicóloga Elaine Bordini Villar, diferentemente dos adultos, a procura por tratamento para os jovens não é espontânea. “O desejo que eles se tratem é sempre do outro, do pai, da mãe, do cuidador ou do juiz. Eles mesmos acham que não têm problema”, disse.
Diferentemente de Gabriel, a maioria destes jovens está fora da escola e tem histórico de repetência e evasão escolar. Ainda de acordo com a coordenadora, quando eles tentam retornar aos estudos, têm dificuldade de adaptação. “As instituições de ensino têm dificuldade de lidar com as diferenças, não estão preparadas para receber estes jovens”, disse Elaine Villar.
Imaturidade, dificuldade de aceitar limites, autoafirmação, fragilidade familiar e amizade são alguns dos motivos que levem ao vício, de acordo com ela. “É todo um contexto. Nessa idade, logicamente, eles são muito imaturos e ficam apaixonados pela droga, não conseguem enxergar os riscos. Grande parte dos adultos que se tratam aqui também começou o uso na adolescência”, afirmou a psicóloga.
Em sua maioria são jovens de classe social baixa, mas Elaine Villar já recebeu jovens de famílias de classe média alta. “Atendi um menino que estudou em escola particular e tinha uma mãe presente. Com 16 anos fazia pequenos furtos pela aventura de fazer o que é errado, porque dinheiro ele tinha.”
Crimes envolvendo jovens estão ligados a drogas
Pai não acha que filho se recupera
Na porta do Ceseu, o aposentado Adalto (nome fictício) espera sua vez para visitar o filho caçula de 14 anos, apreendido por tráfico de drogas. Na mão do pai, um saco com bananas, livros e cartas dos três irmãos mais velhos, todos formados em curso superior. Um deles, mestre pela Universidade Estadual de Campinas. “Trouxe as cópias dos diplomas para mostrar para a psicóloga e ninguém duvidar de mim. Sou um pai carinhoso, meus filhos são bons, mas hoje em dia está difícil. Os maconheiros vão para a porta da minha casa e, como ele é menor, pagou o pato”, afirmou o aposentado.
O menino, que está no 7º ano do ensino fundamental, foi preso há 10 dias no bairro Morumbi e, segundo o pai, além de traficar, consome drogas. “Tenho fé que ele melhore, mas do jeito que está desobediente é mais fácil ir para cadeia do que voltar para escola”, afirmou.
Segundo Adalto, tudo começou depois que se mudou com a família para o bairro Morumbi, zona Leste da cidade, há cerca de sete anos. Na esperança de reverter a situação do filho, o aposentado está de mudança para o bairro Segismundo Pereira, antes que o filho saia do Ceseu. “O advogado falou que em 40 dias ele sai e quero já estar longe daquele lugar”, disse.
Jovens pedem dinheiro para sustentar o vício
Em um semáforo da cidade, os amigos Jonas e Alísson tiram seu sustento. O dinheiro, também conseguido ao vigiar carros na rua, vai todo para a compra de crack. “Comida ninguém nega, mas droga só dão quando querem viciar a gente. Depois que se vicia, só querem te vender”, disse Jonas, de 22 anos. “Gasto uns R$ 35 por dia com sete pedras”, afirmou Alísson, de 19 anos.
Apesar de já terem atingido a maioridade, os dois rapazes são usuários de droga desde a adolescência. O consumo do crack aconteceu depois de terem saído de casa e ido morar na rua, há cerca de dois anos. Eles contam que dormem em uma casa abandonada, onde além de consumir droga, conversam sobre o futuro. “Essa noite eu até falei para ele, o que vai ser da gente daqui um tempo. Tenho uma filha de 5 anos e olha o exemplo que estou dando para ela”, afirmou o mais velho que já foi preso três vezes e diz vir de uma família estruturada e que saiu de casa por vontade própria.
Alísson conta que saiu da casa da mãe depois de uma discussão com o padrasto. “Eles bebem muito. Um dia, ele bateu nela, entrei no meio e bati nele. Ela disse que nós dois não podíamos morar na mesma casa. Então, saí e aqui fora acabou minha vida”, afirmou o jovem que não conheceu o pai, já estudou inglês, informática e sonha com um futuro melhor. “Tenho vontade de ter uma esposa, filhos, um carro, mas nem minha mãe me quis”, disse ele. “Outra hora penso que posso amanhecer morto.”
Ambos afirmam ter experimentado crack por curiosidade e por incentivo de colegas. Também não negam que já roubaram para comprar a droga. “Tem hora que as pessoas dão bobeira, pedem para serem roubadas. Penso: isso aqui dá para comprar tantas pedras e pego. Quem está nessa e fala que não rouba, é mentira”, disse Jonas. “As pessoas viram as costas para gente. Somos maltratados, principalmente pela polícia. A culpa é da minha mãe e minha também. Eu escolhi assim”, disse o mais novo.
Fase é propícia a novas experiências
Os adolescentes passam por um processo de transição do estado infantil para o adulto, quando são cobrados pela sociedade sobre os caminhos que seguirão. É quando também encontram novas atividades de lazer, buscam por modelos de identidade, a aceitação do grupo onde estão inseridos e fazem a escolha profissional. “Apresenta-se ao jovem um novo estilo de vida”, disse a psicóloga Natália Fontes Caputo de Castro que trabalha com adolescentes dependentes químicos e com outras compulsões.
Segundo a profissional, é neste período que o adolescente se torna vulnerável a vários tipos de experimentação, entre elas, as drogas. “E quanto mais cedo experimentarem substâncias psicoativas, maior o risco de se tornarem usuários e dependentes químicos”, disse.
Sobre bebidas alcoólicas, a especialista fala de um estudo feito pelo governo federal, realizado em 2007, o primeiro levantamento nacional sobre o padrão de consumo de uso de álcool no País. Dentre a população geral, 14 milhões de adolescentes, entre 14 e 17 anos, foram ouvidos, dos quais 35% consomem bebidas alcoólicas uma vez no ano e 24% fazem uso mensalmente. “Esse dado é muito alto quando falamos de jovens”, disse a psicóloga.
Para a profissional, os motivos da dependência química são multifatoriais, como genética, hereditariedade, social, psicossocial e influências do meio de comunicação, entre outros. “Há relatos de pessoas que usam maconha uma única vez e desenvolvem um surto de esquizofrenia. A pessoa já tem um núcleo psicótico que não sabia que existia e a maconha, diferentemente do que se fala, é droga e vicia”, afirmou.
Para a psicóloga, a prevenção deve iniciar com crianças de 10 anos, inclusive para drogas lícitas, como o álcool e o tabaco. “Eles já deveriam entender sobre esses riscos desde cedo. Talvez não se falando diretamente sobre o assunto, mas ensinando o que é uma vida prazerosa, sem vícios. Deve ter um conjunto de ações”, disse a especialista.
A curiosidade própria da idade, a frustração com o fim de um namoro de dois anos, a predisposição, o convívio com colegas e professor usuários, segundo a mãe, foram motivos para a mudança de comportamento do adolescente, hoje com 22 anos. “Ele começou a faltar aula do estágio, perdeu o semestre, não tomava banho. Trocou o dia pela noite”, afirmou a mãe de Gabriel que não quis se identificar.
Ela já procurou tratamento para o filho em Barbacena-MG, Birigui-SP e em Uberlândia. “Hoje ele está em uma fase de estabilidade, apesar de não estar abstinente”, disse. “Ele já usou várias drogas: cocaína, crack, mas a fissura dele é pela maconha”. Gabriel foi internado sem o seu consentimento. “Não tive outra escolha”, disse a mãe, que também precisou se tratar de depressão.
No Centro de Atenção Psicossocial para Tratamento de Álcool e outras Drogas (Caps AD), dos 118 pacientes, 19 têm de 12 a 17 anos e, segundo a coordenadora e psicóloga Elaine Bordini Villar, diferentemente dos adultos, a procura por tratamento para os jovens não é espontânea. “O desejo que eles se tratem é sempre do outro, do pai, da mãe, do cuidador ou do juiz. Eles mesmos acham que não têm problema”, disse.
Diferentemente de Gabriel, a maioria destes jovens está fora da escola e tem histórico de repetência e evasão escolar. Ainda de acordo com a coordenadora, quando eles tentam retornar aos estudos, têm dificuldade de adaptação. “As instituições de ensino têm dificuldade de lidar com as diferenças, não estão preparadas para receber estes jovens”, disse Elaine Villar.
Imaturidade, dificuldade de aceitar limites, autoafirmação, fragilidade familiar e amizade são alguns dos motivos que levem ao vício, de acordo com ela. “É todo um contexto. Nessa idade, logicamente, eles são muito imaturos e ficam apaixonados pela droga, não conseguem enxergar os riscos. Grande parte dos adultos que se tratam aqui também começou o uso na adolescência”, afirmou a psicóloga.
Em sua maioria são jovens de classe social baixa, mas Elaine Villar já recebeu jovens de famílias de classe média alta. “Atendi um menino que estudou em escola particular e tinha uma mãe presente. Com 16 anos fazia pequenos furtos pela aventura de fazer o que é errado, porque dinheiro ele tinha.”
Crimes envolvendo jovens estão ligados a drogas
O promotor de Justiça da Infância e da Juventude da comarca de Uberlândia, Jadir Cirqueira de Souza, afirma que a maior parte dos jovens que chega ao seu gabinete tem de 14 a 17 anos, vai por intermédio da mãe, quase nunca pelo pai, e é pobre, de família fragilizada socialmente e desinformada. “As drogas atingem todas as camadas da sociedade, mas os ricos não nos procuram, pedem ajuda em clínicas particulares”, afirmou Cirqueira.
Ainda de acordo com o promotor, 90% dos crimes envolvendo jovens estão relacionados a entorpecentes. “Se não é tráfico, é roubo, geralmente para comprar drogas”, disse.Segundo levantamento da 9ª Região de Polícia Militar, do total de pessoas presas por tráfico de drogas até maio deste ano, 18% são menores de idade. No ano passado, neste mesmo período este número correspondia a 26% dos adultos.
Cirqueira afirma que os programas públicos que atendem a essa camada da sociedade são falhos e insuficientes, motivo pelo qual ele ajuizou uma ação pública contra o Município cobrando programas que se adaptam ao sistema de proteção psicossocial voltado ao combate das drogas. “Os jovens que são tratados no Caps devem representar 0,1% dos que precisam de ajuda. Só no dia 22 de junho, recebi sete jovens aqui”, afirmou.
O promotor trabalha nesta área há 19 anos e conta que, de todos os municípios pelos quais passou, somente os que trabalham com programas educativos de repreensão às drogas tiveram redução no número de jovens usuários. “Cidades como Uberlândia que trabalham com sistema punitivo não têm o número de usuários reduzido. Ação judicial e policial é uma parte imprescindível, mas é o que menos efeito produz”, disse o promotor.
Pai de família, o Cirqueira afirma que a participação dos pais na vida do jovem é ainda maior do que antigamente. “Os pais precisam saber que o filho é um sujeito, que precisa ter direito, ter voz, dizer o que sente, o que pensa, do que gosta. Ele tem deveres, mas direitos também”, afirmou.
Ainda de acordo com o promotor, 90% dos crimes envolvendo jovens estão relacionados a entorpecentes. “Se não é tráfico, é roubo, geralmente para comprar drogas”, disse.Segundo levantamento da 9ª Região de Polícia Militar, do total de pessoas presas por tráfico de drogas até maio deste ano, 18% são menores de idade. No ano passado, neste mesmo período este número correspondia a 26% dos adultos.
Cirqueira afirma que os programas públicos que atendem a essa camada da sociedade são falhos e insuficientes, motivo pelo qual ele ajuizou uma ação pública contra o Município cobrando programas que se adaptam ao sistema de proteção psicossocial voltado ao combate das drogas. “Os jovens que são tratados no Caps devem representar 0,1% dos que precisam de ajuda. Só no dia 22 de junho, recebi sete jovens aqui”, afirmou.
O promotor trabalha nesta área há 19 anos e conta que, de todos os municípios pelos quais passou, somente os que trabalham com programas educativos de repreensão às drogas tiveram redução no número de jovens usuários. “Cidades como Uberlândia que trabalham com sistema punitivo não têm o número de usuários reduzido. Ação judicial e policial é uma parte imprescindível, mas é o que menos efeito produz”, disse o promotor.
Pai de família, o Cirqueira afirma que a participação dos pais na vida do jovem é ainda maior do que antigamente. “Os pais precisam saber que o filho é um sujeito, que precisa ter direito, ter voz, dizer o que sente, o que pensa, do que gosta. Ele tem deveres, mas direitos também”, afirmou.
Curiosidade própria da idade é um dos motivos que levam ao uso de drogas
Falta figura de pai para os menores
No Centro Sócio Educativo de Uberlândia (Ceseu), dos 119 jovens internos com idades entre 12 e 17 anos, de 60% a 70% são criados pelos avós e o restante são filhos de mães separadas ou solteiras, segundo levantamento do Comissariado de Menores. “Vai desvinculando o sentido de família e isso é um agravante, porque, como os jovens do Ceseu são homens, eles não têm a presença paterna. Tem só a mãe que precisa trabalhar e os deixam sozinhos, à mercê do destino”, afirmou Célia Firmino de Menezes, comissária de Justiça da Infância e Juventude.
De todos os meninos, uma média de 90% já fez uso de maconha ou tabaco, 30% já usaram crack e uma minoria assume ter usado álcool. Entre as infrações, como homicídio, tráfico, estupro, a maioria dos jovens, cerca de 90%, foi aprendida por roubo ou furto.“Geralmente isso é para sustentar o vício. Já vi casos de traficante matar por causa de R$ 8”, disse a comissária.
Grande parte destes meninos fez uso de alguma substância psicoativa a partir dos 9 anos, por intermédio de um vizinho ou parente. De com acordo Elaine Firmino, as famílias as quais eles pertencem são de baixa renda e recebem até dois salários mínimos. “Nessa idade, eles querem um boné, um tênis e por isso furtam e traficam. Estão encantados, partindo para a fase adulta, mas ainda são crianças. Os meninos que vejo têm dois extremos, ou tímidos demais ou muito agressivos.”
Ainda segundo a comissária, é frequente a reincidência no Ceseu, onde os meninos podem permanecer entre 45 dias e 3 anos, dependendo da gravidade da infração. “As mães não conseguem controlar em casa e eles pedem limites”, afirmou.
Para Firmino, nestes casos é preciso tratar a família inteira, para se adequar e receber o filho que passou por reabilitação.“Tem que despertar também para o lado da saúde. A dependência química é genética. A pessoa nasce com propensão para usar, ou porque o pai bebe, ou para acobertar uma outra doença, um trauma, uma timidez”, disse a comissária.
De todos os meninos, uma média de 90% já fez uso de maconha ou tabaco, 30% já usaram crack e uma minoria assume ter usado álcool. Entre as infrações, como homicídio, tráfico, estupro, a maioria dos jovens, cerca de 90%, foi aprendida por roubo ou furto.“Geralmente isso é para sustentar o vício. Já vi casos de traficante matar por causa de R$ 8”, disse a comissária.
Grande parte destes meninos fez uso de alguma substância psicoativa a partir dos 9 anos, por intermédio de um vizinho ou parente. De com acordo Elaine Firmino, as famílias as quais eles pertencem são de baixa renda e recebem até dois salários mínimos. “Nessa idade, eles querem um boné, um tênis e por isso furtam e traficam. Estão encantados, partindo para a fase adulta, mas ainda são crianças. Os meninos que vejo têm dois extremos, ou tímidos demais ou muito agressivos.”
Ainda segundo a comissária, é frequente a reincidência no Ceseu, onde os meninos podem permanecer entre 45 dias e 3 anos, dependendo da gravidade da infração. “As mães não conseguem controlar em casa e eles pedem limites”, afirmou.
Para Firmino, nestes casos é preciso tratar a família inteira, para se adequar e receber o filho que passou por reabilitação.“Tem que despertar também para o lado da saúde. A dependência química é genética. A pessoa nasce com propensão para usar, ou porque o pai bebe, ou para acobertar uma outra doença, um trauma, uma timidez”, disse a comissária.
Pai não acha que filho se recupera
Na porta do Ceseu, o aposentado Adalto (nome fictício) espera sua vez para visitar o filho caçula de 14 anos, apreendido por tráfico de drogas. Na mão do pai, um saco com bananas, livros e cartas dos três irmãos mais velhos, todos formados em curso superior. Um deles, mestre pela Universidade Estadual de Campinas. “Trouxe as cópias dos diplomas para mostrar para a psicóloga e ninguém duvidar de mim. Sou um pai carinhoso, meus filhos são bons, mas hoje em dia está difícil. Os maconheiros vão para a porta da minha casa e, como ele é menor, pagou o pato”, afirmou o aposentado.
O menino, que está no 7º ano do ensino fundamental, foi preso há 10 dias no bairro Morumbi e, segundo o pai, além de traficar, consome drogas. “Tenho fé que ele melhore, mas do jeito que está desobediente é mais fácil ir para cadeia do que voltar para escola”, afirmou.
Segundo Adalto, tudo começou depois que se mudou com a família para o bairro Morumbi, zona Leste da cidade, há cerca de sete anos. Na esperança de reverter a situação do filho, o aposentado está de mudança para o bairro Segismundo Pereira, antes que o filho saia do Ceseu. “O advogado falou que em 40 dias ele sai e quero já estar longe daquele lugar”, disse.
Jovens pedem dinheiro para sustentar o vício
Em um semáforo da cidade, os amigos Jonas e Alísson tiram seu sustento. O dinheiro, também conseguido ao vigiar carros na rua, vai todo para a compra de crack. “Comida ninguém nega, mas droga só dão quando querem viciar a gente. Depois que se vicia, só querem te vender”, disse Jonas, de 22 anos. “Gasto uns R$ 35 por dia com sete pedras”, afirmou Alísson, de 19 anos.
Apesar de já terem atingido a maioridade, os dois rapazes são usuários de droga desde a adolescência. O consumo do crack aconteceu depois de terem saído de casa e ido morar na rua, há cerca de dois anos. Eles contam que dormem em uma casa abandonada, onde além de consumir droga, conversam sobre o futuro. “Essa noite eu até falei para ele, o que vai ser da gente daqui um tempo. Tenho uma filha de 5 anos e olha o exemplo que estou dando para ela”, afirmou o mais velho que já foi preso três vezes e diz vir de uma família estruturada e que saiu de casa por vontade própria.
Alísson conta que saiu da casa da mãe depois de uma discussão com o padrasto. “Eles bebem muito. Um dia, ele bateu nela, entrei no meio e bati nele. Ela disse que nós dois não podíamos morar na mesma casa. Então, saí e aqui fora acabou minha vida”, afirmou o jovem que não conheceu o pai, já estudou inglês, informática e sonha com um futuro melhor. “Tenho vontade de ter uma esposa, filhos, um carro, mas nem minha mãe me quis”, disse ele. “Outra hora penso que posso amanhecer morto.”
Ambos afirmam ter experimentado crack por curiosidade e por incentivo de colegas. Também não negam que já roubaram para comprar a droga. “Tem hora que as pessoas dão bobeira, pedem para serem roubadas. Penso: isso aqui dá para comprar tantas pedras e pego. Quem está nessa e fala que não rouba, é mentira”, disse Jonas. “As pessoas viram as costas para gente. Somos maltratados, principalmente pela polícia. A culpa é da minha mãe e minha também. Eu escolhi assim”, disse o mais novo.
Fase é propícia a novas experiências
Os adolescentes passam por um processo de transição do estado infantil para o adulto, quando são cobrados pela sociedade sobre os caminhos que seguirão. É quando também encontram novas atividades de lazer, buscam por modelos de identidade, a aceitação do grupo onde estão inseridos e fazem a escolha profissional. “Apresenta-se ao jovem um novo estilo de vida”, disse a psicóloga Natália Fontes Caputo de Castro que trabalha com adolescentes dependentes químicos e com outras compulsões.
Segundo a profissional, é neste período que o adolescente se torna vulnerável a vários tipos de experimentação, entre elas, as drogas. “E quanto mais cedo experimentarem substâncias psicoativas, maior o risco de se tornarem usuários e dependentes químicos”, disse.
Sobre bebidas alcoólicas, a especialista fala de um estudo feito pelo governo federal, realizado em 2007, o primeiro levantamento nacional sobre o padrão de consumo de uso de álcool no País. Dentre a população geral, 14 milhões de adolescentes, entre 14 e 17 anos, foram ouvidos, dos quais 35% consomem bebidas alcoólicas uma vez no ano e 24% fazem uso mensalmente. “Esse dado é muito alto quando falamos de jovens”, disse a psicóloga.
Para a profissional, os motivos da dependência química são multifatoriais, como genética, hereditariedade, social, psicossocial e influências do meio de comunicação, entre outros. “Há relatos de pessoas que usam maconha uma única vez e desenvolvem um surto de esquizofrenia. A pessoa já tem um núcleo psicótico que não sabia que existia e a maconha, diferentemente do que se fala, é droga e vicia”, afirmou.
Para a psicóloga, a prevenção deve iniciar com crianças de 10 anos, inclusive para drogas lícitas, como o álcool e o tabaco. “Eles já deveriam entender sobre esses riscos desde cedo. Talvez não se falando diretamente sobre o assunto, mas ensinando o que é uma vida prazerosa, sem vícios. Deve ter um conjunto de ações”, disse a especialista.
Correio de Uberlândia
Enquanto pensar somente no tratamento dos menores e esquecer profundamente um tratamento para as pessoas que operam o sistema estaremos "tampando o sol com a peneira"
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