Em “Chico Xavier”, o filme que conta a história do médium mais famoso do Brasil, em cartaz desde ontem nos cinemas do país, a atriz Christiane Torloni vive Glória, uma mãe que perdeu o filho, assassinado acidentalmente por um amigo. Infelizmente, Christiane conhece bem essa dor, e não só da ficção. Seu filho Guilherme morreu aos 12 anos, em um acidente com o carro que Christiane dirigia. Hoje, quase 20 anos depois, ela se firmou como uma das atrizes de maior destaque da televisão brasileira. Mas diz que chegou a pensar em desistir da carreira enquanto enfrentava os primeiros momentos do luto. “Se meu instrumento de trabalho é o coração, como eu iria trabalhar com o coração despedaçado?”. Mas como é possível se recuperar de uma tragédia dessas? “Você tem de aprender a viver de novo sem um pedaço de você”, diz Christiane, que empresta a própria garra a seus personagens, sempre marcados pela persistência e pela força. Reservada, Christiane raramente fala sobre a perda do filho. Mas aceitou contar ao Mulher 7×7 , de sua casa, no Rio de Janeiro, sua história de superação.
Após a morte do filho, em 1991, Christiane e Leonardo, irmão gêmeo de Guilherme, fecharam-se em um auto-exílio em Portugal. O país despertara a curiosidade de Guilherme alguns meses antes do acidente, quando a mãe fora divulgar a novela Kananga do Japão. Com a morte de Guilherme, Christiane sentiu que lá era o lugar em que deveria “aprender a viver sem um pedaço”. Nos três anos em que passou além-mar, dedicou-se ao teatro em Portugal e veio ao Brasil para gravar a minissérie “Noivas de Copacabana”. Quando decidiu voltar definitivamente ao Brasil, aceitou um papel que era, no mínimo, um desafio: viver a Dinah, de “A Viagem”. A novela de Ivani Ribeiro, baseada no espiritismo, conta a história de um casal que morre e volta a se encontrar em outro plano. “Se eu não estivesse recuperada, não teria conseguido fazer a novela. Mas a dor de perder um filho não passa nunca. Já faz muito tempo e a única coisa que mudou foi a minha capacidade de lidar com a dor.”
E como é que se faz isso? “Você quer que eu lhe dê uma bula! Isso não existe”, diz Christiane com a voz firme, aquela que eu conheço de suas personagens cheias de determinação das novelas. Mas, quando sua memória parece tocar aqueles primeiros dias de coração despedaçado, como ela diz, sua voz se abranda. Tem o tom de resignação que só alguém que mergulhou em sua própria dor pode ter. “É preciso ser humano”, diz. “Ter paciência com o tempo, com você, com a dor. Isso é ser humano. Mas as pessoas não se dão mais esse direito.” Leia a entrevista na íntegra a seguir.
Mulher 7×7 – Perder um filho é uma das piores dores que um ser humano pode enfrentar. Como você conseguiu se refazer dessa tragédia?
Christiane Torloni – Uma mãe que perde um filho ficará para sempre de luto. Não existe ex-mãe. Vai fazer 20 anos que o Guilherme morreu. É muito tempo. Mas a única coisa que mudou foi a minha capacidade de lidar com a dor. Você precisa continuar vivendo, dia após a dia, lutar para vencer um de cada vez. É a mesma filosofia dos Alcoólicos Anônimos: “só por hoje”.
Muitas pessoas que perderam um ente querido dizem se sentir um peso para os amigos e para a família porque não podem mais falar sobre o assunto para não chatear ninguém. Você sentiu isso?
Existe muito essa cultura do “vamos lá, vamos para frente”. Mas é preciso respeitar essa pessoa porque ela está em dor. Chega a ser uma dor física. Precisamos ter paciência com a avalanche de emoções que se seguirão para se adaptar a um coração que nunca mais vai ser o mesmo. E o ser humano tem passado por cima dessa necessidade de se recolher, não quer ficar triste. Mas é dessa dor que vai vir a força para superar. Não se aprende só na alegria, mas também com a dor. Nesse momento, temos de ser humanos: ter paciência com o tempo, com você, com a dor. Isso é ser humano. Mas as pessoas não se dão mais esse direito.
E você conseguiu se dar esse direito?
Eu saí do Brasil, mudei para Portugal com o meu filho Leonardo. Entrei em uma viagem profunda, me respeitei. Fiz aquilo que os antigos faziam: encarei dar tempo ao tal do tempo. Ele é um remédio quando a gente tem paciência. Isso foi me dando força a voltar a trabalhar. Enquanto eu ainda morava em Portugal, voltei para fazer uma participação na minissérie “Noivas de Copacabana”, mas não foi legal. Eu ainda não estava bem. Estava em dúvida se continuaria sendo atriz. Se meu instrumento de trabalho é o coração, como eu iria trabalhar com o coração despedaçado?
Como você decidiu seguir com a carreira?
Algumas pessoas que aparecem nas nossas vidas são como anjos. O Boni (José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, então um dos diretores da TV Globo) ficava me monitorando para saber se estava tudo bem, quando eu gostaria de voltar. A TV Globo me mandava cartas de pessoas que me escreviam e que tinham passado pela mesma experiência. Recebi até cartas psicografadas dizendo para eu não desistir. Eu fui para Portugal para ficar sozinha, mas, no fundo, eu não estava sozinha. Uma rede amorosa se formou em volta de mim. Quando Wolf Maia me convidou para participar de “A Viagem”, eu decidi aceitar antes de saber sobre o que era. Fazer a novela foi muito difícil, mas eu consegui porque havia transformado aquela dor.
Qual conselho você dá para uma pessoa que está passando por esse momento agora?
O melhor conselho é continuar vivendo. Tenha calma e vá sobrevivendo. Essa entrevista, por exemplo, não é para me promover. É porque ela pode ser útil para alguém, pode ajudar alguém. É por isso que eu também aceitei fazer o filme sobre o Chico Xavier.
Após a morte do filho, em 1991, Christiane e Leonardo, irmão gêmeo de Guilherme, fecharam-se em um auto-exílio em Portugal. O país despertara a curiosidade de Guilherme alguns meses antes do acidente, quando a mãe fora divulgar a novela Kananga do Japão. Com a morte de Guilherme, Christiane sentiu que lá era o lugar em que deveria “aprender a viver sem um pedaço”. Nos três anos em que passou além-mar, dedicou-se ao teatro em Portugal e veio ao Brasil para gravar a minissérie “Noivas de Copacabana”. Quando decidiu voltar definitivamente ao Brasil, aceitou um papel que era, no mínimo, um desafio: viver a Dinah, de “A Viagem”. A novela de Ivani Ribeiro, baseada no espiritismo, conta a história de um casal que morre e volta a se encontrar em outro plano. “Se eu não estivesse recuperada, não teria conseguido fazer a novela. Mas a dor de perder um filho não passa nunca. Já faz muito tempo e a única coisa que mudou foi a minha capacidade de lidar com a dor.”
E como é que se faz isso? “Você quer que eu lhe dê uma bula! Isso não existe”, diz Christiane com a voz firme, aquela que eu conheço de suas personagens cheias de determinação das novelas. Mas, quando sua memória parece tocar aqueles primeiros dias de coração despedaçado, como ela diz, sua voz se abranda. Tem o tom de resignação que só alguém que mergulhou em sua própria dor pode ter. “É preciso ser humano”, diz. “Ter paciência com o tempo, com você, com a dor. Isso é ser humano. Mas as pessoas não se dão mais esse direito.” Leia a entrevista na íntegra a seguir.
Mulher 7×7 – Perder um filho é uma das piores dores que um ser humano pode enfrentar. Como você conseguiu se refazer dessa tragédia?
Christiane Torloni – Uma mãe que perde um filho ficará para sempre de luto. Não existe ex-mãe. Vai fazer 20 anos que o Guilherme morreu. É muito tempo. Mas a única coisa que mudou foi a minha capacidade de lidar com a dor. Você precisa continuar vivendo, dia após a dia, lutar para vencer um de cada vez. É a mesma filosofia dos Alcoólicos Anônimos: “só por hoje”.
Muitas pessoas que perderam um ente querido dizem se sentir um peso para os amigos e para a família porque não podem mais falar sobre o assunto para não chatear ninguém. Você sentiu isso?
Existe muito essa cultura do “vamos lá, vamos para frente”. Mas é preciso respeitar essa pessoa porque ela está em dor. Chega a ser uma dor física. Precisamos ter paciência com a avalanche de emoções que se seguirão para se adaptar a um coração que nunca mais vai ser o mesmo. E o ser humano tem passado por cima dessa necessidade de se recolher, não quer ficar triste. Mas é dessa dor que vai vir a força para superar. Não se aprende só na alegria, mas também com a dor. Nesse momento, temos de ser humanos: ter paciência com o tempo, com você, com a dor. Isso é ser humano. Mas as pessoas não se dão mais esse direito.
E você conseguiu se dar esse direito?
Eu saí do Brasil, mudei para Portugal com o meu filho Leonardo. Entrei em uma viagem profunda, me respeitei. Fiz aquilo que os antigos faziam: encarei dar tempo ao tal do tempo. Ele é um remédio quando a gente tem paciência. Isso foi me dando força a voltar a trabalhar. Enquanto eu ainda morava em Portugal, voltei para fazer uma participação na minissérie “Noivas de Copacabana”, mas não foi legal. Eu ainda não estava bem. Estava em dúvida se continuaria sendo atriz. Se meu instrumento de trabalho é o coração, como eu iria trabalhar com o coração despedaçado?
Como você decidiu seguir com a carreira?
Algumas pessoas que aparecem nas nossas vidas são como anjos. O Boni (José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, então um dos diretores da TV Globo) ficava me monitorando para saber se estava tudo bem, quando eu gostaria de voltar. A TV Globo me mandava cartas de pessoas que me escreviam e que tinham passado pela mesma experiência. Recebi até cartas psicografadas dizendo para eu não desistir. Eu fui para Portugal para ficar sozinha, mas, no fundo, eu não estava sozinha. Uma rede amorosa se formou em volta de mim. Quando Wolf Maia me convidou para participar de “A Viagem”, eu decidi aceitar antes de saber sobre o que era. Fazer a novela foi muito difícil, mas eu consegui porque havia transformado aquela dor.
Qual conselho você dá para uma pessoa que está passando por esse momento agora?
O melhor conselho é continuar vivendo. Tenha calma e vá sobrevivendo. Essa entrevista, por exemplo, não é para me promover. É porque ela pode ser útil para alguém, pode ajudar alguém. É por isso que eu também aceitei fazer o filme sobre o Chico Xavier.
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