segunda-feira, 22 de junho de 2009

Midia digital abre um dos países mais fechados do mundo





Twitter , YouTube e Facebook ajudam iranianos a expor a situação do país

Na Revolução Islâmica do Irã, em 1979, todo o resto do mundo, incluindo os países vizinhos de Teerã, acompanhavam os relatos apenas por redes de TV e jornalistas que estavam presentes no país onde o xá era derrubado para a subida dos aiatolás. Nesta época, sequer existia a TV a cabo. Cada lugar do mundo assistia ao noticiário em uma de suas redes nacionais ou lia o que acontecia de manhã na sua própria língua. A chance de um iraniano no Canadá ajudar na organização de uma manifestação na Universidade de Teerã era nula.

Mesmo dentro do Irã, o movimento se dava na rua, no boca a boca ou, em alguns casos, no máximo pelo telefone. Mas é preciso lembrar que o ano era 1979. Os telefones eram todos fixos e muitas casas ainda não possuíam um aparelho.

Hoje, um ano depois da campanha eleitoral via internet de Barack Obama, assistimos a um movimento popular se levantando contra o resultado de uma eleição no Irã. Diferentemente de 30 anos atrás, a nova geração se comunica via Twitter, Facebook, YouTube, e-mail e diversas outras vias que as colocam em contato também com iranianos na diáspora em Los Angeles ou em Long Island, além de poder enviar fotos e vídeos em tempo real para redes de TV. Muitas vezes, sem essas pessoas nem se conhecerem.

Hoje, as imagens que são exibidas em TVs do mundo todo não são apenas das grandes redes de TV, como CNN, BBC e mesmo Al-Jazeera. São de jovens iranianos que estão no centro das manifestações que usam os seus celulares para filmar, colocar as imagens no YouTube, postam links no Twitter e, imediatamente, centenas de pessoas ao redor do mundo assistem às cenas de repressão do regime iraniano. Por mais que o governo tente censurar a imprensa escrita e as TVs, as imagens chegam a outras partes do mundo.

Claro, sabendo disso, o regime do Irã tenta bloquear estes sites, como já acontece em outros países do Oriente Médio. Na Síria, onde impera um regime autoritário com poucas liberdades democráticas, o Facebook e o YouTube eram bloqueados. Ao digitar o endereço eletrônico destes sites, imediatamente aparece uma página do Ministério da Informação. O mesmo vale para páginas de partidos de oposição ou de jornais libaneses contrários ao regime de Damasco - os de Israel, ironicamente, são liberados. A Turquia, apesar de ser uma democracia, também restringe o acesso ao YouTube. Países do Golfo Pérsico, como Emirados Árabes e Arábia Saudita, são outros que impõem uma série de restrições, como a China.

O problema é que os jovens são bem mais avançados do que os censores. Em um café em Damasco, questionei um jovem sírio ao meu lado com Facebook aberto como ele havia conseguido entrar no site se havia censura. Ele deu um sorriso e me direcionou para um endereço alternativo por onde poderia facilmente acessar o site. Há atalhos para tudo: YouTube, Skype e qualquer outra forma de comunicação.

Os governos, desta forma, perderam o controle total sobre o que a sua população faz. Mais complicado, os serviços de inteligência não têm capacidade de monitorar todo tráfego de informações no Twitter ou no Facebook. Não dá sequer para saber o nome da pessoa que postou uma informação, porque elas usam apelidos e, assim, despistam os censores.

Agora, justamente em um dos países mais fechados do mundo, como o Irã, acontece um dos mais inovadores usos da tecnologia para combater o governo. Claro, seria muito difícil que isso ocorresse em uma democracia como os EUA. O certo é que a Casa Branca já percebeu o poder do Twitter e do Facebook, a ponto de Barack Obama pedir para que os reparos no site fossem adiados para não interromper o fluxo de informações.

Porém, como notou a rede de TV Al-Jazeera Internacional, quem usa essas tecnologias faz parte de uma classe média iraniana. Não são muito diferentes de jovens do Upper West Side, de Orange County, dos Jardins, do Leblon ou da Recoleta. Possuem uma proximidade maior com habitantes desta classe social. A dúvida, colocada pela rede de TV, é até que ponto esta tecnologia consegue atingir as áreas mais isoladas do Irã, onde grande parte da população sequer sabe o que é e-mail. Eles ainda estão em 1979.

Chiapas, México
O Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) e seu líder, o Subcomandante Marcos, chamaram a atenção do mundo a partir de 1994 quando decidiram abdicar da luta armada para fazer uma revolução midiática contra o governo mexicano. Foi o primeiro movimento a se abrir para internet e, assim, ganhou apoiadores em todo o mundo, divulgando em seu site a condição de exploração agrária dos indígenas de Chiapas, a região mais pobre do México. Logo, ONGs e até mesmo músicos começaram a defender a causa do EZLN, como o cantor francês Manu Chao e a banda Rage Against The Machine, que tinha à frente o cantor-ativista de origem mexicana, Zack de La Rocha. O apoio espalhou ainda mais o movimento de Chiapas pela rede e mostrou o lado contraditório da globalização e do neoliberalismo.

Atenas, Grécia
A morte de um garoto baleado por um policial deu início a uma série de protestos na Grécia em dezembro de 2008. Pela internet, as manifestações se espalharam pela Europa. Sites criados por manifestantes gregos divulgavam data e local de protestos. As informações eram passadas adiante via SMS, posts em blogs e no Twitter. Manifestantes também twittavam sobre a repressão policial durante as ações, que chegaram a tomar as ruas de quase 20 países.

Mianmar
Vítima de um regime militar desde 1962, a antiga Birmânia experimentou eleições livres em 90. O partido da mártir democrata Aung San Suu Kyi ficou com a maioria dos votos. Mas o resultado foi anulado, e a ditadura aumentou a violência com que tratava os manifestantes. Na web, os abusos cometidos no país são disseminados pela U.S. Campaign for Burma, uma ONG que defende a liberdade de expressão no país. Pelo Twitter, celebridades como @stephenfry e @KevinSpacey mostraram apoio à causa.

Lhasa, Tibete
Em março de 2008, a China se preparava para a Olimpíada de Pequim e dizia estar tudo sob controle no Tibete. Enquanto isso, no YouTube circulavam vídeos de protestos nas ruas da capital Lhasa sendo reprimidos de forma violenta. A informação que trafegava via internet gerou uma série de outros protestos, ao redor do mundo, durante a jornada da tocha olímpica rumo a Pequim. Em 2009, a China censurou o site perto da data que marca o aniversário de 50 anos do levante na região.

Berlim, Alemanha
Na quinta (18), 300 manifestantes se reuniram diante do Parlamento alemão para protestar contra uma lei, aprovada no mesmo dia, que obriga servidores de internet a bloquear o acesso a sites de pedofilia. O debate gira em torno, principalmente, de uma lista secreta de endereços a serem bloqueados que será transmitida a provedores diariamente. Organizações de proteção dos direitos civis alertam para o risco da introdução de um mecanismo de filtro e censura, que pode se estender a outros temas.

Seattle, EUA
Em novembro de 1999, quando a Organização Mundial do Comércio realizou mais um de seus encontros em Seattle, nos EUA, manifestantes se reuniram para protestar pacificamente contra as decisões trabalhistas da entidade. A tropa de choque não reagiu da mesma forma e entrou em confronto com os manifestantes. Mas a cobertura da CNN, mostrando imagens do choque entre os dois lados, anunciava que a polícia só começou a agir de forma violenta após os protestos terem fugido de controle - o que não aconteceu. Com câmeras de vídeo, os participantes puderam provar que a polícia bateu antes. As imagens rodaram o mundo via web num site nascido ali mesmo e que até hoje é sinônimo de ativismo digital, o Indymedia. O evento ficou conhecido como "a batalha de Seattle" - e a CNN teve de voltar atrás.

Gustavo Chacra



Estadão

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