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terça-feira, 23 de junho de 2009
Menores que vivem na rua estão entre as vítimas mais vulneráveis do crack
Brasília - Crianças com problemas de dependência química participam de atividades promovidas pela ONG Transforme, como oficinas de origami
Brasília - Embora o crack esteja disseminado entre todas as classes sociais, para crianças e adolescentes o consumo nem sempre é uma opção, mas um meio de sobrevivência. Para resgatar a juventude desses meninos e meninas, organizações não-governamentais (ONG) investem na educação e ressocialização dos menores.
“A droga faz parte de quem está na cultura da rua. A gente percebe que, na rua, a maior parte das crianças e adolescentes não é dependente, eles fazem uso mais circunstancial”, afirma Cecília Motta, coordenadora do Projeto Quixote, que atua há 13 anos na Estação da Luz, zona central da cidade de São Paulo, conhecida também como Cracolândia.
Muitas crianças e adolescentes deixam os bairros de origem e vão em direção ao centro da cidade em busca de aventura. Para a coordenadora, esses “refugiados urbanos” querem se distanciar de situações insuportáveis, como a violência doméstica.
Em Brasília, a situação não é diferente. Grande parte das crianças e adolescentes de rua da capital está concentrada na rodoviária, no centro da cidade.
Em Curitiba, o consumo de crack também tem crescido entre crianças e jovens. “A região mais crítica é a central. São crianças de muito pouca idade que viraram soldados-zumbis do tráfico. Elas ficam na esquina dia e noite comercializando as pedras para sustentar seu próprio consumo”, afirma o secretário municipal Antidrogas, Fernando Destito Francischini.
As ONGs que tratam desses jovens apostam no acompanhamento clínico, pedagógico e social.
No Projeto Quixote, o tratamento é feito em três etapas: abordagem, abrigamento e ressocialização familiar. "À medida que eles vão se vinculando e vão participando das oficinas lúdicas e pedagógicas, eles abandonam a droga com muita tranquilidade. Não temos dúvida de que criança quer brincar. Criança que empina pipa não pipa pedra”, diz Cecília.
Na capital federal, em uma casa com amplo espaço verde e ambiente tranquilo no Lago Norte, região residencial de classe alta, crianças com problemas de dependência química participam de atividades da ONG Transforme.
Em uma tarde, durante visita da Agência Brasil ao local, Alex, 14 anos, e Luís, 12, faziam origami sob a supervisão de uma moça que demonstrava paciência e calma. “Eu já fumei [crack]”. “Eu também, mais de cem vezes”, afirmam.
Segundo os meninos, praticamente a metade das crianças e adolescentes que vivem na rodoviária – localizada no início da Esplanada dos Ministérios – usam crack. “ Dos 25 que vivem lá com até 16 anos, 12 fumam”, conta Alex. “Fumei a primeira vez com 11 anos. É fácil conseguir”, lembra Luis.
Alex, o mais falante da dupla, afirma que ao terminar o tempo de internação na TransForme pretende concluir os estudos até se formar em medicina. “Eu parei de estudar na 3ª série. Pelas minhas contas, faltam uns 15 anos para eu me formar. Mas não estou com pressa, não vou desistir do meu sonho”, afirma, enquanto monta um cubo de papel alaranjado.
A psicóloga Rosimere Nere, que acompanha a aula de origami, diz que as crianças de rua tendem a demonstrar habilidades que não são percebidas por meio da educação formal, já que estão fora da escola. Uma espécie de criatividade desenvolvida pelo ócio.
"O traço marcante é a arte, a habilidade. O que precisa é fazer com que eles entendam que essa criatividade pode ser canalizada para coisas importantes e positivas”, afirma.
Durante a aula de educação física, o professor Douglas Antunes afirma que o mais difícil é impor regras. Por terem vivido a maior parte da vida na rua, as crianças têm dificuldade em se adequar. “Às vezes, reclamam, dizem que vão embora, que não querem ficar e obedecer. Eu digo 'Você acha que me emociona? Lá você vai dormir no chão e passar frio. Aqui tem piscina, aula de informática e seis refeições por dia. Pode ir se quiser'. A escolha é deles.”
Crianças e adolescentes das ruas do Brasil começaram a fumar crack no fim da década de 1980, especialmente nos estados da regiões Sul e Sudeste. Pesquisas do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid) apontaram aumento no consumo em sondagens realizadas em 1987, 1989, 1993, 1997 e 2004.
Mariana Jungmann*
* Todos os nomes de usuários de crack, ex-usuários, jovens e crianças desta reportagem especial são fictícios // Colaboraram Daniella Jinkings e Lúcia Norcio
Agência Brasil
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