A personagem da novela da TV Globo tem provocado polêmica por interpretar uma pequena vilã aos 8 anos de idade. Entenda a discussão e veja como lidar com as crianças consideradas difíceis, que tiram qualquer pai ou mãe do sério
Se você assiste à novela Viver a Vida, da TV Globo, já deve ter visto as cenas da menina Rafaela (interpretada pela atriz Klara Castanho, 8 anos, e filha de Dora, personagem de Giovanna Antonelli). A garota tem sido considerada uma “pequena vilã” na novela, o que vem causando polêmica. O Ministério Público chegou a notificar o autor, Manoel Carlos, pedindo mudança no comportamento da personagem ao alegar que “nem todas as manifestações artísticas são passíveis de serem exercidas por crianças e adolescentes”.
Polêmicas à parte, a verdade é que existem muitas crianças consideradas difíceis, assim como Rafaela. Geralmente, são aquelas que se irritam facilmente, dão escândalos e têm um comportamento hostil, fazendo muitas vezes você até perder a cabeça.
Crianças que reagem assim exigem uma dose a mais de paciência dos pais. Criar filhos é uma eterna descoberta de sensibilidades. É como conhecer qualquer pessoa. Você vai convivendo, sentindo o que a agrada, do que ela não gosta tanto, o que a deixa nervosa ou irritada, o que a deixa contente ou relaxada. Só que, vez ou outra, vem aquele berro, aquele tapa na sua barriga, uma cara enfezada, uma braveza que você não entende onde pode ter nascido! Haja a tal paciência. E essa virtude, sabemos, é artigo um tanto raro entre os pais de hoje. Por inúmeros fatores: a correria de ter de administrar pressões de trabalho e filhos, o ritmo frenético da cidade grande, a saudade e a culpa por não estar gastando tanto tempo quanto gostariam com as crianças. Você alguma vez já teve um embate com seu filho a ponto de desejar que a segunda-feira chegasse logo para você correr para o trabalho? Sim? Não se culpe. Sentir raiva ou simplesmente não querer lidar com aquilo naquele momento é normal. Muito normal.
Culpa de quem
Mas será que essas situações fazem com que os pais amem menos os filhos em determinados momentos? "Sentimentos vêm e vão, variações afetivas são normais. Os pais não devem se apegar ao que não podem controlar. No entanto, eles devem se culpabilizar, sim, em como refletem esse sentimento no trato com os filhos", diz Yves de La Taille, professor do Instituto de Psicologia da USP. É aquele conceito básico: pode sentir raiva, mas não precisa bater. Quando os pais se permitem sentimentos ruins podem entender melhor e elaborar uma forma mais saudável de vivenciar os conflitos. "Bom pai ou boa mãe não é ser alguém amoroso com os filhos 24 horas. É ser justo, generoso, respeitoso, educando sempre", afirma Yves. Ufa.
Especialista em casal e família, a terapeuta Daniela da Rocha Paes Peres acredita que o mais relaxante para os pais é evitar a sensação de derrota. "Esse sentimento de raiva, de achar que não gosta mais dos filhos é o ápice de uma crise. Mas não quer dizer que a partida está terminada, que você não o ama mais. Este é o ponto de parar e retornar ao equilíbrio. E, a partir daí, procurar uma solução."
Para ela, a criança difícil pode estar sinalizando justamente o que não vai bem dentro de casa. "Por vezes, é uma forma mais pungente de pedir atenção, amor. Outras, um desafio à autoridade dos pais." Ela não nega que pode ser uma característica da criança. Pois este é justamente o ponto principal para a educadora norte-americana Mary Sheedy Kurcinka, de Minnesota. Diretora do Parent Child Help, um serviço para atendimento a pais, é autora de best-sellers como Raising Your Spirited Child (algo como Educando seu Filho Impetuoso). Esta tradução livre talvez tenha pouca importância aqui. O interessante é o significado. Kurcinka usa o termo para denotar essa característica, atribuindo-a, inclusive, à variação genética de cada pessoa. Dessa forma, entende que ela deve ser, acima de tudo, compreendida. E que chegar a este ponto é o melhor para todos. Inclusive para o bem-estar dos pais. "Quando começar a ficar chateado, distancie-se do problema ou respire fundo. Diga a si mesmo: ‘Meu filho está perdendo a calma, mas eu não tenho de perder também’", diz Mary Kurcinka (veja mais em entrevista na página seguinte).
O outro
De qualquer interpretação, o "conselho" é um só: ouça a criança. Mas ouça de verdade, com calma. Algumas vezes, terá de ler na criança o que ela não consegue dizer, interpretar mesmo. Ela talvez não consiga explicar, mas sempre dá pistas. Pois seja por razão genética, seja por um comportamento temporário ou por falta de limites, são os pais que irão ensinar a criança como ela deve lidar com os sentimentos de rejeição, raiva, irritabilidade e outros conflitos inerentes a qualquer passagem pelo planeta Terra. É papel dos pais ensinar os filhos "difíceis" a lidar com suas próprias características, para serem socialmente possíveis.
"Os pais têm de conhecer o estilo da criança. Entender, aceitar, flexibilizar as expectativas e, quem sabe, modificar. É aprender a conviver com eles, pois padrão de educação não existe mesmo. Cada família tem seu jeito de impor regras. Não compare a sua com outras", afirma a psicóloga Simone Savaya.
Isto e aquilo
Quando se trata de uma criança com comportamento hostil, daquelas que dão trabalho mesmo, show em público, é fácil colocar aquele monte de adjetivos. "Ela é assim mesmo", "não pára quieta", "é difícil de lidar". "O ato de rotular deve ser evitado, principalmente porque crianças mudam", diz Yves de La Taille. Rotular pode ser até perigoso. "Criança se apega demais ao que é dito a ela. Se incorporar, pode fazer do adjetivo, realidade."
Apontar somente os pontos negativos da criança não é bom para ninguém nessa história. Fica aquele ciclo de pensamentos ruins, ar de fracasso, ar de que não dá para ser de outro jeito. Resultado: a criança fica mal e os pais, pior ainda. Por isso, é o caso de olhar para o que ela tem de bom. Não ficar atento somente ao que os filhos fazem de errado. Mude o foco, converse com outros pais, sugira outras coisas para fazerem juntos, descubra algo de que eles gostem muito.
Para assumir a responsabilidade que lhes cabe, os pais têm de saber que ela pode, sim, dar mais trabalho. "Para uns vai exigir mais, tem de se dedicar mais, explicar mais. As crianças de hoje têm outras necessidades, não basta um olhar reprovador. E essa dedicação toda, de explicar etc, não precisa necessariamente acontecer todos os dias. Tem dias que você está mais disposta, tem mais tempo. Outros, não." E está tudo bem. Não tem jeito: "Pai e mãe têm de ter maturidade", afirma a terapeuta Daniela. Serão eles que farão a diferença no desenvolvimento dessa criança.
Cristiane Rogerio e Simone Tinti
Crescer
Se você assiste à novela Viver a Vida, da TV Globo, já deve ter visto as cenas da menina Rafaela (interpretada pela atriz Klara Castanho, 8 anos, e filha de Dora, personagem de Giovanna Antonelli). A garota tem sido considerada uma “pequena vilã” na novela, o que vem causando polêmica. O Ministério Público chegou a notificar o autor, Manoel Carlos, pedindo mudança no comportamento da personagem ao alegar que “nem todas as manifestações artísticas são passíveis de serem exercidas por crianças e adolescentes”.
Polêmicas à parte, a verdade é que existem muitas crianças consideradas difíceis, assim como Rafaela. Geralmente, são aquelas que se irritam facilmente, dão escândalos e têm um comportamento hostil, fazendo muitas vezes você até perder a cabeça.
Crianças que reagem assim exigem uma dose a mais de paciência dos pais. Criar filhos é uma eterna descoberta de sensibilidades. É como conhecer qualquer pessoa. Você vai convivendo, sentindo o que a agrada, do que ela não gosta tanto, o que a deixa nervosa ou irritada, o que a deixa contente ou relaxada. Só que, vez ou outra, vem aquele berro, aquele tapa na sua barriga, uma cara enfezada, uma braveza que você não entende onde pode ter nascido! Haja a tal paciência. E essa virtude, sabemos, é artigo um tanto raro entre os pais de hoje. Por inúmeros fatores: a correria de ter de administrar pressões de trabalho e filhos, o ritmo frenético da cidade grande, a saudade e a culpa por não estar gastando tanto tempo quanto gostariam com as crianças. Você alguma vez já teve um embate com seu filho a ponto de desejar que a segunda-feira chegasse logo para você correr para o trabalho? Sim? Não se culpe. Sentir raiva ou simplesmente não querer lidar com aquilo naquele momento é normal. Muito normal.
Culpa de quem
Mas será que essas situações fazem com que os pais amem menos os filhos em determinados momentos? "Sentimentos vêm e vão, variações afetivas são normais. Os pais não devem se apegar ao que não podem controlar. No entanto, eles devem se culpabilizar, sim, em como refletem esse sentimento no trato com os filhos", diz Yves de La Taille, professor do Instituto de Psicologia da USP. É aquele conceito básico: pode sentir raiva, mas não precisa bater. Quando os pais se permitem sentimentos ruins podem entender melhor e elaborar uma forma mais saudável de vivenciar os conflitos. "Bom pai ou boa mãe não é ser alguém amoroso com os filhos 24 horas. É ser justo, generoso, respeitoso, educando sempre", afirma Yves. Ufa.
Especialista em casal e família, a terapeuta Daniela da Rocha Paes Peres acredita que o mais relaxante para os pais é evitar a sensação de derrota. "Esse sentimento de raiva, de achar que não gosta mais dos filhos é o ápice de uma crise. Mas não quer dizer que a partida está terminada, que você não o ama mais. Este é o ponto de parar e retornar ao equilíbrio. E, a partir daí, procurar uma solução."
Para ela, a criança difícil pode estar sinalizando justamente o que não vai bem dentro de casa. "Por vezes, é uma forma mais pungente de pedir atenção, amor. Outras, um desafio à autoridade dos pais." Ela não nega que pode ser uma característica da criança. Pois este é justamente o ponto principal para a educadora norte-americana Mary Sheedy Kurcinka, de Minnesota. Diretora do Parent Child Help, um serviço para atendimento a pais, é autora de best-sellers como Raising Your Spirited Child (algo como Educando seu Filho Impetuoso). Esta tradução livre talvez tenha pouca importância aqui. O interessante é o significado. Kurcinka usa o termo para denotar essa característica, atribuindo-a, inclusive, à variação genética de cada pessoa. Dessa forma, entende que ela deve ser, acima de tudo, compreendida. E que chegar a este ponto é o melhor para todos. Inclusive para o bem-estar dos pais. "Quando começar a ficar chateado, distancie-se do problema ou respire fundo. Diga a si mesmo: ‘Meu filho está perdendo a calma, mas eu não tenho de perder também’", diz Mary Kurcinka (veja mais em entrevista na página seguinte).
O outro
De qualquer interpretação, o "conselho" é um só: ouça a criança. Mas ouça de verdade, com calma. Algumas vezes, terá de ler na criança o que ela não consegue dizer, interpretar mesmo. Ela talvez não consiga explicar, mas sempre dá pistas. Pois seja por razão genética, seja por um comportamento temporário ou por falta de limites, são os pais que irão ensinar a criança como ela deve lidar com os sentimentos de rejeição, raiva, irritabilidade e outros conflitos inerentes a qualquer passagem pelo planeta Terra. É papel dos pais ensinar os filhos "difíceis" a lidar com suas próprias características, para serem socialmente possíveis.
"Os pais têm de conhecer o estilo da criança. Entender, aceitar, flexibilizar as expectativas e, quem sabe, modificar. É aprender a conviver com eles, pois padrão de educação não existe mesmo. Cada família tem seu jeito de impor regras. Não compare a sua com outras", afirma a psicóloga Simone Savaya.
Isto e aquilo
Quando se trata de uma criança com comportamento hostil, daquelas que dão trabalho mesmo, show em público, é fácil colocar aquele monte de adjetivos. "Ela é assim mesmo", "não pára quieta", "é difícil de lidar". "O ato de rotular deve ser evitado, principalmente porque crianças mudam", diz Yves de La Taille. Rotular pode ser até perigoso. "Criança se apega demais ao que é dito a ela. Se incorporar, pode fazer do adjetivo, realidade."
Apontar somente os pontos negativos da criança não é bom para ninguém nessa história. Fica aquele ciclo de pensamentos ruins, ar de fracasso, ar de que não dá para ser de outro jeito. Resultado: a criança fica mal e os pais, pior ainda. Por isso, é o caso de olhar para o que ela tem de bom. Não ficar atento somente ao que os filhos fazem de errado. Mude o foco, converse com outros pais, sugira outras coisas para fazerem juntos, descubra algo de que eles gostem muito.
Para assumir a responsabilidade que lhes cabe, os pais têm de saber que ela pode, sim, dar mais trabalho. "Para uns vai exigir mais, tem de se dedicar mais, explicar mais. As crianças de hoje têm outras necessidades, não basta um olhar reprovador. E essa dedicação toda, de explicar etc, não precisa necessariamente acontecer todos os dias. Tem dias que você está mais disposta, tem mais tempo. Outros, não." E está tudo bem. Não tem jeito: "Pai e mãe têm de ter maturidade", afirma a terapeuta Daniela. Serão eles que farão a diferença no desenvolvimento dessa criança.
Cristiane Rogerio e Simone Tinti
Crescer
Esse caso da Rafaela é o menos adequado para a matéria. Ela é calculista, mascarada.
ResponderExcluirGente, criança é o ser humano em miniatura. Essa de que criança é inocente, ou faz o que faz pra chamar a atenção é utopia.