segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

País tem o maior número de dentistas do mundo, mas 13,43% da população entre 15 e 19 anos nunca foi a um especialista


Apesar de o Brasil concentrar 19% dos dentistas do mundo, cerca de 1/3 da população ainda sofre com a falta de políticas públicas de saúde bucal. Os números contraditórios — resultado de um levantamento realizado por profissionais da área e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), de 2002 — revelam que, apesar do crescimento de políticas para o setor, ainda há muito o que fazer para mudar essa realidade. De acordo com o livro Perfil atual e tendência do cirurgião-dentista brasileiro, lançado na semana passada em um congresso internacional da área, o país forma, a cada ano, cerca de 9 mil especialistas, apenas dois mil a menos do que o número registrado em todos os 26 países da Europa juntos no mesmo período.
Em compensação, dados do último levantamento do Ministério da Saúde apontam que a prática de ir ao dentista ainda é escassa entre os lares brasileiros. Entre pessoas de 15 a 19 anos, por exemplo, 13,43% nunca foram a um dentista. Entre 35 e 44 anos, cerca de 97,18% declararam ter ido ao consultório ao menos uma vez. O número aumenta para idosos na faixa etária de 65 a 74 anos — cerca de 94,19%. “O problema é que temos demandas de décadas que não se resolverão em duas ou três gestões de governos. Mas a expansão está ocorrendo”, acredita a diretora do Departamento de Gestão e Educação na Saúde do Ministério da Saúde, Ana Estela Haddad. Ela afirma que o governo investiu em profissionais a partir de 2002 e que hoje cerca de 10% dos profissionais em odontologia estão na rede pública de saúde. “Antes eram três mil no Programa Saúde da Família. Em 2010, esse número já é de 18 mil e tende a aumentar”, afirma.
Segundo o livro, o programa aparece como oportunidade do primeiro emprego para profissionais entre 20 a 29 anos. De acordo com a diretora, o grande desafio no país está em realocar mais profissionais para as regiões que mais precisam por meio do concurso público. Ela destaca uma mudança de perfil no exercício da profissão, com uma forte migração de profissionais para o setor público.
A técnica do Ministério da Saúde é uma das responsáveis pelo levantamento de informações que resultou no livro. Os dados foram extraídos do Ministério do Trabalho, do Ministério da Fazenda, da Capes e da Associação Paulista de Cirurgiões-Dentistas. O material traça um perfil da profissão e das perspectivas dos 219.575 profissionais que estão dentro e fora do mercado de trabalho. Deste total, 59% se concentram no Sudeste. A maioria em São Paulo — com 33,08% — seguida de Minas Gerais, com 12,19% dos profissionais. Por lá, a proporção é de 601 pessoas para cada dentista. A região Norte é a que apresenta maior carência de especialistas em saúde bucal: 4%, ou um profissional a cada 1.800 habitantes. A ausência de profissionais nesta região empurra os salários para cima. O maior percentual de dentistas que ganham acima de R$ 72 mil por ano fica no Norte, segundo dados baseados nas Declarações de Imposto de Renda de Pessoa Física em 2007. A pesquisa revela também que a maioria (51,25%) é composta por mulheres.
A expansão das universidades privadas é uma das causas do grande número de profissionais no país, segundo a professora do departamento de odontologia Universidade Federal da Londrina e uma das autoras do livro, Maria Celeste Morita. “Hoje, temos 197 cursos e o mercado consegue lidar com esses 9 mil formados por ano com uma taxa de profissionalização considerável”, afirma. Na região Sudeste, onde há maior número de formados, cerca de 72% dos cursos são particulares.
Dez especialidades concentram 95% dos profissionais. As principais são ortodontia e endodontia, com 11.778 e 9.120 profissionais, respectivamente. As que menos têm especialistas são as de saúde coletiva e implantologia, com 1.430 e 2.986 cadastrados, respectivamente.
O levantamento indica também que cerca de 40% dos profissionais têm menos de 40 anos e atuam na região onde se especializaram. É o caso de Alexandre Souza, 37 anos. Ele atua há dez anos em Brasília e atende cerca de 20 pacientes por dia. Apesar de estar empregado, critica a falta de oportunidade de vagas no serviço público para a especialidade. “Hoje, o deficit ainda é muito grande para as comunidades carentes e o governo não proporciona concurso para superar essa demanda. Não adianta a gente ter tantos profissionais formado se o serviço público não está absorvendo”, endossa. Alexandre é um dos 140 mil dentistas ou 2/3 da categoria que trabalham como autônomos, segundo a pesquisa. Os outros 59.225 — 27% — estão cadastrados no Sistema Único de Saúde (SUS) e trabalham no Programa Saúde da Família e nos centros de especialidades odontológicas.
Brasília foi apontada pelo livro como a região onde a remuneração por hora, em reais, é a maior do país: R$ 134,81. Em seguida, vem Mato Grosso do Sul, onde os dentistas que trabalham no regime de carteira assinada ganham por hora o equivalente a R$ 102,09. No Nordeste, os dados do Ministério do Trabalho incluídos na pesquisa mostram que o pagamento médio é de apenas R$ 57,47.

Daniele Santos


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