quinta-feira, 15 de abril de 2010

Diretora e roteirista: 'As melhores coisas do mundo' fala dos jovens



RIO DE JANEIRO - Quando adolescente, Laís Bodanzky não conseguiu ver sua geração retratada pelo cinema brasileiro.
– O filme com o qual eu mais me identifiquei foi o francês La boule, sobre a ansiedade de uma garota em torno de seu primeiro baile – conta a hoje cineasta de 40 anos.
O caso de seu marido, Luiz Bolognesi, é um pouco mais grave: ele sequer tem um exemplo estrangeiro marcante na memória.
– Não era ligado nem nos filmes americanos do gênero, como O clube dos cinco e Gatinhas e gatões – diz o roteirista de 44 anos.
Diante da falta de referências concretas e afetivas, a dupla responsável pelo elogiado Bicho de sete cabeças (2001) se viu compelida a buscar ajuda de jovens reais para alimentar o roteiro de As melhores coisas do mundo, que chega nesta sexta-feira aos cinemas brasileiros. Levemente inspirado na série de livros Mano: Cidadão-aprendiz, de Gilberto Dimenstein e Heloísa Prieto, o filme se propõe a pintar um retrato da juventude brasileira atual.
– Os livros serviram como pontapé inicial. Quando recebemos o convite da produtora Gullane para fazer o filme, tivemos a total liberdade para criar a história – conta Laís. – Seria muito fácil cair no estereótipo, então resolvemos conversar com grupos deles, recrutados em escolas de São Paulo. A idéia era respeitar os sentimentos deles.
A contribuição dos grupos de pesquisa transcendeu a busca por elementos para compor a imagem do adolescente médio brasileiro. Diretora e roteirista voltaram dos encontros com exemplos concretos de como esses jovens não gostariam de ser retratados no cinema.
– Eles estão acostumados a assistir a tudo o que é produzido sobre jovens, desde comédias besteirol americanas a Malhação ID, na TV brasileira. Todos foram apontados como referências negativas. Foram até muito veementes no ponto. Diziam: “A gente até assiste a essas coisas, mas se é para fazer um filme sobre nós, esqueçam isso” – lembra Laís.

Bolognesi completa:
– Até produções mais sérias, como Aos treze (2003) e Kids (1995), de Larry Clark, não foram poupadas. Eles alegam que não se sentem representados por eles. “Nós não somos um bando de drogados”, reclamavam alguns deles.

Maiores temores
As melhores coisas do mundo é centrado em torno dos questionamentos de Mano (Francisco Miguez), jovem de classe média que enfrenta a separação dos pais (Denise Fraga e Zé Carlos Machado), as crises existenciais do irmão mais velho (Fiuk) e os dilemas da escola, onde passa a maior parte do tempo.
Embora o filme seja ambientado em São Paulo, as situações vividas pelos personagens são comuns a qualquer adolescente de qualquer canto do país – pelo menos aqueles que pertençam ao mesmo contexto social. Conceitos de amizade, ética, preconceito, amor, sexo e família são revistos pela ótica de um ser humano em estágio de transformação.
– Ficou claro nas conversas com os grupos de estudo que o adolescente de hoje passa mais tempo na escola do que em casa, com a família. E o filme reproduz essa situação – indica Laís. – O universo da escola é opressor. Mas é lá que os jovens se descobrem e se desenvolvem.
Diretora e roteirista isolaram os grandes temores dessa turma, que passa horas na internet e lida com a violência, a iniciação no sexo e o apelo do álcool e das drogas.
– Nessa fase da vida, os sentidos estão aguçados, todas as experiências são muito intensas. É quando acontece a primeira vez em vários departamentos – analisa Bolognesi. – Dentro desse aspecto, o grande medo é o de não pertencer a nenhum grupo. Os jovens têm pavor disso. Eles nos alertaram, inclusive, que o cinema americano vende a ideia de que os grupos são monolíticos. Mas na verdade não é bem assim. O “não ser aceito” é não poder construir uma identidade que os permita circular entre eles.

Carlos Helí de Almeida


JB Online

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