terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Religiosos americanos que tentavam retirar 'órfãos' do Haiti após terremoto são interrogados

Em Barcelona, homem desembarca com órfã haitiana. Quatro crianças do Haiti foram adotadas por famílias espanholas - Reuters


RIO - Autoridades haitianas interrogaram nesta segunda-feira dez missionários americanos detidos sob suspeita de tentar retirar ilegalmente 33 crianças do país caribenho devastado após um forte terremoto no dia 12 de janeiro. Um promotor visitou os americanos na sede da polícia de Porto Príncipe. O grupo foi detido na noite de sexta-feira, tentando cruzar a fronteira com a República Dominicana em um ônibus. Os missionários batistas negam as acusações de tráfico infantil e dizem que estavam tentando ajudar órfãos vulneráveis a fugir das terríveis condições deixadas pelo terremoto de 12 de janeiro.
O caso pode ter consequências diplomáticas no momento em que os Estados Unidos comandam uma enorme operação de auxílio para ajudar as vítimas do terremoto, e entidades humanitárias norte-americanas despejam milhões de dólares em donativos ao Haiti.
Autoridades haitianas dizem que os missionários presos - cinco homens e cinco mulheres - não tinham documentos autorizando a retirada das crianças nem comprovando sua condição de órfãs.
A ministra das Comunicações, Marie-Laurence Lassegue, disse que, diante dos danos nas instalações judiciais locais, é possível que os americanos sejam julgados nos EUA.
O cônsul-geral americano no Haiti, Donald Moore, disse que os missionários "estão sendo processados segundo o sistema penal haitiano" e não comentou sobre um eventual contato das autoridades locais para que o caso seja transferido para o Judiciário dos EUA.
A polícia afirmou que várias das crianças haviam sido voluntariamente entregues pelos pais aos missionários. Uma mulher, que disse ser mãe de cinco das 33 crianças, contou na delegacia que um pastor local lhe aconselhou a entregar os filhos, já que eles teriam uma vida muito melhor no exterior.
Os americanos admitem não ter a documentação necessária para retirar as crianças do país e dizem que tentavam instalá-las em um orfanato que estão montando na vizinha República Dominicana.
O primeiro-ministro Jean-Max Bellerive, que diz ter recebido denúncias de tráfico infantil e até tráfico de órgãos depois do terremoto, chamou os americanos de "sequestradores", mas admitiu a possibilidade de que eles tenham cometido um erro involuntário ao tentarem de boa fé ajudar as crianças.

Americanos pretendiam levar até 100 crianças
Os dez americanos de uma Igreja Batista, a maioria de Idaho e Texas, disseram que são membros da organização "Missão de Resgate de Órfãos do Haiti" e que estavam tentando salvar crianças abandonadas e traumatizadas para levá-las a um orfanato. Eles foram presos na fronteira com a República Dominicana, em ônibus com menores entre dois meses a 12 anos de idade.
- Nós entendemos, e várias pessoas nos disseram, incluindo autoridades dominicanas, que poderíamos levar as crianças para o país vizinho. Nosso erro foi que não entendemos que era necessária documentação adicional - defendeu a porta-voz da igreja, Laura Silsby, garantindo que tentou "fazer a coisa certa".
Ela contou que os americanos planejavam recolher até 100 crianças e levá-las para um hotel em Cabarete, um resort na República Dominicana, que seria transformado em orfanato. As crianças, algumas delas doentes, foram deixadas pela polícia num orfanato perto da capital, e funcionários tentam localizar seus pais ou parentes.
O governo do Haiti decidiu suspender os processos de adoções no país porque as crianças órfãs ou perdidas agora estão ainda mais vulneráveis ao tráfico de menores. A Organização Internacional para Migrações relatou em 2007 que falsas agências de adoção no país ofereciam crianças a haitianos ricos e a estrangeiros em troca de taxas de processos que chegavam a US$ 10 mil. E disse ainda que haitianos estavam entregando seus filhos aos traficantes em troca de ajuda financeira.

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