Depois de publicar um artigo no jornal americano The New York Times, em 2005, a escritora Ayelet Waldman se tornou a mãe americana mais criticada e odiadana mídia. O que despertou a ira das famílias americanas foi um trecho de seu texto que dizia: "Se uma boa mãe é aquela que ama os filhos mais do que a qualquer outra pessoa no mundo, então não sou uma boa mãe, pois gosto mais do meu marido que dos meus filhos". No auge da polêmica, Ayelet foi vaiada durante uma entrevista ao programa de televisão de Oprah Winfrey, um dos mais populares do país. Algumas mães chegaram a defender que ela perdesse a guarda de seus quatro filhos.
Quatro anos depois, Ayelet volta ao tema da maternidade em Bad Mothers (“Mães Ruins: Uma crônica de crimes maternos, pequenas calamidades e momentos ocasionais de graça”, ainda sem previsão de lançamento no Brasil). O livro, segundo ela, não é um pedido de desculpas. Está mais para uma resposta provocativa: “vocês acharam que eu era uma péssima mãe? Então vejam isso agora!”. Para Ayelet, o mundo tem intenção de fazer as mães se sentirem péssimas e aumenta seu medo de falhar com seus filhos e seus próprios ideais.
Na tentativa de atingir seu ideal de maternidade, Ayelet largou a carreira de advogada bem-sucedida para ficar mais tempo com os filhos, Sophie 14 anos, Zeke 9, Rosie, 7 e Abraham, 6. Formada em direito na Universidade Harvard – na mesma turma do presidente Barack Obama, de quem diz que não era amiga –, a americana, que é casada com o romancista Michael Chabon, decidiu afastar-se de seu cargo na defensoria pública para dedicar-se à vida doméstica. A seguir, leia a entrevista que Ayelet deu a ÉPOCA:
ÉPOCA – A senhora diz que o mundo de hoje faz com que as mães se sintam mal. Por quê? Ayelet Waldman – Hoje as coisas são mais intensas e há mais pressão sobre as mães. Nós nos sentimos mal porque somos muito preocupadas. Ficamos pensando: “devemos trabalhar ou devemos ficar em casa?” Somos uma geração intermediária ainda aprendendo como viver. Crescemos com mães feministas num mundo que não mudou tão rápido quanto nós. É muito mais difícil ser mãe hoje.
ÉPOCA– Quando foi a primeira vez em que você se sentiu uma mãe ruim?
Ayelet – Foi quando segurei minha primeira filha no colo pela primeira vez. Tive um longo trabalho de parto seguido de uma cesariana. Estava exausta e com dor. Meu primeiro pensamento foi: "quem é essa pessoa nos meus braços?" Todo mundo esperava que eu me apaixonasse pela minha filha logo que a visse, mas eu não senti isso. Aquilo me apavorou. Demorou algumas semanas para que esse sentimento fosse construído, mas aconteceu. Quando tive meu quarto filho foi diferente. Eu o amei desde o primeiro momento. Talvez porque já tivesse experiência e me sentisse mais segura.
ÉPOCA - A senhora considera a maternidade uma espécie de dom com o qual algumas mulheres já nascem?
Ayelet – Pode até ser que algumas mulheres nasçam com um dom natural, mas também é possível aprender com o tempo. Eu definitivamente não nasci com esse dom, mas aprendi.
ÉPOCA – O que faz de você uma boa mãe?
Ayelet – Eu? Acho que só meus filhos podem dizer. Mas particularmente, preocupo-me com a segurança deles e sou aberta a conversas. Eles podem me contar todos os seus problemas. Sou muito cuidadosa para que eles tenham certeza de que todas as suas necessidades serão atendidas. E sou divertida, e os acho divertidos. Às vezes estou no carro e digo que sou uma péssima mãe. Meus filhos ficam bravos e dizem: “você não é uma péssima mãe!”. Tenho uma filha adolescente, então ela nem sempre gosta de mim, fica brava. Mas é normal. Meu marido acha que sou a melhor mãe do mundo.
ÉPOCA – A senhora é judia, e as judias são conhecidas como mães protetoras. A senhora se sente como uma verdadeira mãe judia?
Ayelet – Sim. Sou uma mãe protetora e culpada e esses são dois sentimentos muito judeus. Sinto-me culpada por tudo. Sinto-me culpada quando acho que não fiz tudo o que meus filhos queriam, quando faltam duas semanas para o aniversário da minha filha e sei que ela precisa de uma festa mas não preparei nada...
ÉPOCA – A senhora diz no seu livro que é muito fácil ser um bom pai, mas é impossível ser uma boa mãe. O que quis dizer com isso?
Ayelet – A “barra” é tão leve para os homens... Eles não precisam fazer muito para ser bons pais, só precisam estar presentes. Uma vez, vi numa cafeteria um casal e o pai estava segurando o bebê. A mãe ficou olhando para eles maravilhada e disse com todo o orgulho: “Você é um pai maravilhoso!”. Espere aí! Ele só estava segurando o bebê no colo, não fazia mais nada! Se os homens estão só um pouquinho mais envolvidos com seus filhos do que seus pais foram com eles, achamos que eles são maravilhosos! Já para as mulheres há uma enorme pressão, não podemos falhar.
ÉPOCA – A senhora interrompeu sua terceira gravidez quando soube que a criança tinha uma rara doença genética. Nessa ocasião, você se sentiu uma péssima mãe? Ayelet – Senti-me a pior mãe do mundo, como quem assassinou seu bebê. Depois do aborto, entrei em depressão, mas hoje tenho uma visão mais aberta. Tomei aquela decisão por dois motivos. O primeiro foi egoísta, porque eu não podia lidar com uma criança com retardamento mental. Mas a segunda foi pelos meus filhos mais velhos: não queria que eles tivessem que lidar com isso, com um irmão que dependesse de mim ou deles por toda a sua vida.
ÉPOCA – A senhora acha, então, que sua atitude foi a de uma boa mãe?
Ayelet – É, posso pensar assim. Depois disso, algumas coisas mudaram na minha vida. Hoje dou mais valor às relações da família.
ÉPOCA – O que você acha de bater nos filhos?
Ayelet – Essa nunca é uma boa solução. É claro que às vezes ficamos nervosos e acabamos batendo ou gritando, mas sempre peço desculpas aos meus filhos logo em seguida. Há quem fale: “eu só bato nos meus filhos quando não estou muito nervoso”. Mas espere aí! Que tipo de pessoa bate no filho quando não está nervoso? Não entendo isso.
ÉPOCA – A senhora defende a valorização do casamento e isso despertou polêmica nos Estados Unidos. Como a senhora justifica sua posição?
Ayelet – Valorizar o casamento e fazer dele prioridade é extremamente importante. As crianças precisam de seus pais juntos – e felizes. Se você ignora seu marido e volta toda atenção para seus filhos, as chances de isso acontecer são pequenas. Uma vez, uma mulher estava me acusando de ser uma “mãe ruim” e disse que ela tinha um filho de oito anos a quem dedicava toda a sua vida. Mas que homem fica oito anos com uma mulher assim? Quando digo que amo meu marido mais do que meus filhos, é verdade. Eu os amo também, só que é um amor completamente diferente. Meus filhos não se sentem mal por isso, pelo contrário, se sentem seguros de que seus pais se amam e não vão se separar.
Thaís Ferreira
ÉPOCA
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