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domingo, 22 de novembro de 2009
Música é usada para aliviar dores mais agudas
Pacientes relatam que terapia ajuda a esquecer a dor. Alguns até deixaram de tomar remédio. Em crianças, a música diminui de 4 a 10 dias o tempo de internação na unidade de tratamento intensivo.
A mistura de dor, depressão e o consumo constante de fortes analgésicos foram fatais para Michael Jackson. O ídolo americano talvez pudesse ter evitado o triste desfecho se tivesse aprendido a usar como remédio aquilo em que ele era um mestre: a música.
Veja outras terapias que ajudam a combater a dor
Música na vida da gente tem várias funções: vai da mais leve distração até a mais profunda emoção, toca na nossa mente, mexe com o nosso corpo. Ninguém é imune à música. Por isso, a musicoterapia é tão eficaz. Está com raiva da dor? Descarrega!
A música é um afiado e afinado instrumento para enfrentar a vida e a morte.
O Conservatório Nacional de Música no Rio de Janeiro foi o primeiro do Brasil a formar terapeutas, ainda no início da década de 1970. Do popular "quem canta seus males espanta" a sofisticadas pesquisas, se descobriu a íntima relação entre coisas que são da mesma família: dor, sentimento, sensibilidade, emoção, música. Onde começa um e onde termina o outro? Ainda mais para o brasileiro, imerso em uma cultura tão musical, ali estava um bálsamo para o corpo e para a alma.
"Música é um remédio bom de se administrar porque é o próprio cliente que diz. Alguns pedem uma música alegre e resumem: qualquer uma do Roberto Carlos. A dor é muito solitária, e a musica traz companhia. A mais eficiente forma de despistar a dor é a música. Entre música e dor, o cérebro prefere música", diz a musicoterapeuta Marly Chagas.
Porque a escolha é fácil. A música nos derrete, amolece, mas é muito mais do que relaxamento: é compor, criar, cantar, dançar, tocar, participar. Para um grupo de pessoas, descobrir a música foi um santo remédio.
Em graus diferentes, a melhora é clara: da água para o vinho, do silêncio para uma sinfonia! O que era um coral de "ais" vira uma orquestra de bem-estar.
"É muito bom, ajuda sim. Quando a gente se encontra, já é uma festa. Então, aquilo faz com que a gente transcenda e esqueça a dor um pouquinho. A dor sempre está presente, mas temos um espaço muito grande de alívio. Para quem sente uma dor crônica, cinco horas de alívio são uma maravilha", diz o aposentado Moacir Domingos Vasconcelos.
"Agora fico quase um mês sem tomar remédio", comemora o aposentado José Valente Batista.
"Desde o dia em que fiz musicoterapia não senti mais dor e tenho dormido bem à noite", afirma a dona de casa Joana Martins Lisboa.
Para quem trabalha com musicoterapia, essa noção do antes e do depois mostra nitidamente a eficiência desse tratamento.
"Uma face modificada, um sorriso, é isso que nos dá ânimo e certeza de continuar. São esses resultados que nos fazem acreditar que a música é saúde, e a doença é uma dissonância", define a musicoterapeuta Kelly Fae.
A música nos toca em vários níveis, penetra os dois lados do cérebro: o consciente e o inconsciente. A mistura de harmonia, letra e melodia nas mãos, na voz de um terapeuta, é como um bisturi preciso, que faz o cérebro do paciente operar milagres.
"A pessoa chega e pede um louvor, muito pedido, que é muito sentido: 'Segura na mão de Deus'. Essa pessoa está muito grave. Qual é o sentido que precisa ser produzido? Então, cantamos: 'Segura na mão de Deus e vai. Não temas, segue adiante'. É confortante. Inclusive, usando todo o conhecimento que se tem do processo de morrer, é algo que pode auxiliar na entrega, na confiança de experimentar essa passagem, que eu não sei qual vai ser. No meio do tratamento, a mesma música, com outro arranjo, vira um triunfo: vai à luta", conta Marly Chagas.
Acompanhar o trabalho de musicoterapia no Instituto do Câncer é emocionante. Não existem palavras para descrever – e sim canções. E nessa hora se descobre o quanto Roberto Carlos é um doutor.
E a música acalma muito antes do que se imagina. É como se o bicho gente contasse com ela para crescer, está na nossa natureza.
"Na UTI neonatal, a música diminui de 4 a 10 dias o tempo de internação da criança. Ela age no sistema nervoso, é realmente incrível. A criança que está com dor é estimulável. Começamos com um ritmo mais animado. São músicas de improvisação, produzidas naquela relação. A equipe toda vem e fica com os olhos cheios d'água ao ver a reação da vida, a pulsação que a vida traz mesmo junto à dor", diz Marly Chagas.
É no despertar dessa vibração, desse instinto de vida, de luta e superação, que reside o poder da musicoterapia. E como dizia o velho sambista, para que rimar amor e dor?
"O sonho é de que, no futuro, haja música em todos os hospitais. Alguns hospitais em São Paulo têm a musicoterapia efetivamente implantada. Ea música é um recursos barato. E se ajuda a aliviar a dor e reduz o consumo de medicamentos, estamos falando de uma questão interessante do ponto de vista econômico. Acho que a música tem um caminho promissor para o cuidado da saúde da população brasileira", constata a pesquisadora Eliseth Leão, da Sociedade Brasileira do Estudo da Dor.
Que tônico, que fortificante, é para as pessoas doentes ouvir algo como "Eu sei que vou te amar. Por toda a minha vida eu vou te amar".
MARCOS UCHÔA
Globo Repórter
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