quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Pesquisa: 70% dos homens não querem vínculo no registro de filhos


Estudo do Cesmac e Tribunal de Justiça de Alagoas constatou ainda que mais 40% dos registros civis de Maceió são incompletos

Pesquisa realizada pelo Centro Universitário Cesmac, em parceria com o Tribunal de Justiça de Alagoas, revela que 42% dos registros civis das crianças nascidas em Maceió são incompletos, sem o nome dos supostos pais nos documentos de identificação. Só para efeito comparativo, em São Paulo - a maior capital do país em termos populacionais – a proporção é de 11,45%.
O estudo revelou ainda que mesmo admitindo a paternidade, cerca 70% dos homens que não registram seus filhos não o fazem para não estabelecer vínculos e obrigações financeiras com as crianças. Por outro lado, 33,3% das mães afirmam que os filhos sofrem constrangimentos por causa do registro de nascimento incompleto.
Vale ressaltar que o registro civil de nascimento é de extrema importância para garantir direitos básicos de qualquer cidadão, como acesso a serviços públicos, benefícios previdenciários e a programas de transferências de renda, como o Bolsa Família. O documento só é considerado completo quando consta tanto o nome do pai quanto o da mãe.
“A incompletude nos registros causa diversos danos sociais, morais e psicológicos à criança e membros de sua família, dificultando o exercício pleno de seus direitos entre eles a pensão alimentícia e a herança”, afirma a juíza Ana Florinda Mendonça da Silva Dantas, professora mestra do curso de Direito do Cesmac e orientadora do estudo.
De acordo com ela, a Lei 8.560 do Código Civil (de 1992) assegura os mesmos direitos aos filhos nascidos de uniões formais e informais – inclusive o acesso ao registro de nascimento -, permitindo que os progenitores requeiram exames próprios que comprovem ou não a presumida paternidade. “A igualdade de filiação é garantida ainda pelo artigo 227 do parágrafo sexto da Constituição Federal, mas nem sempre se torna efetivo quando o filho decorre de família informal porque a paternidade precisa ser declarada, ao contrário do que ocorre nas famílias matrimoniais - onde predomina a presunção da filiação”, frisa.
Na opinião de Ana Florinda a grande incidência de registros incompletos em Maceió ocorre em função da falta de cumprimento da lei vigente. “A Nova Lei de Investigação da Paternidade determina, em seu artigo 2º, que todo registro de nascimento que conste apenas o nome da mãe deve ser levado a conhecimento de um juiz por um oficial de justiça. Essa lei foi criada numa tentativa de fazer com que todo filho tenha o nome de seu genitor no registro. Mas, os cartórios de Registro Civil de Maceió não cumpriam essa lei por falta de conhecimento”, relembra.

Programa
Por isso, após coordenar cinco pesquisas sobre a questão de reconhecimento da paternidade, pelo Programa Semente de Iniciação Científica (PSIC) do Cesmac, a juíza criou um Programa de Registro Civil Integral no Tribunal de Justiça de Alagoas, do qual faz parte, onde implantou várias estratégias para garantir o registro completo de todas as crianças de Maceió. As atividades do programa se concentram no Núcleo de Promoção da Filiação (NPF) que está em plena atividade e estimula a paternidade responsável. “Uma das primeiras atitudes do NPF foi levar aos Ofícios o conhecimento da lei para que todas as crianças fossem beneficiadas”, diz a juíza.
Para que houvesse a implantação do Núcleo de Promoção da Filiação foram estabelecidos convênios e parcerias do Tribunal de Justiça com as entidades relacionadas ao Registro Civil, Prefeitura de Maceió e o Governo do Estado de Alagoas. Durante o desenvolvimento do projeto foram feitas visitas em instituições de ensino em comunidades carentes da capital alagoana com o objetivo de cadastrar as crianças que tinha registro de nascimento incompleto e descobrir as razões desse fenômeno social.

Levantamento
O levantamento dos dados referentes aos processos de investigação de paternidade foi obtido por meio da análise de registros civis incompletos, encaminhados pelos cartórios de registro civil da comarca de Maceió ao NPF e por entrevistas realizadas por Sara Jamille Pereira Costa, estudante de Direito do Cesmac, com o público alvo do projeto, formado por famílias informais carentes. A pesquisa foi realizada no período de agosto de 2008 a maio de 2009.
No ano de 2007 foram abertos 129 procedimentos de informação de paternidade. Em 2008 esse número mais que dobrou, chegando a 301 processos e, até junho de 2009, subiu para 385. “Uma grande dificuldade que está sendo percebida para dar continuidade aos processos de investigação de paternidade, e concluir o que é proposto pelo Núcleo, é o grande número de processos com dados do suposto pai incompletos – o que traz uma enorme barreira ao andamento processual, deixando-o mais moroso e por vezes até impossível de ser concluído satisfatoriamente”, diz Sara Jamille Costa, mencionando que em 38% dos processos a mãe não sabe informar o endereço do suposto pai, enquanto 19% informam o endereço incompleto dele. “Quase 20% das mães não sabem nem o nome ou o endereço completo dos supostos pais e 8% sabem o endereço, mas não sabem informar o nome completo”, destaca.

'Mães dispostas a garantir direitos dos filhos'
“Apesar da insuficiência de informações, verificamos que a esmagadora maioria das mães estava disposta a garantir o direito de seus filhos, facilitando o registro integral deles”, afirma Sara Jamille. “Contudo, a pesquisa apontou que ainda é grande o número de mães que desconhecem os pais de seus filhos ou que se recusam a oferecer informações que possibilitem o registro completo das crianças. Algumas acham que incluir o nome dos pais nos registros de nascimento é uma escolha pessoal, desconsiderando o direito dos próprios filhos”, conta a estudante, explicando que em situações como essas as mulheres foram intimadas a fornecer dados dos supostos pais para que os oficiais de justiça pudessem identificá-los e intimá-los para audiência de conciliação. Nos casos de falecimento dos supostos pais, as genitoras foram intimadas a fornecer dados das famílias deles.
Contudo, a pesquisa realizada pelo Cesmac mostra que 77,7% das mulheres envolvidas em processos de reconhecimento de paternidade em Maceió afirmam que registraram os filhos somente nos seus nomes porque os pais das crianças se recusaram a fazer o registro, mesmo admitindo a paternidade. “Elas contam que eles não querem registrar os filhos para não estabelecer vínculos e depois ter a obrigatoriedade de arcar com os deveres legais”, diz Sara Jamille. Apenas 11,1% das mães dizem que não tiveram o interesse de fazer o registro completo, enquanto 5,5% contam que foram ameaçadas por seus antigos companheiros e outras 5,5% porque os pais das crianças morreram antes delas nascerem. Outro dado relevante apontado pela pesquisa é que 33,3% das mães afirmam que seus filhos sofreram algum tipo de constrangimento por terem registro incompleto.
“Ou seja, um das hipóteses do estudo foi confirmada: a de que o registro civil de nascimento, embora seja de fundamental importância para o exercício da cidadania, não supre as necessidades psicossociais de indivíduo se não for feito de forma integral, constando os nomes de ambos genitores. O reconhecimento paterno, que é o de mais complexa implementação nas famílias informais, é um dever dos pais e um direito dos filhos, sendo também tarefa da sociedade e do Estado propiciar meios para contornar as dificuldades para sua efetivação”, diz Sara Jamille.


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