Confiantes na possibilidade de conter uma epidemia que, apenas no último ano, tirou a vida de 370 mil sul-africanos, um grupo de profissionais se empenha para tentar mudar a triste realidade que faz do país o recordista mundial no número de soropositivos.
Dar esperança aos mais de 5,6 milhões de portadores do vírus HIV no país e tentar reduzir as cerca de mil mortes por dia são os desafios de muitas organizações, entre elas, o TAC (Treatment Action Campaign). Referência no combate à doença e indicado ao Nobel da Paz de 2004, o grupo recebeu o G1 em uma de suas filiais para descrever este cenário.
Dar esperança aos mais de 5,6 milhões de portadores do vírus HIV no país e tentar reduzir as cerca de mil mortes por dia são os desafios de muitas organizações, entre elas, o TAC (Treatment Action Campaign). Referência no combate à doença e indicado ao Nobel da Paz de 2004, o grupo recebeu o G1 em uma de suas filiais para descrever este cenário.
No mundo, segundo o último relatório (de 2007) da Organização Mundial da Saúde, o número de pessoas com Aids ultrapassa os 33,3 milhões. Desses, 22,5 milhões estão na África Sub-Saariana (grupo de países africanos que fica abaixo do deserto do Saara). Nesta parte, muitas nações se destacam pela incrível capacidade de proliferação do HIV.
Essa coincidência acontece porque, segundo Rebecca Hodes, responsável pelo departamento de pesquisa do TAC, o continente sofre com a escassez de recursos e educação. “O continente tem a pior estrutura para cuidar da Saúde. Não há recursos para tratar as pessoas, nem educar a população”, diz. Em 1998, quando nasceu o TAC, o número de soropositivos na África do Sul superava os 3,5 milhões. “Era preciso mobilizar a população, educar e criar um sistema de saúde porque as estatísticas estavam assustando”, conta Rebecca, apontando como um dos principais responsáveis pelo cenário desastroso a despreocupação com o sexo. “Há estupros, relações sexuais sem camisinha, poligamia e outras questões culturais que precisam mudar. Esse tópico é de extrema importância, mas não podemos esquecer da mobilização social que, sem dúvida, está no topo para transformar drasticamente esta realidade”, lembra a pesquisadora.Os anos seguintes, após a fundação, foram de intenso trabalho na tentativa de implementar uma nova consciência na África do Sul que teimava em ignorar a epidemia. Hoje, fazendo uma média nacional, cerca de 12% da população vive com aids, porém, em áreas específicas, esse percentual sobe para a casa dos 30%. “Em algumas províncias como Mpumalanga e Kwazulu-Natal (norte do país), algumas áreas chegam a contabilizar 36% da população”, fala Rebecca
Com a saúde negligenciada pelas autoridades, a luta acabou sendo mesmo das organizações como o TAC, por exemplo. O grupo recebe doações de agências e fundações, entre elas, a Global Financial e o Departamento de Desenvolvimento da Inglaterra. É com essa contribuição que eles tratam parte dos cerca de 750 mil soropositivos que usam os anti-retrovirais produzidos na própria África do Sul. Apesar de as organizações comemorarem o acréscimo no número de pessoas que recebem o tratamento, esses milhares ainda são poucos diante dos milhões de infectados. Após uma relação sexual desprotegida, Rodrick Coarcere, 47 anos, foi infectado pelo HIV. Dez anos depois, ele descobriu que tinha a doença. “Fiquei muito mal e só quando fiz uma série de exames no hospital soube que era HIV positivo.” Após o baque ele decidiu se tratar e procurou o TAC.
“Estava com a imunidade muito baixa. No início eu tomava uns 18 remédios por dia”, lembra Rodrick que hoje toma apenas três pílulas. Os amigos e a família não aceitaram com facilidade o fato de ele ser HIV positivo. Alguns se afastaram por desconhecer a doença, segundo ele. “Ainda há muito preconceito contra os soropositivos por pura ignorância e na África do Sul ainda é pior porque tem o fator da raça”, diz o coloured (denominação para os mestiços do país), completando que por um lado esse distanciamento foi bom. “Pude informar e educar muitos amigos que não faziam idéia dos riscos da Aids”. Hoje, 20 anos após ser infectado, Rodrick diz ter uma vida normal e estar saudável. Ele é recepcionista de uma das filias do TAC e trabalha ajudando outros soropositivos que procuram a organização. “A informação é o melhor caminho. O trabalho que as organizações desenvolvem é de extrema importância para produzir uma consciência de combate à doença”, opina. Como as campanhas têm a meta de conscientizar toda a população, elas estão por toda a parte. Nas ruas, escolas, hospitais, veículos de comunicação... No momento, duas delas ganham destaque.
Uma alerta a população para a epidemia de tuberculose que tem como alvo principal os soropositivos. “As chances de um soropositivo ter tuberculose são de 60%. Queremos informar as pessoas e tratar as duas doenças”, conta Rebecca.
A outra tem o objetivo de minimizar a transmissão entre as mulheres. “Muitas usam o sexo para sobreviver. Elas têm relação sexual de forma desprotegida ou então são vítimas de violência sexual. É um grupo com alto grau de contaminação que merece ser observado”, explica.
Alho, batata e beterraba em vez do coquetel
Uma dieta rica nesses alimentos é tudo o que precisa a população para combater a Aids, dizia a ex-ministra da Saúde Manto Tshabalala-Msimang (1999-2008). Manto, praticamente uma inimiga das organizações anti-HIV, acreditava tanto na teoria que, por muitas vezes, em público, orientou a população a seguir o seu conselho. O deboche da imprensa foi instantâneo. Os jornais alvejaram a ministra de críticas, e o TAC comprou a briga. Zackie Achmat, fundador da organização, acusou a ministra de ser responsável pela epidemia no país.
A relação nada saudável do governo não só com o TAC, mas com a maioria das organizações durou toda a era Thabo Mbeki. “A ministra da Saúde se recusava a dar suporte às campanhas com os anti-retrovirais e, principalmente, à implementação de um programa dedicado às mães soropositivas. Por essa atitude, muitos bebês morriam sem a gente nem pelo menos tentar salvá-los”, conta Rebecca Hodes, responsável pelo Departamento de pesquisa do TAC, lembrando que, no ano passado, cerca de 64 mil bebês foram contaminados.
Manto mostrava verdadeira ojeriza aos avanços da ciência e insistia em um tratamento baseado na medicina tradicional africana. Por promover os benefícios da batata, beterraba, alho e até limão, a ministra recebeu o apelido de Dra. Beterraba. Em agosto de 2006 durante a Conferência Internacional de Aids, Sthepen Lewis, enviado especial da ONU fechou o encontro com críticas ferozes à política de combate à doença na África do Sul acusando o governo de ser negligente.
A apatia do governo que até o ano passado não se empenhava em introduzir políticas mais eficazes, contribuindo com a tragédia na saúde sul-africana, parece estar diminuindo. Com a saída de Manto após a renúncia de Mbeki em agosto passado, a ministra substituta Barbara Hogan vem trabalhando para promover uma nova ideologia, segundo Rebecca” É outra mentalidade. Ela acredita que HIV causa Aids (diferente da outra ministra) e dá suporte às campanhas. O relacionamento está bom, mas ainda aguardamos a estruturação de um programa mais amplo”, completa.
Portal G1
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