Um novo retrato das contribuições de cada etnia para o DNA dos brasileiros, obtido com amostras das cinco regiões do país, indica que, em média, ancestrais europeus respondem por quase 80% da herança genética da população. A variação entre regiões é pequena, com a possível exceção do Sul, onde a contribuição europeia chega perto dos 90%.
Os resultados, publicados na revista científica "American Journal of Human Biology" por uma equipe da Universidade Católica de Brasília, dão mais peso a resultados anteriores, os quais também mostravam que, no Brasil, indicadores de aparência física como cor da pele, dos olhos e dos cabelos têm relativamente pouca relação com a ascendência de cada pessoa.
Os resultados, publicados na revista científica "American Journal of Human Biology" por uma equipe da Universidade Católica de Brasília, dão mais peso a resultados anteriores, os quais também mostravam que, no Brasil, indicadores de aparência física como cor da pele, dos olhos e dos cabelos têm relativamente pouca relação com a ascendência de cada pessoa.
Quem vê cara não vê DNA
"No Brasil, a pigmentação da pele está, em grande medida, desacoplada da ancestralidade, por conta do grau de miscigenação. Em muitos casos, você percebe que há uma relação muito fraca entre a autoidentificação que a pessoa faz, dizendo-se branca ou negra, e o que os dados de DNA revelam, embora a gente não tenha levado isso em conta durante esse trabalho em particular", disse à Folha Rinaldo Wellerson Pereira, que coordenou o estudo.
Embora os resultados sejam interessantes do ponto de vista histórico e antropológico, o principal objetivo de Pereira e companhia é obter uma ideia mais clara da composição genética da população como ferramenta para entender correlações entre o DNA e uma série de doenças.
Sabe-se que todo tipo de moléstia pode ter relação com a ancestralidade do doente, mas os dados sobre a associação entre uma coisa e outra disponíveis hoje são, quase sempre, de populações como europeus ou norte-americanos, nas quais a mistura étnica teve importância relativamente baixa. Daí a necessidade de conseguir dados originais no Brasil.
Os resultados foram obtidos com amostras de 200 pessoas, divididas em cinco grupos de mesmo tamanho, cada um deles oriundo de zonas urbanas de uma das regiões do Brasil. Os voluntários conseguiram na Justiça o direito de ter seu DNA examinado gratuitamente em investigações de paternidade e assinaram formulários aprovando o uso do material genético para a pesquisa.
"Como são pessoas que não podiam pagar pelo exame, é possível que a amostra contenha uma proporção maior de pardos do que a população geral, embora nós não tenhamos feito essa análise", diz Pereira.
Para estimar as contribuições relativas de europeus, africanos e indígenas, os pesquisadores usaram um conjunto de 28 SNPs (pronuncia-se "snips"), minúsculas variantes genéticas que correspondem à troca de uma única "letra" no alfabeto químico do DNA. (Cada pessoa carrega, em seu genoma, 3 bilhões de pares dessas "letras"). Muitos SNPs são típicos de determinadas populações do mundo, sendo bem mais frequentes em europeus ou africanos, por exemplo.
Pais postiços
A segunda fase da análise é comparar a presença desses 28 SNPs no DNA dos brasileiros estudados com a distribuição deles em populações "parentais", ou seja, que poderiam servir como uma versão simulada dos grupos que se miscigenaram e deram origem à população brasileira atual.
Para isso, os pesquisadores recorreram a amostras de DNA de africanos (de Botsuana, Camarões, Gana e Senegal), americanos de Chicago e Baltimore com origem europeia e índios zapotecas, do México.
"Como os SNPs discriminam a ancestralidade em nível continental, essas populações parentais são suficientes, embora não reflitam historicamente as nossas", avalia Pereira.
População mestiça
Os resultados obtidos pela equipe de Brasília são mais uma prova do cuidado necessário para estudar a associação entre doenças e características genéticas numa população miscigenada como a brasileira.
"Já houve estudos de associação genética com grupos definidos como "brasileiros brancos e brasileiros negros". No fundo, essas definições não querem dizer absolutamente nada", afirma Pereira.
Em países como os EUA, conta ele, já chegaram ao mercado alguns medicamentos voltados de forma específica para os americanos de origem africana, levando em conta o fato de que o organismo de pessoas de diferentes ascendências reage de maneira variada a certas substâncias. "Agora, imagine uma droga dessas no Brasil. Não adianta uma pessoa ter aparência africana para você prever se ela vai responder ao remédio. Não tem como saber se ela possui o bendito alelo [variante genética] ligado àquela resposta", explica.
Poucos genes
Se parece misterioso o fato de que uma pessoa com biotipo africano tenha organismo "branqueado" e ascendência predominantemente europeia, é preciso levar em conta o fato de que, até onde se sabe, são poucas dezenas de genes (dentre os 20 mil estimados para o genoma humano como um todo) que coordenam as diferenças de pele, cabelos e olhos.
É por isso que uma contribuição pequena das outras etnias ainda caracteriza a aparência de muitos brasileiros.
REINALDO JOSÉ LOPES
Folha Online
"No Brasil, a pigmentação da pele está, em grande medida, desacoplada da ancestralidade, por conta do grau de miscigenação. Em muitos casos, você percebe que há uma relação muito fraca entre a autoidentificação que a pessoa faz, dizendo-se branca ou negra, e o que os dados de DNA revelam, embora a gente não tenha levado isso em conta durante esse trabalho em particular", disse à Folha Rinaldo Wellerson Pereira, que coordenou o estudo.
Embora os resultados sejam interessantes do ponto de vista histórico e antropológico, o principal objetivo de Pereira e companhia é obter uma ideia mais clara da composição genética da população como ferramenta para entender correlações entre o DNA e uma série de doenças.
Sabe-se que todo tipo de moléstia pode ter relação com a ancestralidade do doente, mas os dados sobre a associação entre uma coisa e outra disponíveis hoje são, quase sempre, de populações como europeus ou norte-americanos, nas quais a mistura étnica teve importância relativamente baixa. Daí a necessidade de conseguir dados originais no Brasil.
Os resultados foram obtidos com amostras de 200 pessoas, divididas em cinco grupos de mesmo tamanho, cada um deles oriundo de zonas urbanas de uma das regiões do Brasil. Os voluntários conseguiram na Justiça o direito de ter seu DNA examinado gratuitamente em investigações de paternidade e assinaram formulários aprovando o uso do material genético para a pesquisa.
"Como são pessoas que não podiam pagar pelo exame, é possível que a amostra contenha uma proporção maior de pardos do que a população geral, embora nós não tenhamos feito essa análise", diz Pereira.
Para estimar as contribuições relativas de europeus, africanos e indígenas, os pesquisadores usaram um conjunto de 28 SNPs (pronuncia-se "snips"), minúsculas variantes genéticas que correspondem à troca de uma única "letra" no alfabeto químico do DNA. (Cada pessoa carrega, em seu genoma, 3 bilhões de pares dessas "letras"). Muitos SNPs são típicos de determinadas populações do mundo, sendo bem mais frequentes em europeus ou africanos, por exemplo.
Pais postiços
A segunda fase da análise é comparar a presença desses 28 SNPs no DNA dos brasileiros estudados com a distribuição deles em populações "parentais", ou seja, que poderiam servir como uma versão simulada dos grupos que se miscigenaram e deram origem à população brasileira atual.
Para isso, os pesquisadores recorreram a amostras de DNA de africanos (de Botsuana, Camarões, Gana e Senegal), americanos de Chicago e Baltimore com origem europeia e índios zapotecas, do México.
"Como os SNPs discriminam a ancestralidade em nível continental, essas populações parentais são suficientes, embora não reflitam historicamente as nossas", avalia Pereira.
População mestiça
Os resultados obtidos pela equipe de Brasília são mais uma prova do cuidado necessário para estudar a associação entre doenças e características genéticas numa população miscigenada como a brasileira.
"Já houve estudos de associação genética com grupos definidos como "brasileiros brancos e brasileiros negros". No fundo, essas definições não querem dizer absolutamente nada", afirma Pereira.
Em países como os EUA, conta ele, já chegaram ao mercado alguns medicamentos voltados de forma específica para os americanos de origem africana, levando em conta o fato de que o organismo de pessoas de diferentes ascendências reage de maneira variada a certas substâncias. "Agora, imagine uma droga dessas no Brasil. Não adianta uma pessoa ter aparência africana para você prever se ela vai responder ao remédio. Não tem como saber se ela possui o bendito alelo [variante genética] ligado àquela resposta", explica.
Poucos genes
Se parece misterioso o fato de que uma pessoa com biotipo africano tenha organismo "branqueado" e ascendência predominantemente europeia, é preciso levar em conta o fato de que, até onde se sabe, são poucas dezenas de genes (dentre os 20 mil estimados para o genoma humano como um todo) que coordenam as diferenças de pele, cabelos e olhos.
É por isso que uma contribuição pequena das outras etnias ainda caracteriza a aparência de muitos brasileiros.
REINALDO JOSÉ LOPES
Folha Online
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