domingo, 2 de agosto de 2009

Violencia Psicológica: Cicatrizes para sempre


Por Maria Tereza Maldonado*
As agressões não se restrigem apenas em bater ou ferir fisicamente. Há também a formação do padrão de violência psicológica, onde há falta de amor e carinho; uma alta frequência de condutas de abuso do tipo: xingar, humilhar, depreciar. Quando isso é feito constantemente, prejudica a formação da boa auto-estima e consolida a rejeição. A criança e o jovem que não se sentem protegidos, acolhidos, amados e aceitos pelas pessoas significativas para eles passam a desvalorizar a sí próprios e tendem a se submeter a situações de abuso em outros relacionamentos. Muitos quando chegam a idade adulta, tornam-se abusadores, repetindo com seus filhos o mesmo padrão de rejeição. Como disse Selma, mãe de dois meninos: "jurei a mim mesma que, quando tivesse filhos, jamais os xingaria ou bateria neles, porque sei o quanto sofri com minha mãe. Mas, quando eles me desobedecem ou me provocam, vem uma raiva tão grande lá de dentro que eu não consigo me conter: bato, xingo,faço com eles tudo que minha mãe fazia comigo e que eu tanto detestava."O sentimento de rejeição em muitos casos, começa a se formar ainda na gravidez, quando esta é indesejada. "Não pedí pra nascer" é o argumento que muitos filhos usam para protestar contra o sentimento de serem rejeitados ou incompreendidos. "Você não deveria ter nascido", é o que alguns pais dizem na hora da raiva e que, por vezes, traduz a rejeição vinda da gestação não planejada ou da decepção com o filho que não é do jeito que eles gostariam que fosse. Por isso é muito importante que os jovens, desde cedo, desenvolvam a consciência da maternidade e paternidade responsáveis. Transar sem a devida proteção anticoncepcional resulta em gestações não planejadas, que colocam em risco a formação do vínculo amoroso entre os pais e o bebê.
Muitos pais criticam depreciativamente os filhos por acreditarem que esta é a melhor maneira de fazê-los "criar vergonha na cara" e estimulá-los a estudar mais, ou a assumir suas responsabilidades. Alguns professores tentam incentivar seus alunos desse modo. A consequência mais comum é que o vagabundo, a molenga, ou o idiota tendem a intensificar essas características pelas quais passam a ser conhecidos pelo grupo familiar ou escolar. Por sua vez, muitos jovens, com o horror de se transformarem em espelhos dos pais e perderem as características próprias, tentam acentuar as diferenças por meio de condutas de hostilidade e de críticas demolidoras: "Você está ridícula com essa roupa" ," Mãe já está velha e quer parecer garotinh."," Pai, você está ultrapassado, não sabe nada do que acontece no mundo dos jovens". O resultado são relações em que todos se ferem com comentários irônicos e depreciativos, respostas rápidas, portas batidas ou hermeticamente trancadas, respostas lacônicas e caras feias, fechadas.
Há muitas famílias em que as pessoas desenvolvem um padrão de brigas e de críticas destrutiva recíprocas a tal ponto que só abrem a boca para mencionar o que está errado ou o que não gostam. Quando se pergunta o que apreciam uns nos outros, não acham fácil responder. Como disse Leonardo, 16 anos: "Não faço a mínima idéia do que meus pais apreciam em mim, acho que eles não gostam de nada que eu faço, e acho que eles também não sabem o que aprecio neles. Lá em casa a gente não criou esse hábito de elogiar, é tiroteio o tempo todo". Luciana, a irmã de 14 anos, acrescentou:"A gente sente isso até mesmo quando mostra o boletim com as notas: tirei acima de sete em todas as matérias, menos em geografia. É claro que eles só falaram da nota baixa, dizendo que eu ia ficar reprovada. Com tantas brigas, o ar da casa fica irrespirável. É muito ruim viver com a impressão de que nossos pais não acreditam na gente".
O abuso psicológico referente às formas de comunicação "demolidoras" é o tipo menos conhecido de violência, porque o corpo não fica marcado e nenhum osso é fraturado. No entanto,como consequência de ter sido xingada, humilhada, depreciada e rejeitada, a criança cresce com marcas profundas em seu psiquismo e com sua auto-estima gravemente fraturada. A sensação constante de ser rebaixada origina, em muitas pessoas, sentimentos de revolta e desejos de vinganças que podem mais tarde motivar condutas violentas.
Nas escolas é comum a figura do aluno compulsivamente implicante que escolhe colegas como alvo de abuso psicológico. São pessoas inseguras, que sentem prazer em humilhar e aterrorizar colegas que não conseguem se defender dos seus ataques. As crianças cronicamente atacadas por essas manobras e intimidação, chantagem e perseguição podem ficar deprimidas e com sua auto-estima prejudicada. A escola tem aí um campo fértil de trabalho para o desenvolvimento de atitudes de respeito e consideração.
A rejeição ao filho motiva também o surgimento de outras facetas do abuso psicológico, como a tendência a isolar a criança ou o jovem, impedindo-os de de terem amigos e de participarem de atividades próprias para a idade, importantes para o seu desenvolvimento social e pessoal. Isolada, a criança sente-se sem lugar no mundo, como se nem sequer tivesse o direito de existir. A atitude de isolar está, por vezes, acoplada com outra forma de abuso: o excesso de exigências ou a criação de expectativas acima da possibilidade da criança ou do jovem. Proibidos de brincar e de se divertir, porque têm de se dedicar a maior parte do tempo ao estudo, às tarefas domésticas ou até mesmo ao trabalho, a criança e o jovem sentem-se pressionados, acuados, incompetentes, porque nunca conseguem satisfazer os pais. Essa sensação de ameaça, com frequência, é intensificada por outro aspecto de abuso psicológico: a conduta de aterrorizar para ser obedecido, por meio da criação de um clima de medo, de constantes ameças ou castigos assustadores como, por exemplo, trancar a criança num quarto escuro ou amarrá-la no pé da mesa para que ela fique bem comportada. Em consequência disso, a pessoa cresce com a sensação de viver num mundo hostil e perigoso, no qual não existe nada, nem ninguém, em quem se possa confiar. Como o isolamento, outra forma de abuso psicológico é ignorar a presença da criança ou do jovem, não valorizar sua existência, deixando-os de lado, sem proporcionar estímulos para seu crescimento intelectual e emocional.
Há pais que só prestam atenção no filho quando este faz algo errado. Só assim param de falar ao telefone, ou deixam o jornal de lado, para responder a criança, dar uma palmada, ou colocá-la de castigo. Quando a criança pede um tempo para brincar ou o jovem quer conversar, esses pais dizem que estão ocupados. Na medida em que somente o comportamento inadequado é percebido, a criança desenvolve a impressão de que, quando está sendo boazinha, não é vista, como se simplesmente não existisse. Como disse Maria Júlia, 10 anos: "Cheguei à conclusão de que não é um bom negócio fazer tudo certo. Eu chego em casa, faço meus deveres, tiro boas notas, meu quarto está sempre arrumado. Meu irmão é o oposto de tudo isso, mas, é quem mais chama a atenção dos meus pais, que vivem se preocupando com ele". Quando a criança ou o jovem percebem que são ignorados quando se comportam adequadamente, tendem a desenvolver padrões inaceitáveis de conduta. A esperança é que, se conseguirem "barbarizar ou arrebentar", receberão a atenção necessária. Com isso é todo um potencial de que se perde, um desperdício de gente. É claro que isso não acontece só dentro das famílias. O Estado, na medida em que não faz o investimento necessário em saúde, educação e segurança para suas crianças e jovens, também demonstra ignorar a existência de uma parcela importante da população.
Corromper é outra variante do abuso psicológico e se refere às condições que induzem crianças e jovens a se prostituírem, a usar ou comercializar drogas e a participar do mundo do crime. Nesses casos, a socialização da pessoa fica inteiramente distorcida, e abre amplos caminhos para o desenvolvimento de condutas antissociais.
*MARIA TEREZA MALDONADO (CRP 1296/05) mora no Rio de Janeiro, é Mestre em Psicologia Clínica pela PUC-Rio, membro da American Family Therapy Academy e exerce a profissão desde 1971.


Este texto foi sugerido pela nossa querida colaboradora Sanny Lemos, autora dos artigos:

Um comentário:

  1. incrivel, sofro violencia familiar fisica e psicologica desde que me entendo por gente, hoje tenho 21 anos e desde que tinha 12 anos ja pensava em me suicidar, meu pai me humilha muito e eu nao consigo saber nem o que fazer, minha mae me espancava quando eu era criança e meu pai tbm, conforme o tempo foi passando as agreçoes foram ficando verbais, porem essa semana ele me agrediu fisicamente. Sofro de depressao e transtorno de panico, nunca me senti amada, as vezes acho q eu nao tenho capacidade de despertar o amor, é uma agonia viver em minha pele, e dizem que as crianças escolhem a familia que vai nascer antes de vir ao mundo, sera mesmo assim??

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