domingo, 27 de setembro de 2009

Fortaleza: Disque 100 e Ciops não registram as denúncias


Reportagem levou 18 horas para conseguir registrar denúncia de exploração sexual em avenida de Fortaleza

Se existe um consenso entre os órgãos de defesa da infância e adolescência, é que, a cada ano, vem aumentando o número de denúncias de casos de exploração sexual. A explicação estaria no fato de que a população está se conscientizando, segundo representantes de entidades ligadas ao setor, que festejam a crescente participação da sociedade. O fato merece mesmo comemoração, já que, para fazer uma denúncia, apenas conscientização não basta. É preciso muita determinação.
Depois de presenciar um flagrante de exploração sexual, numa movimentada avenida da Capital, no último dia 18, a reportagem resolveu fazer um teste: é fácil formalizar uma denúncia de crime contra a infância e adolescência, em Fortaleza?
O primeiro telefonema foi dado para o Centro Integrado de Operações de Segurança (Ciops), que atende pelo número 190, naquele mesmo dia, por volta das 21h30. Ali, uma atendente informou que não poderia receber a denúncia e que a mesma deveria ser feita pelo Disque 100, número que recebe denúncias de violência contra crianças e adolescentes em âmbito nacional, que não atendeu.
A Delegacia de Combate aos Crimes de Exploração da Criança e do Adolescente (Dececa) também foi acionada, mas ninguém no telefone.
No dia seguinte ao do flagrante, mais tentativas. Por volta do meio-dia, o Disque 100 foi novamente acionado. Porém, uma gravação dizia que aquele era um serviço da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, registrava denúncias de violência contra crianças e adolescentes e repassava as informações para garantir a proteção à vida desse público. Ninguém atendeu.
Às 12h20, nova tentativa na Ciops. Uma atendente disse que acionaria uma viatura da Polícia Militar até o local.
Na Dececa, às 12h48, a reportagem foi orientada a tentar novamente o Disque 100. Às 15h, nova rodada de tentativas e a mesma gravação no Disque 100 informando que todos os atendentes estavam ocupados e que a polícia deveria ser contatada pelo 190.
Na Ciops, às 15h10, a atendente disse que a denúncia não poderia ser feita por aquele canal e que falaria com um supervisor para saber que procedimento seria sugerido. Segundos depois ela voltou orientando que fosse procurado o Fala Fortaleza, através do telefone 0800-2850880.
O serviço foi acionado às 15h16. Entre as opções, uma relacionada à infância e adolescência. Só neste momento a denúncia pôde ser concretizada, mais de 18 horas após o flagrante. A atendente explicou que, depois de feito o registro, as informações seriam encaminhadas à Fundação da Criança e da Família Cidadã (Funci), que ficaria responsável por enviar técnicos ao local indicado, em um prazo de até dez dias úteis.
Em seguida, a atendente pediu um instante na linha. Depois de quase dez minutos ouvindo um jingle da Prefeitura, ela voltou com um número de protocolo, através do qual seria possível acompanhar o caso.
No dia 22, a reportagem voltou a tentar denunciar o caso. Às 15h, falou com a Ciops, que não recebeu a denúncia. Recorremos, então, ao Disque 100, que às 15h05, as atendentes estavam ocupadas. O procedimento semelhante foi feito nos dias 24 e 25. As dificuldades para denunciar se repetiram.
Segundo a psicóloga Mariana Lima, do Disque Direitos da Criança e Adolescente (DDCA) – o setor do Fala Fortaleza que recebe as denúncias-, não deveria ter sido tão complicado. Ela reconhece a importância da participação da sociedade, mas admite que nem todos os integrantes da rede estão preparados para lidar com a demanda. “Ainda falta informação quanto aos procedimentos”, afirmou. O serviço já recebeu, desde o início do ano, mais de 10 mil ligações.
Para a coordenadora do Programa Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, Leila Paiva, o 190 tem a obrigação de receber denúncias de flagrantes, tendo em vista que são casos onde se faz necessário um pronto atendimento.
O Disque 100, ressalta ela, não pode ser o número referência para todos os casos. “O serviço está abarrotado de denúncias que deveriam ser feitas diretamente aos números estaduais e municipais”, explica. “São cerca de 80 denúncias diárias. Destas, 60% deveriam ir direto para os conselhos tutelares”.
Segundo Leila, o Disque 100 deveria receber apenas casos mais complexos, que não exigem uma ação imediata, como denúncias contra quadrilhas organizadas ou situações em que as redes dos Estados e municípios não estão sendo eficazes.



Diário do Nordeste

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Verbratec© Desktop.