segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Afeganistão aprova regra que garante a marido direito de não dar comida à mulher que não quiser ter relações sexuais


CABUL - Uma lei que permite aos maridos matarem suas mulheres de fome no caso destas se recusarem a ter relações sexuais com eles foi aprovada na surdina no Afeganistão, revoltando opositores do governo e grupos de direitos humanos.

Publicada no diário oficial do país e aparentemente aprovada pelo presidente Hamid Karzai, a lei era uma proposta cuja versão original já tinha causado indignação no início deste ano. Na época, sob pressão, Karzai foi forçado a modificar a proposta, e foi esta versão modificada a aprovada discretamente e, segundo seus críticos, oportunamente às vésperas das eleições presidenciais, na próxima quinta-feira. A aprovação da lei teria como objetivo agradar aos conservadores xiitas, cujos votos o presidente considera fundamentais para a vitória nas urnas. A proposta inicial obrigava as mulheres xiitas a terem relações sexuais com seus maridos a cada quatro dias, no mínimo, e ainda perdoava casos de estupro dentro do casamento, ao remover a necessidade de consentimento da esposa - ou seja, a mulher, querendo ou não, teria que ter relações com seu marido; caso não quisesse, o marido teria o direito de violentá-la. Ou de não lhe dar comida.
A emenda ao texto original aprovada pelo governo manteve as partes mais opressoras, incluindo esta, que permite que o marido não dê comida à mulher enquanto esta se recusar a fazer sexo. A lei determina também que a esposa peça ao marido permissão para trabalhar e, ainda, dá a pais e avôs a custódia exclusiva dos filhos.
A lei afegã governa a vida familiar xiita. Líderes do Ocidente e grupos feministas do Afeganistão se uniram para condenar o retrocesso na liberdade conquistada pelas mulheres depois da queda do Talibã, alegando que a aprovação obscurece os direitos de igualdades garantidos na Constituição.
- Houve uma revisão na proposta. Karzai, sob forte pressão do mundo inteiro, foi obrigado a reescrevê-la, mas a versão aprovada continua contendo as partes mais opressoras - disse Rachel Reid, representante do Human Rights Watch em Cabul. - O que interessa ao presidente é o apoio dos fundamentalistas e extremistas no Afeganistão.
Feministas alertam ainda que a Comissão Independente das Eleições precisa recrutar 13 mil mulheres antes das eleições de quinta-feira, a fim de permitir que as seções eleitorais exclusivas para mulheres tenham oficiais do sexo feminino a postos e aptas a revistarem as eleitoras. Caso os postos não sejam ocupados - o jornal "The Independent" calcula que não sejam 13 mil, mas 42 mil oficiais necessárias -, é provável que muitos homens não deixem suas mulheres e filhas votarem em seções mistas.


O Globo

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