“A Rainha do Cine Roma”, do mexicano Alejandro Reyes, da editora Oficina do Livro, comprova até onde a desgraça humana pode chegar.
Numa Salvador da Baía que de turística não tem nada, vivemos a dura realidade dos meninos de rua do Brasil. O livro foi finalista do Prêmio Leya.
O escritor angolano Pepetela, que fez parte do júri do Prêmio Leya, deixa o recado para o eventual leitor de “A Rainha do Cine Roma”: “Quem tiver peito fraco, é melhor não tocar neste livro. Porque ele é duro, cru, verdadeiro”. A realidade aqui não é portanto uma metáfora, pelo contrário, é apresentada sem subterfúgios e sem medo das palavras.
Alejandro Reyes, natural do México, morou nove anos em Salvador da Baía, no Brasil. Para contar a história dos meninos de rua conviveu alguns meses com os mesmos. E é essa vivência que o mexicano nos dá a conhecer pela voz de um dos protagonistas de “A Rainha do Cine Roma”, Betinho, o narrador da história, um narrador que por diversas vezes nos interpela ao longo da narrativa, procurando assim nos aproximar do seu drama.
Betinho, homossexual assumido, é a voz das ruas de Salvador, uma voz que não segreda nada, pelo contrário, é uma voz que grita o terror de uma vida no mínimo indigna, uma vida que coloca constantemente Deus em xeque.
Prostituição infantil, drogas, exploração sexual, pedofilia, pais que violam filhas, filhas que terminam com as vidas dos pais. Os horrores são inúmeros e Reyes não poupa ninguém, revelando um drama que para muitos é completamente desconhecido, mas infelizmente bastante real para a dignidade humana.
Betinho apaixona-se por Maria Aparecida e juntos têm uma relação de irmãos, amigos, namorados e amantes. É através dos dois que sabemos como é a vida dos meninos de rua do Brasil; é através deles que Alejandro Reyes constrói o seu romance, que tem a particularidade de ser escrito como se estivéssemos em plena Salvador, já que o mexicano resolveu escrever o seu livro utilizando a linguagem que os meninos de rua utilizam no seu dia a dia.
“A Rainha do Cine Roma” tem como principal problema os sucessivos infortúnios de Betinho e Maria Aparecida, que acabam por sofrer na pele as várias histórias que Reyes teve conhecimento quando fez o seu trabalho de campo. Em diversos momentos a esperança de uma vida melhor esvai-se e isso acaba por retirar ritmo ao livro. Mas esse pormenor não retira mérito a obra, pelo contrário. Antes de tudo Reyes pretendeu mostrar o drama dos meninos de rua. E conseguiu, sem dúvida, mostrando ao mesmo tempo que a indiferença não pode continuar.
Diário Digital
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