O problema das crianças e adolescentes que vivem na Cracolândia pede ações emergenciais não só no local, mas também nas comunidades de origem desses jovens. A avaliação é do psicólogo do Projeto Quixote, que cuida de crianças em situação de risco no centro de São Paulo, Lucas Carvalho. Para ele, não agir nas periferias, de onde costumam vir essas crianças, é “enxugar o chão com a torneira aberta”.
Ele explicou que as próprias famílias desses jovens costumam viver em situação de violência. “A família também vem de históricos de violência”, ressaltou Carvalho. O conjunto de ruas do centro chamado de Cracolândia é caracterizado por um quadro de venda e consumo generalizados de crack.
Segundo a coordenadora pedagógica do Projeto Quixote, Fernanda Ramos, quando uma criança chega ao centro de São Paulo uma série de vínculos entre ela e a comunidade já foram rompidos. Por isso, ela ressalta a importância de haver “um trabalho na comunidade que permita olhar para essa criança antes que ela se torne um refugiado urbano do centro de São Paulo”.
O jovem que enfrenta problemas no lugar onde vive “vai se descolando, aos poucos, da família dele”, explica a coordenadora do programa de Educação na Rua elaborado pela Fundação Travessia, Fabiane Hack.
De acordo com Fabiane, as crianças e os adolescentes vão se adaptando a viver fora de suas casas aos poucos. Primeiro, passam o dia em um lugar próximo de casa, depois, no centro da cidade e, com o tempo, estendem essas fugas até não retornarem mais. “A rua é muito dura, mas também tem o lado sedutor da liberdade e de não ter regras.”
Fabiane, que desenvolve um trabalho de reinserção social de crianças em situação de rua, afirmou ter dificuldades para trabalhar com usuários de crack. A fissura – desejo compulsivo de consumir a droga – dificulta a abordagem e o diálogo com esses indivíduos. Ela destaca que até os espaços ocupados pelos que usam crack são diferentes da região onde ficam os demais menores.
Apesar do contato inicial ser mais difícil, o psicólogo Lucas Carvalho, do Projeto Quixote, acredita que a relação com uma criança residente da Cracolândia acaba sendo mais “profunda e verdadeira” do que com um menor de rua de outra região, justamente por ser mais difícil do que em outros lugares como é o caso do Vale do Anhangabaú.
Apontado como porta de entrada para os menores chegarem ao centro de São Paulo, no Anhangabaú, as abordagens iniciais costumam ser bem recebidas porque ali já é mais frequente a visita de entidades que ajudam crianças e adolescentes.
Segundo Carvalho, os menores que vivem na Cracolândia sofrem do que ele define como “desencanto”, uma perda tanto a alegria, como do próprio vigor físico. “O crack, diferente da cola e do tiner, é muito mais engessante”, conta o psicólogo para explicar o porquê da apatia dos envolvidos com essa droga.
Segundo ele, esse fenômeno dificulta o contato inicial, mas, quando a relação de confiança é estabelecida, tende a ser mais forte do que com outros jovens.
A diretora do Centro de Referência em Álcool, Tabaco e Outras Drogas, da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo, Luisemir Lago, acredita que mesmo as crianças e adolescentes com forte envolvimento com o crack podem ser reabilitados, desde que, além dos tratamento de saúde, exista também uma política de reinserção social.
No entanto, ela destacou que o uso continuado de uma droga tão potente pode comprometer as funções cerebrais desses jovens, que, por ainda não terem o organismo ainda completamente formado, estão mais sujeitos a ficarem dementes. “Ele [usuário de crack] não consegue depois render como um adolescente normal.”
Revitalização da Cracolândia pulveriza a região
A revitalização da Nova Luz, projeto da prefeitura de São Paulo, e as ações policiais nas ruas tomadas pelo crack estão “pulverizando” a Cracolândia, afirma o psicólogo do Projeto Quixote, Lucas Carvalho, que trabalha com jovens em situação de risco, no centro.
Chama-se de Cracolândia um conjunto de ruas no centro de São Paulo onde o crack é consumido e comercializado abertamente.
“A Cracolândia não está sumindo, está se fragmentando em diversos pontos da cidade”, alertou Carvalho, que fez a observação com base na sua experiência de trabalho com crianças e adolescentes pelas ruas da cidade.
Esse fenômeno, segundo ele, está facilitando o acesso das crianças a droga. “O crack está chegando mais perto delas [crianças], antes precisava ir até a Cracolândia [para conseguir crack]. Agora, a Cracolândia está por aí”, afirmou.
De acordo com a prefeitura, estão sendo concedidos incentivos fiscais para empresas que se mudem para a região, além de obras para alargar as calçadas e melhorar a iluminação. Além disso, os hotéis usados por traficantes de crack estão sendo fechados.
A Polícia Militar atua ostensivamente nas ruas onde o crack é usado livremente, como verificou a reportagem da Agência Brasil, em visita à região. As abordagens aos usuários são frequentes. Nessas situações, a maioria deles foge correndo até a próxima esquina, riscando compulsivamente os isqueiros para manter os cachimbos acesos, enquanto se reagrupam em um outro quarteirão.
O vice-presidente da da Associação dos Moradores e Comerciantes do Bairro de Campos Elíseos (AMCCE), Nelson Barbosa, afirmou que os usuários da Nova Luz estão sendo “empurrados” para as regiões vizinhas.
“Se hoje, eles [a prefeitura] chamam lá de Nova Luz, nós chamamos as outras regiões de nova Cracolândia. Essa região [nova Cracolândia] corresponde à Santa Ifigênia, aos Campos Elíseos, à Santa Cecília e também à região da Praça da República”, disse Barbosa.
A tendência de que a Cracolândia mude de endereço devido as ações policiais ocorre, segundo especialistas, porque “o problema não é o local, o problema são aquelas pessoas”. Segundo a psicofarmacóloga da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Solange Nappo, caso os usuários de drogas sejam realmente expulsos do centro, outro ponto da cidade poderá ser dominado pelo crack. “Eles vão sair dali, vão para outro local e vão começar, aos poucos, a montar uma outra Cracolândia”,
A polícia está fazendo “a sua parte” para combater o problema do crack, defende o comandante do 13º Batalhão de Polícia Militar, tenente-coronel Osni Rodrigues de Souza. Ele destacou que a polícia realiza operações diárias, com foco principalmente no tráfico de drogas.
No entanto, o tenente-coronel, reconheceu que só a ação policial não é capaz retomar as ruas dominadas pelo crack. “Ali não é só problema de polícia, se fosse só problema de polícia estava fácil de resolver”, disse.
Um trabalho integrado, com ações de saúde e sociais, é o modelo defendido pelo psicólogo Lucas Carvalho. Para ele, é necessário “olhar aquelas pessoas enquanto pessoas” e traçar políticas públicas que resgatem a dignidade de quem vive na Cracolândia. “Se esse fenômeno da Cracolândia tem uma continuidade de, no mínimo, dez anos, não é em dois anos que vai se resolver sem dar uma continuidade de políticas públicas”, concluiu.
Ele explicou que as próprias famílias desses jovens costumam viver em situação de violência. “A família também vem de históricos de violência”, ressaltou Carvalho. O conjunto de ruas do centro chamado de Cracolândia é caracterizado por um quadro de venda e consumo generalizados de crack.
Segundo a coordenadora pedagógica do Projeto Quixote, Fernanda Ramos, quando uma criança chega ao centro de São Paulo uma série de vínculos entre ela e a comunidade já foram rompidos. Por isso, ela ressalta a importância de haver “um trabalho na comunidade que permita olhar para essa criança antes que ela se torne um refugiado urbano do centro de São Paulo”.
O jovem que enfrenta problemas no lugar onde vive “vai se descolando, aos poucos, da família dele”, explica a coordenadora do programa de Educação na Rua elaborado pela Fundação Travessia, Fabiane Hack.
De acordo com Fabiane, as crianças e os adolescentes vão se adaptando a viver fora de suas casas aos poucos. Primeiro, passam o dia em um lugar próximo de casa, depois, no centro da cidade e, com o tempo, estendem essas fugas até não retornarem mais. “A rua é muito dura, mas também tem o lado sedutor da liberdade e de não ter regras.”
Fabiane, que desenvolve um trabalho de reinserção social de crianças em situação de rua, afirmou ter dificuldades para trabalhar com usuários de crack. A fissura – desejo compulsivo de consumir a droga – dificulta a abordagem e o diálogo com esses indivíduos. Ela destaca que até os espaços ocupados pelos que usam crack são diferentes da região onde ficam os demais menores.
Apesar do contato inicial ser mais difícil, o psicólogo Lucas Carvalho, do Projeto Quixote, acredita que a relação com uma criança residente da Cracolândia acaba sendo mais “profunda e verdadeira” do que com um menor de rua de outra região, justamente por ser mais difícil do que em outros lugares como é o caso do Vale do Anhangabaú.
Apontado como porta de entrada para os menores chegarem ao centro de São Paulo, no Anhangabaú, as abordagens iniciais costumam ser bem recebidas porque ali já é mais frequente a visita de entidades que ajudam crianças e adolescentes.
Segundo Carvalho, os menores que vivem na Cracolândia sofrem do que ele define como “desencanto”, uma perda tanto a alegria, como do próprio vigor físico. “O crack, diferente da cola e do tiner, é muito mais engessante”, conta o psicólogo para explicar o porquê da apatia dos envolvidos com essa droga.
Segundo ele, esse fenômeno dificulta o contato inicial, mas, quando a relação de confiança é estabelecida, tende a ser mais forte do que com outros jovens.
A diretora do Centro de Referência em Álcool, Tabaco e Outras Drogas, da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo, Luisemir Lago, acredita que mesmo as crianças e adolescentes com forte envolvimento com o crack podem ser reabilitados, desde que, além dos tratamento de saúde, exista também uma política de reinserção social.
No entanto, ela destacou que o uso continuado de uma droga tão potente pode comprometer as funções cerebrais desses jovens, que, por ainda não terem o organismo ainda completamente formado, estão mais sujeitos a ficarem dementes. “Ele [usuário de crack] não consegue depois render como um adolescente normal.”
Revitalização da Cracolândia pulveriza a região
A revitalização da Nova Luz, projeto da prefeitura de São Paulo, e as ações policiais nas ruas tomadas pelo crack estão “pulverizando” a Cracolândia, afirma o psicólogo do Projeto Quixote, Lucas Carvalho, que trabalha com jovens em situação de risco, no centro.
Chama-se de Cracolândia um conjunto de ruas no centro de São Paulo onde o crack é consumido e comercializado abertamente.
“A Cracolândia não está sumindo, está se fragmentando em diversos pontos da cidade”, alertou Carvalho, que fez a observação com base na sua experiência de trabalho com crianças e adolescentes pelas ruas da cidade.
Esse fenômeno, segundo ele, está facilitando o acesso das crianças a droga. “O crack está chegando mais perto delas [crianças], antes precisava ir até a Cracolândia [para conseguir crack]. Agora, a Cracolândia está por aí”, afirmou.
De acordo com a prefeitura, estão sendo concedidos incentivos fiscais para empresas que se mudem para a região, além de obras para alargar as calçadas e melhorar a iluminação. Além disso, os hotéis usados por traficantes de crack estão sendo fechados.
A Polícia Militar atua ostensivamente nas ruas onde o crack é usado livremente, como verificou a reportagem da Agência Brasil, em visita à região. As abordagens aos usuários são frequentes. Nessas situações, a maioria deles foge correndo até a próxima esquina, riscando compulsivamente os isqueiros para manter os cachimbos acesos, enquanto se reagrupam em um outro quarteirão.
O vice-presidente da da Associação dos Moradores e Comerciantes do Bairro de Campos Elíseos (AMCCE), Nelson Barbosa, afirmou que os usuários da Nova Luz estão sendo “empurrados” para as regiões vizinhas.
“Se hoje, eles [a prefeitura] chamam lá de Nova Luz, nós chamamos as outras regiões de nova Cracolândia. Essa região [nova Cracolândia] corresponde à Santa Ifigênia, aos Campos Elíseos, à Santa Cecília e também à região da Praça da República”, disse Barbosa.
A tendência de que a Cracolândia mude de endereço devido as ações policiais ocorre, segundo especialistas, porque “o problema não é o local, o problema são aquelas pessoas”. Segundo a psicofarmacóloga da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Solange Nappo, caso os usuários de drogas sejam realmente expulsos do centro, outro ponto da cidade poderá ser dominado pelo crack. “Eles vão sair dali, vão para outro local e vão começar, aos poucos, a montar uma outra Cracolândia”,
A polícia está fazendo “a sua parte” para combater o problema do crack, defende o comandante do 13º Batalhão de Polícia Militar, tenente-coronel Osni Rodrigues de Souza. Ele destacou que a polícia realiza operações diárias, com foco principalmente no tráfico de drogas.
No entanto, o tenente-coronel, reconheceu que só a ação policial não é capaz retomar as ruas dominadas pelo crack. “Ali não é só problema de polícia, se fosse só problema de polícia estava fácil de resolver”, disse.
Um trabalho integrado, com ações de saúde e sociais, é o modelo defendido pelo psicólogo Lucas Carvalho. Para ele, é necessário “olhar aquelas pessoas enquanto pessoas” e traçar políticas públicas que resgatem a dignidade de quem vive na Cracolândia. “Se esse fenômeno da Cracolândia tem uma continuidade de, no mínimo, dez anos, não é em dois anos que vai se resolver sem dar uma continuidade de políticas públicas”, concluiu.
Agência Brasil
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