País obriga meninos e meninas que passaram por histórias traumáticas a repetir sua história até oito vezes. Profissionais não são preparados para função
“Por favor, me deixa. Não me pergunta mais nada sobre isso. Eu queria esquecer”. Essa frase, dita por uma garota de 8 anos, levou pesquisadores brasileiros a investigar formas diferentes de colher depoimentos de crianças e adolescentes vítimas de violência sexual. Hoje, meninos e meninas abusados sexualmente têm de repetir a história por até oito vezes para diferentes autoridades em processos judiciais que levam anos. Tudo para tentar pôr o agressor na cadeia. E muitas vezes é preciso ficar frente a frente com ele. A repetição causa o que especialistas chamam de revitimização, dano que pode até ser pior do que a própria agressão.
Estudo inédito, realizado por pesquisadores brasileiros em parceria com a organização não-governamental Childhood, aponta apenas 28 países com formas especializadas de tomar o depoimento de crianças. No Brasil, não há nenhuma legislação sobre o assunto. O estudo “Depoimento sem medo (?) – culturas e práticas não-revitimizantes” aponta que apenas 20 comarcas em oito estados (Rio Grande do Sul, Goiás, Rio de Janeiro, São Paulo, Rondônia, Bahia, Rio Grande do Norte e Acre) possuem técnicas diferenciadas para ouvir meninos e meninas. São iniciativas isoladas, fruto da determinação de juízes, promotores e ativistas da área. A regra para a maioria é ser ouvido em ambientes hostis: salas escuras com profissionais despreparados.
“Por favor, me deixa. Não me pergunta mais nada sobre isso. Eu queria esquecer”. Essa frase, dita por uma garota de 8 anos, levou pesquisadores brasileiros a investigar formas diferentes de colher depoimentos de crianças e adolescentes vítimas de violência sexual. Hoje, meninos e meninas abusados sexualmente têm de repetir a história por até oito vezes para diferentes autoridades em processos judiciais que levam anos. Tudo para tentar pôr o agressor na cadeia. E muitas vezes é preciso ficar frente a frente com ele. A repetição causa o que especialistas chamam de revitimização, dano que pode até ser pior do que a própria agressão.
Estudo inédito, realizado por pesquisadores brasileiros em parceria com a organização não-governamental Childhood, aponta apenas 28 países com formas especializadas de tomar o depoimento de crianças. No Brasil, não há nenhuma legislação sobre o assunto. O estudo “Depoimento sem medo (?) – culturas e práticas não-revitimizantes” aponta que apenas 20 comarcas em oito estados (Rio Grande do Sul, Goiás, Rio de Janeiro, São Paulo, Rondônia, Bahia, Rio Grande do Norte e Acre) possuem técnicas diferenciadas para ouvir meninos e meninas. São iniciativas isoladas, fruto da determinação de juízes, promotores e ativistas da área. A regra para a maioria é ser ouvido em ambientes hostis: salas escuras com profissionais despreparados.
Repetição
Em média, uma criança precisa repetir sua história de agressão entre seis e oito vezes. Geralmente, a denúncia começa no Conselho Tutelar; depois, é encaminhada para a delegacia. Ainda estão no caminho o Instituto Médico-Legal, o Ministério Público e o Poder Judiciário, onde a vítima pode ser ouvida várias vezes e até mesmo ter de fazer acareação com o agressor. E tudo isso leva anos.
Grande parte dos casos de violência sexual não gera provas físicas, só psicológicas. O depoimento de uma criança vítima de abuso é aceito como prova material, mas a cura fica mais longe em função da necessidade de lembrança constante. O abuso sexual em crianças é especialmente danoso porque elas estão em fase de desenvolvimento – a violência pode deixar sequelas eternas.
Enquanto o pedófilo usa técnicas refinadas para atrair a criança, a Justiça a trata como um adulto e exige que fale do assunto como tal. A incoerência do sistema começou a ser tratada com maior frequência desde a Convenção sobre os Direitos da Criança, realizada pela Organização das Nações Unidas em 1989. No Brasil, o debate ganhou corpo na última década. Atualmente um projeto de lei tramita no Congresso Nacional para estabelecer diretrizes sobre o assunto. Em Porto Alegre, uma decisão tomada pelo Tribunal de Justiça no mês passado permitiu a chamada “produção antecipada da prova”, permitindo que uma menina vítima de abuso não precisasse repetir novamente o seu drama.
Técnicas apresentadas no estudo mostram como juízes no Brasil e no mundo têm tentado coletar o depoimento sem danos. São utilizados profissionais capacitados para tal atividade, como psicólogos e assistentes sociais. Delegados, juízes e promotores também passam por treinamento. Em alguns países a criança é ouvida somente uma vez. Em uma sala ambientada, o profissional faz uma entrevista com a criança usando recursos lúdicos, como brincadeiras, desenhos e filmes. A habilidade permite detectar o que houve com o mínimo de trauma para meninos e meninas. O processo é filmado e usado como prova.
Em outros casos, usa-se a câmara Gesell. Ao invés de a criança ser ouvida na audiência comum, ela fica em uma sala especializada composta por espelhos que permitem visualizar a partir de um lado o que acontece no outro, mas não vice-versa. Na sala ficam somente o menino ou menina e o profissional responsável. A entrevista também é gravada e serve como prova.
Em média, uma criança precisa repetir sua história de agressão entre seis e oito vezes. Geralmente, a denúncia começa no Conselho Tutelar; depois, é encaminhada para a delegacia. Ainda estão no caminho o Instituto Médico-Legal, o Ministério Público e o Poder Judiciário, onde a vítima pode ser ouvida várias vezes e até mesmo ter de fazer acareação com o agressor. E tudo isso leva anos.
Grande parte dos casos de violência sexual não gera provas físicas, só psicológicas. O depoimento de uma criança vítima de abuso é aceito como prova material, mas a cura fica mais longe em função da necessidade de lembrança constante. O abuso sexual em crianças é especialmente danoso porque elas estão em fase de desenvolvimento – a violência pode deixar sequelas eternas.
Enquanto o pedófilo usa técnicas refinadas para atrair a criança, a Justiça a trata como um adulto e exige que fale do assunto como tal. A incoerência do sistema começou a ser tratada com maior frequência desde a Convenção sobre os Direitos da Criança, realizada pela Organização das Nações Unidas em 1989. No Brasil, o debate ganhou corpo na última década. Atualmente um projeto de lei tramita no Congresso Nacional para estabelecer diretrizes sobre o assunto. Em Porto Alegre, uma decisão tomada pelo Tribunal de Justiça no mês passado permitiu a chamada “produção antecipada da prova”, permitindo que uma menina vítima de abuso não precisasse repetir novamente o seu drama.
Técnicas apresentadas no estudo mostram como juízes no Brasil e no mundo têm tentado coletar o depoimento sem danos. São utilizados profissionais capacitados para tal atividade, como psicólogos e assistentes sociais. Delegados, juízes e promotores também passam por treinamento. Em alguns países a criança é ouvida somente uma vez. Em uma sala ambientada, o profissional faz uma entrevista com a criança usando recursos lúdicos, como brincadeiras, desenhos e filmes. A habilidade permite detectar o que houve com o mínimo de trauma para meninos e meninas. O processo é filmado e usado como prova.
Em outros casos, usa-se a câmara Gesell. Ao invés de a criança ser ouvida na audiência comum, ela fica em uma sala especializada composta por espelhos que permitem visualizar a partir de um lado o que acontece no outro, mas não vice-versa. Na sala ficam somente o menino ou menina e o profissional responsável. A entrevista também é gravada e serve como prova.
Paola Carriel
Gazeta do Povo
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