terça-feira, 10 de novembro de 2009

Preconceito mata!


Há exatamente um ano, o educador Alberto Milfont foi à uma loja das Casas Bahia para comprar um colchão. Nada mais prosaico para um rapaz de 23 anos, casado e pai de um menino de 5 meses. Seria um dia bem comum, não fosse um segurança da loja ter cismado com o rapaz. Claro, homens de origem pobre com essa idade costumam gerar desconfiança dos mais preconceituosos. Achando que cumpria o dever de vigiar, o funcionário terceirizado da loja discutiu com o rapaz, que mostrava a nota fiscal de compra para provar que não era bandido. Poderia estar roubando, poderia estar matando, mas estava só comprando um colchão que deveria resguardar o sono da família. Alberto não estava roubando nem matando provavelmente porque passou a infancia pobre sob a proteção da pedagoga Dagmar Garrox, a Tia Dag, a fundadora da Casa do Zezinho, um dos mais bem sucedidos projetos de inclusão social e educação do Brasil. Alberto deu aulas na escola de Tia Dag depois de ser aluno por 10 anos. Depois foi trabalhar em produtoras, casou, teve filho e… foi comprar um colchão.
O vigia não sabia do passado de Alberto, nem quis saber. Discutiu, perdeu o controle e paf… Deu um tiro no rosto do cliente da loja, que morreu algumas horas depois no Hospital do Campo Limpo. Alberto poderia estar roubando, poderia estar traficando ou matando, mas preferiu trabalhar para comprar um colchão e sustentar o filho com dignidade. Morreu. Há um ano, Tia Dag comentou que os zezinhos estavam passados com o crime. Indignados, questionaram a educadora. Alberto tinha a ficha limpa, que fique claro. “Como explicar essa impunidade para os meus jovens?”, Dag perguntou há um ano. Hoje, ela mantém a questão. O vigia Genilson Silva Souza, 29 anos, foi preso no dia seguinte ao crime, mas conseguiu habeas-corpus 15 dias depois. O processo ainda tramita. E Urblog pergunta: ninguém vigia os vigilantes mesmo? Não, né?
A Casa do Zezinho http://www.casadozezinho.org.br/blogposts.php?ca=27 fica Parque Santo Antônio, Zona Sul da cidade (Regional Campo Limpo, com 1.200.000 habitantes). Foi fundada em 06 de março de 1994, para ser um espaço de atuação para crianças e jovens de baixa renda, começou com 12 Zezinhos e atende atualmente mais de mil crianças e jovens. Bem perto da casa de Tia Dag, que coloca em prática com maestria a Pedagogia do Arco Iris, há um cemitério famoso pelas estatísticas. A região, que já foi considerada uma das mais violentas da capital, tem o maior número de jovens - de 15 a 25 anos – enterrados por metro quadrado do mundo. Num cenário como esse, Alberto, que foi voluntário na Casa e deu aulas para outras crianças é, de fato, uma perda dolorida.
Há dois dias, amigos e parentes de Alberto fizeram um protesto em frente à loja em que ele foi assassinado. A viúva e o filho estavam lá. O menino provavelmente não vai lembrar do pai quando crescer. Mas vai saber da história toda.

Por Juliana Vilas, 29, codinome "Pássara", é repórter.
Foto: Esposa de Alberto
Fonte: Urblog

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Verbratec© Desktop.