terça-feira, 2 de junho de 2009

O toque de recolher


Por mais de uma dezena de vezes, todos aqueles que trabalharam um dia na vida em uma área socialmente sensível, como é a infância e juventude, receberam grupos organizados de pessoas, pedindo que o juiz impusesse um horário em que todos os adolescentes voltassem para suas casas. Eu mesmo, quando trabalhava na área, recebia frequentemente esses grupos... As razões são as de sempre e a motivação, idem: proteger as crianças e adolescentes dos perigos noturnos..., que, por razões desconhecidas se iniciariam exatamente após as onze, doze, dez badaladas noturnas, dependendo do maior ou menor grau de fundamentalismo desses grupos, que atiravam também contra a permissividade das novelas, contra o sanguinário telejornal, contra a revista e sua linda mulher semi-nua na capa, contra a escola, que permite o namoro no pátio, contra a campanha pelo uso de peservativos, que leva os jovens à permissividade sexual, contra o funcionamento de moteis, verdadeiras casas de licensiodade sexual, contra a permissão de uso de brincos por meninos até catorze (ou quinze, ou dezesseis... )...Na verdade, todos nós esperamos por souções mágicas e externas aos nossos domínios e ao nosso controle. É um bálsamo que alguém de longe e com força do Estado nos substitua nas relações domésticas infernizantes, como essas pequenas coisas que nos tiram o sono; me lembro do anúncio de um celular com GPS, feito e posto à venda para que pudéssemos seguir os passos de nossos filhos e filhas, via satélite. À falta do diálogo, um édito do rei, determinando o regresso de todos para casa... Pronto, resolvida a questão com uma simplicidade desconcertante, sem que nenhum de nós, pais e/ou mães precisássemos nos envolver pessoalmente na vida cotidiana de nossos filhos. Seria fantástico que nessa portaria restauradora da moral e dos bons costumes, também constasse a obrigação de comer verduras, evitar gordura trans, fazer atividade esportiva, decorar a tabela periódica, comer beterraba e gostar, escovar os dentes após as refeições, arrumar a cama, guardar roupas e tênis e passear com o cachorro (claro, catando o cocô na rua...).Num parágrafo, inciso, sei lá, deveria constar também que os adultos não pudessem beber demasiadamente, não pudessem espancar seus filhos, esposas, maridos, irmãos, não usassem drogas, nao usassem anfetaminas, não dirigissem feito loucos porque estão atrasados para compromisso algum, que não fossem espertos diante do policial de trãnsito, que não furassem fila na padaria, no banco, no estádio, que não se impusessem a pessoas humildes como autoridades constiutídas da república monarquista em que vivemos, que não abusassem sexualmente de meninas e meninos, postos sob proteção, que não corrompessem e que não se corrompesses, exibindo orgulhosos o carro do ano, obtido como propina de um filho da puta qualquer...Sempre é reconfortante colocar-se a culpa no mais fraco e é delicioso quando esse mais fraco é aquele que paradoxalmente mais nos desafia, mais nos questiona. Esse um, o filho. Essa uma, a filha.Um portaria para calar e recolher esses demônios. É tudo o que precisamos.

Por Tardelli - postado por Otto de Quadros na Comunidade e Aprendizagem para Conselheiros Tutelares

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